A luta contra a corrupção e as
prisões de empresários e políticos
Evelise Pedroso Teixeira Prado
Vieira
O Brasil tem visto
ultimamente, estupefato, a realização de prisões de empresários e
políticos acusados de atos de corrupção. A estupefação não brota da
certeza de que tais pessoas sejam inocentes, mas sim do fato de que
as prisões, até bem pouco tempo, eram destinadas a indivíduos
oriundos das classes menos favorecidas. Não que a lei assim o
dissesse ou a sociedade assim o quisesse, mas o Estado não conseguia
mostrar, na prática, que a lei vale igualmente para todos e que não
há distinção entre os indivíduos.
Tais prisões, além de
demonstrarem ser frutífera a luta contra a corrupção, têm inegável
caráter preventivo, funcionando como alerta para que os
administradores públicos tenham consciência da necessidade da gestão
honesta dos recursos arrecadados.
Ademais, servem para
provar à sociedade que a lei é aplicável a todos e não apenas a uma
parcela da população. Em Estado Democrático de Direito, é inegável
que a crença na Justiça depende, em grande medida, da certeza que a
sociedade tenha do caráter impessoal das decisões, o que não se
constata quando os ilícitos praticados pelos poderosos não recebem a
punição necessária.
Por outro lado, tais
prisões trouxeram ao cenário nacional a possibilidade de discutir
sem preconceitos a respeito dos limites da atividade repressora.
Embora sempre se tenha tentado debater estes limites, a discussão
pública da questão esbarrava na afirmação de que os defensores da
dignidade dos presos nada mais eram que defensores de criminosos, os
quais não deveriam merecer qualquer atenção. Assim,
desqualificava-se o interlocutor para evitar o aprofundamento da
questão.
Agora, sendo poderosos
os presos, não se constata a mesma indisposição para o debate:
fala-se - e com toda razão - da desnecessidade de algemar pessoa que
não mostra qualquer intenção de se opor à prisão; fala-se - também
com razão - da necessidade de tratamento médico adequado à
recuperação da saúde do preso; argumenta-se – igualmente com razão -
da ofensa à dignidade da pessoa humana com a transmissão, em cadeia
nacional, de prisões.
O debate sobre os
limites da atividade repressora do Estado em face do princípio
universal da dignidade humana há de ser feito de forma serena e sem
preconceitos, não importando se os presos são ou não pessoas
privilegiadas social ou economicamente. Contudo, não se pode deixar
de lembrar que fatos iguais aos aqui mencionados acontecem no Brasil
há muito tempo, com a diferença de que não haviam atingido, até
agora, os poderosos, que têm mostrado a capacidade de mobilizar o
mundo jurídico e da imprensa para a discussão de situações como as
aqui relatadas.
Estas prisões e as
circunstâncias que as cercaram têm contribuído para que a discussão
sobre os limites da atuação do Estado frente ao princípio da
dignidade da pessoa humana possa ser feita com tranqüilidade. Não se
constata mais a existência de olhares convenientemente distraídos
com relação ao caráter de humilhação na colocação desnecessária de
algemas, fato que acontece no Brasil desde seu descobrimento; as
atenções se voltam para o debate sobre o cabimento da realização de
prisão em frente de câmeras de televisão.
O direito à informação,
que sempre justificou a transmissão destas cenas, não mais é
apresentado como absoluto. É bom que assim seja e que, por fim, as
pessoas se sensibilizem para a necessidade de tratamento correto e
digno a todos os presos, inclusive dos poderosos.
Evelise Pedroso
Teixeira Prado Vieira é Procuradora de Justiça, integrante do
Conselho Superior do Ministério Público e associada do Movimento do
Ministério Público Democrático (www.mpd.org.br)
Clique
aqui para comentar este artigo.
Home |