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por Luiz Bassegio
Culminando mais um processo que durou cerca de um ano, chegamos aos
resultados do Plebiscito sobre a ALCA, organizado pela Campanha Jubileu Sul/Brasil, que é
coordenado por mais de 100 entidades nacionais.
De 1 a 7 de setembro, 41.758 urnas recolheram os votos de 10.149.542
pessoas. O Plebiscito contou com o trabalho voluntário de mais de 150 mil pessoas, em
3894 municípios (de um total de 5550). Em relação ao Plebiscito da Dívida externa, o
Plebiscito da ALCA atingiu 450 municípios a mais e superou em 70% o número de votantes.
Quanto aos resultados, 98,35% dos votantes, disseram não ao tratado da
ALCA; 96% rejeitam as negociações que estão em andamento e; 98,6% não aceitam a
entrega da Base de Alcântara, no Maranhão, para controle militar dos EUA.
Principais avanços...
O Plebiscito evidenciou a pedagogia do processo. Foi mais uma etapa
de uma caminhada de dez anos, que vivenciou as Semanas Sociais Brasileiras; o Simpósio,
Tribunal e Plebiscito da Dívida Externa, oito edições do Grito dos Excluídos e, agora,
o Plebiscito Nacional sobre a ALCA. Um processo que apostou na soma de interesses comuns
em detrimento dos interesses departamentalizados. Intensificaram-se as parcerias,
solidificando ainda mais esta forma de trabalho. Foram mais de 100 entidades nacionais
(igrejas, sindicatos, movimentos populares, partidos políticos etc.) Aqui vale merecido
destaque o papel desempenhado por escolas, universidades e rádios comunitárias. Do ponto
de vista ecumênico, houve um salto qualitativo. Foram centenas de igrejas evangélicas
que participaram do Plebiscito da ALCA.
A campanha contra a ALCA foi um sucesso do ponto de vista educativo e
mobilizador. Talvez o maior processo educativo realizado no Brasil nos últimos anos.
Foram milhares de encontros, debates e reuniões sobre o tema, que tomaram ruas, escolas,
igrejas, associações, espaços públicos e meios de comunicação.
O processo revelou ainda que a população, quando chamada e
esclarecida, tem grande interesse em discutir temas que dizem respeito à soberania da
nação. Os comitês e grupos de base mais uma vez mostraram que sabem unir questões
micro e macro. Ao mesmo tempo em que o Plebiscito era organizado (urnas, atas, mesários
etc), discutia-se a política imposta pelo governo norte americano, suas implicações
comercias, militares e de soberania. Um tema que, a principio parecia ser complicado para
ser popularizado, tornou-se assunto de debate em bares, igrejas, escolas, famílias, etc.
O Plebiscito, com sua dimensão continental, contribuiu para o
estabelecimento de pontes com a América Latina reforçando a importância do Brasil como
parte deste continente.
Um destaque especial deve ser dado à qualidade do material produzido
pela clareza e didática de seu conteúdo. Foram milhões de cartilhas, jornais, folders,
vídeos, spots para rádios com clara posição política contra a intervenção norte
americana. Nosso povo deve ser o protagonista de sua história, de sua política, de seu
futuro. Que os americanos cuidem de seu país. Do Brasil, cuidamos nós.
Em Brasília, nos dias 17 e 18 de setembro, cerca de dois mil
militantes participaram de debates e estudos sobre a ALCA, enquanto os resultados do
Plebiscito eram divulgados na imprensa e entregues ao Senado e Câmara Federal, Superior
Tribunal Federal, à embaixadora norte americana e ao Presidente da República. Dom Franco
Masserdotti, disse: "O Plebiscito é um exercício de cidadania e democracia. É o
desejo de ver nossa pátria traçando sua soberania... de nosso povo ser o protagonista de
sua história. Precisamos globalizar a solidariedade, avançando juntos para construir um
novo mundo possível." Para o líder do MST, João Pedro Stédile, "...o
mais importante não é o número, mas o fato de que milhões de brasileiros, durante meses,
tomaram conhecimento de um tema que as elites queriam esconder. Foi um grande exercício
de pedagogia de massas... A vocação do povo brasileiro é criar uma grande integração
latino-americana."
O Plebiscito sinaliza aos poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário do Brasil, ao governo dos Estados Unidos e às grandes corporações
transnacionais, que o povo brasileiro não abre mão de forjar seu próprio destino.
Reafirma para os povos irmãos das Américas que partilham conosco a organização da
Campanha Continental contra a ALCA, que o povo brasileiro não abre mão de lutar, sempre
e em todo o lugar, por uma nação e um Continente livres da exploração neocolonial e de
toda injustiça; por uma nação e um Continente em que caibam todas as cidadãs e
cidadãos plenos de dignidade e de direitos. Os resultados do Plebiscito Nacional sobre a
ALCA e Alcântara são a afirmação clara de que é possível a construção de um mundo
sem dominação de uma nação sobre as demais; em que a
economia esteja a serviço dos povos; em que as relações entre as pessoas e entre as
nações estejam baseadas na igualdade e no respeito às diferenças; um mundo, enfim, em
que caibam todos os mundos, todas as culturas, todas as aspirações de todos os povos. (Manifesto
do Plebiscito).
Perspectivas...
Este processo não pára. A mobilização continua através do
fortalecimento e criação de novos comitês de luta e resistência contra a ALCA. Serão
realizadas jornadas de formação e luta contra a implementação deste tratado e
produzidos materiais didáticos exigindo do governo a realização de um plebiscito
oficial. Também como continuidade desta luta, continuarão sendo debatidos os temas da
dívida externa, da militarização impulsionada pelos EUA e da soberania da Amazônia.
No calendário de lutas estão colocadas as mobilizações de Quito no
final de outubro, a 10ª Plenária Social Nacional, a elaboração do projeto de
iniciativa popular sobre o Plebiscito Oficial, a 3ª Edição do Fórum Social Mundial, em
janeiro de 2003 e as Jornadas de abril de 2003, na Argentina, quando serão apresentados
os resultados dos Plebiscitos realizados em diversos países do continente.
Luiz Bassegio, é secretário executivo do Grito dos Excluídos
Continental e membro da coordenação da Campanha Jubileu Sul.
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