Correio da Cidadania

Economia ecológica e respostas às múltiplas crises ambientais: inovações e resistências

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Três campos de aplicação se evidenciam na conjuntura como de necessidade imediata aos princípios da economia ecológica, tendo em vista enfrentar novos e velhos problemas, mal resolvidos e até provocados pela economia convencional. Refiro-me à produção de energia limpa (tecnicamente de baixa dissipação e poluição), ao enfrentamento da crise hídrica e por último à produção de alimento saudável. Vou me restringir aqui ao campo da produção e gestão de recursos naturais, sem tocar na questão dos padrões de consumo, por razões didáticas, sabendo, entretanto, que o tema ecológico não pode ser setorizado.

Dos três campos citados, a chamada produção de energia limpa (de baixa entropia) é provavelmente a que mais tem avançado internacionalmente, e afinal chega meio atrasada aqui entre nós, no formato dos parques eólicos e agora dos parques de energia solar. Neste mês de setembro praticamente se concluiu o primeiro, localizado em Bom Jesus da Lapa (BA), com capacidade de geração para 166 mil domicílios, à base de placas fotovoltaicas, em uma área rural de 330 hectares (informação de ‘O Estado de S. Paulo, 10-09-2017, pg B4). A combinação de parques eólicos e parques de energia solar na região Nordeste cumpre uma função de maior relevância e certamente vem para suprir os déficits hídricos das maiores bacias hídricas da região.
 
Por outro lado, a crise hídrica, que não é apenas regional do Nordeste (Brasília e Goiânia atualmente estão sob regimes de racionamento de água potável), é tema hoje mundializado. Em março de 2018 teremos o Fórum Mundial da Água em Brasília e também o Fórum Alternativo, onde se espera uma forte mobilização tanto intelectual, quanto popular, de maneira a oxigenar o debate da questão. Hoje, este se encontra fortemente aprisionado aos direitos de propriedade privada absolutos sobre o território, capturando os territórios das bacias hidrográficas principais, a serviço do uso perdulário da água pela economia do agronegócio.

Um terceiro campo de penetração da economia ecológica à produção dos chamados alimentos agroecológicos, com culturas de produção e consumo em expansão (esta semana se realiza em Brasília o Congresso Brasileiro e Latino-Americano de Agroecologia), é ainda considerado pela economia principal (a de ‘commodities’) como residual. Enquanto o campo principal cresce fortemente (a safra de grãos aumentou em 2017 cerca de 36% em relação à anterior). E este crescimento ocorre sob forte consumo hídrico, mesmo nas bacias muitos comprometidas do Cerrado (a  exemplo do Araguaia-Tocantins) e do Nordeste (a exemplo da Bacia do São Francisco).

Por outro lado, ocorrem em paralelo evidências planetárias de desequilíbrio ecológico, com o evento mais trágico desde início de setembro, da força destrutiva dos furacões do Golfo do México, muito ampliada, segundo os climatologistas, pelo aquecimento das águas do Golfo. Poucas semanas antes, o governo Trump se desvinculara dos compromissos norte-americanos para combater o aquecimento global.

Aqui no Brasil, ainda no início de setembro, o governo Temer emitiu Decreto a extinguir a Reserva Nacional do Cobre (RENCA) no Amapá, com área superior ao estado do Espírito Santo (46 mil km²), com pretensão de transformá-la em área de mineração privada internacional, sujeita à exploração, segundo critérios econômicos estritos.

Os domínios energético, hídrico e de produção alimentar são sensíveis e compreensíveis à penetração da economia ecológica. Mas as interdições da economia dominante, de matrizes tecnológicas não sustentáveis a médio prazo, continuam a dominar nossa economia política, à margem de qualquer discussão mais aprofundada de desenvolvimento e futuro. Infelizmente, a cosmovisão de futuro da dupla Trump-Temer continua a se contrapor à cosmovisão da ecologia integral do Papa Francisco, expressada na encíclica Laudato Si. Assim, impõem-se à humanidade retrocessos nos campos ambientais que não precisaríamos estar vivendo.


Guilherme C. Delgado

Doutor em economia pela UNICAMP e consultor da Comissão Brasileira de Justiça e Paz.

Guilherme Costa Delgado
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