Correio da Cidadania

É preciso ler um pouco

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É preciso ler um pouco de tudo.

 

É preciso ler um pouco de psicologia, para descobrir o poço sem fundo da alma.

 

É preciso ler um pouco de poesia, para penetrar nesse poço sem fundo, e nele afundar até o gozo.

 

É preciso ler um pouco de teologia, para descobrir que indo mais fundo no poço sem fundo encontraremos a Deus.

 

É preciso ler um pouco do jornal do dia, para descobrir que o mundo já chegou ao fundo do poço, mas ainda continua descendo.

 

É preciso ler um pouco de geologia, para descobrir novos poços sem fundo nesse mundo fecundo.

 

É preciso ler um pouco de magia, para descobrir no fundo do poço mais fundo o enigma mais profundo.

 

É preciso ler um pouco de filosofia, para descobrir que o mundo não é imundo, é apenas um poço sem fundo dentro de outro poço ainda mais fundo.

 

É preciso ler um pouco de biologia, para descobrir a vida se debatendo no fundo, no fundo mais fundo do poço sem fundo.

 

É preciso ler um pouco de antropologia, para descobrir que somos esse próprio poço sem fundo, fundamento de tudo o que somos.

 

É preciso ler um pouco de arqueologia, para descobrir uma cidade no poço sem fundo.

 

É preciso ler um pouco de astronomia, para descobrir que o céu é também um poço sem fundo, oceano negro em que nadam estrelas e interrogações.

 

É preciso ler um pouco de espeleologia, para descobrir que a caverna sem fundo guarda outros tantos poços sem fundo.

 

É preciso ler um pouco de filologia, para decifrar a linguagem do poço sem fundo.

 

É preciso ler um pouco de metodologia, para descobrir os caminhos que há dentro do poço sem fundo.

 

É preciso ler um pouco de etruscologia, grafologia, nefrologia, opsologia, ovniologia, papirologia, parapsicologia, piretologia, pomologia, psefologia, selenologia e todas as logias possíveis, para descobrir o poço sem fundo da nossa curiosidade.

 

É preciso ler um pouco de tudo, embora seja muito pouco. Que esse pouco, porém, seja suficiente para nos fazer vislumbrar no poço sem fundo a ausência desse fundo.

 

Ler um pouco de tudo, mas ler a fundo esse pouco.

 

Ler um pouco, tendo como pano de fundo a sede de saber.

 

Ler um pouco, mas, mesmo sendo pouco, ler contrafundo.

 

Ler um pouco, a fundo perdido.

 

Gabriel Perissé é doutor em educação pela USP e escritor. Website: http://www.perisse.com.br/

 

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Comentários   

0 #3 Qual saber reside no “Poço sem fundo”?Joventino dos Santos Silva 04-08-2008 12:51
Gostaria que você comentasse sobre o poço sem fundo da construção do conhecimento nas universidades assim como da intervenção social das mesmas.
A gente não enxerga nem o poço, quanto mais o fundo... no fundo em que chegou as nossas universidade...
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0 #2 Continue escrevendo ....Maria Eloisa Mendonça 30-07-2008 11:47
Quero parabenizá-lo pelos artigos que escreve neste Correio. Comecei lendo o primeiro e agora aguardo os seguintes. No meio de tantas matérias materialistas, seus artigos encantam.
abraços
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0 #1 Ivan 30-07-2008 02:36
maravilhoso..
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