Correio da Cidadania

Putin ganha pontos no Oriente Médio

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Como Obama repetiu não poucas vezes, o ISIS (Estado Islâmico) é uma ameaça à paz mundial e os EUA têm todo empenho em acabar com eles.

 

Por isso mesmo, convocou o mundo civilizado para a guerra contra essa praga. Logo o presidente deveria receber com palmas a entrada da Rússia para lutar a seu lado, não é?

 

Não é.

 

Voltando de Bagdá, após reunião com Abadi, primeiro-ministro do Iraque, o general Joe Durnford, chefe do Estado-maior das forças armadas dos EUA, informou o contrário.

 

Segundo o site da CBS NEWS (22 de outubro), foram estas as suas palavras: “eu disse (a Abadi) que seria muito difícil para nós dar o apoio que você precisa se os russos também estiverem conduzindo operações bélicas. Não poderemos conduzir operações se os russos estiverem operando no Iraque agora”.

 

O iraquiano ficou numa saia justa. Afinal, os EUA já gastaram cerca de 20 bilhões de dólares no armamento, treinamento, assessoramento e, principalmente, apoio aéreo ao exército local.

Até agora, não adiantou muito.

 

Desde que a aviação dos EUA entrou em ação, há um ano, o ISIS tomou a importante cidade de Ramadi e mantém em seu poder um terço do território do país.

 

Nos últimos meses, reforçadas também pelas tropas xiitas, as forças armadas do Iraque começam a encarar os ultrafanáticos, tendo passado à ofensiva em algumas frentes.

 

Por enquanto, os russos têm se limitado a fornecer armas e assessores técnicos aos xiitas. O comando da campanha ISIS continua nas mãos de oficiais norte-americanos e iraquianos.

 

Putin afirmou que está pronto para vir com tudo, formando uma coalizão com os EUA e o Iraque.

 

Mas primeiro o Iraque deve solicitar sua ajuda oficialmente. Abadi diz “claro, ótimo”, mas hesita.

 

Seus partidários pressionam para que ele aceite. Abadi resiste, diz que ainda não é hora. Se topar, os norte-americanos podem sair e ele teme um futuro incerto sem o braço amigo de Tio Sam.

 

Enquanto isso, espera que os estadunidenses acabem concordando na aliança com os russos, em nome da necessidade de derrotar o ISIS, que se torna um inimigo cada vez mais forte.

 

Além de solidificarem seu califado instalado no Iraque e na Síria, os ultrarradicais se expandem pelo Oriente Médio e África. Já têm filiais em sete regiões: Egito, Líbia, Nigéria, Iêmen, Afeganistão, Paquistão e Cáucaso.

 

Pior: segundo pesquisa da consultoria inglesa de segurança, a IHS, o ISIS aumentou em 42% suas ações entre julho e setembro de 2015, comparando com o mesmo período no ano passado.

 

Indiferentes a esses dados assustadores, os EUA seguem querendo ver os russos pelas costas, tanto no Iraque quanto na Síria.

 

Nesse país, Putin cansou-se de propor sua participação na coalizão de nações formada pelos EUA para destruir o ISIS.

 

Nada feito, Washington se opõe devido ao apoio russo ao presidente Assad, da Síria, que Obama condenou ao inferno e age para o defenestrar, armando e treinando as forças rebeldes.

 

Bem que Putin tentou (e ainda tenta) tirar da frente este obstáculo ao fim de uma guerra que está massacrando o povo sírio e devastando o país.

 

Propôs várias vezes uma reunião entre governo, rebeldes, EUA, Rússia, Irã, União Europeia, países do Golfo, Turquia, todos os envolvidos na questão para negociar a paz, através de um governo de transição, com representantes das partes em luta.

 

Claro, Putin não pode abandonar seu aliado Assad: exige ao menos que ele participe das negociações.

 

Aí, tudo volta ao marco zero porque Obama não perdoa Assad. Com a presença do líder sírio, não tem conversa.

 

Cansado das rejeições às suas duas iniciativas, Putin resolveu agir tanto para enfraquecer o ISIS quanto para fortalecer o amigo Assad, atualmente perdendo terreno.

 

Enviou seus aviões para passarem a bombardear o ISIS por sua conta, incluindo nos alvos grupos terroristas, integrantes das forças anti-Assad.

 

Obama saiu do sério. Acusou os russos de, no duro, não estarem atacando os ultrarradicais, mas sim as tropas de moderados, que também fazem parte do exército rebelde.

 

Não é bem assim. A imprensa e os observadores neutros admitem que os aviões russos já fizeram mesmo dezenas de bombardeios contra o ISIS, causando muito estrago em depósitos de armas, concentração de tropas e quartéis-generais.

 

Mas também lançaram muitos mísseis contra as forças rebeldes, matando um número indeterminado de soldados.

 

O problema é saber se os atingidos seriam “moderados” ou terroristas. A maioria dos membros do exército rebelde é formada por milicianos do Nusra (filial da al Qaeda na Síria) o grupo mais forte – e salafitas, partidários da uma seita islâmica também radical.

 

Os chamados “rebeldes moderados” (ex-soldados de Assad e militantes seculares) representam uma minoria, pouco significativa. Provavelmente, alguns deles foram mesmo atingidos pelos mísseis russos.

 

Não é de se crer que os pilotos tenham recebido instruções de Moscou para se preocuparem em distinguir entre terroristas e moderados, a fim de poupar estes últimos.

 

De qualquer forma, as ações bélicas de Putin não violam as leis internacionais. Como Assad foi eleito, seu governo é legítimo e, portanto, os russos têm direito de defendê-lo contra movimentos revolucionários, ainda mais quando, como é o caso, contam com milicianos estrangeiros e apoio financeiro, político e militar de outros países.

 

A maioria desses países – a Alemanha, a França, a Turquia e os Estados do Golfo – parecem estar mudando de posição e aceitam negociações com Assad e até mesmo sua permanência num governo de transição durante seis meses, segundo informou o ex-ministro do Exterior turco Yasar Yaki ao jornal Daily Zaman.

 

Depois da triste e trágica onda de imigrantes sírios que invadiu a Europa, até os próprios EUA estariam caindo em si.

 

Em 20 de outubro, fontes turcas da Reuters informaram: “nós avançamos nesta questão até um certo degrau com os EUA e outros aliados. Não há um consenso exato sobre quando começaria o período de seis meses (de transição com Assad), mas pensamos que não demoraria muito”.

 

Vamos torcer que não sejam meros boatos. Por enquanto, Obama demonstra estar mais preocupado em impedir que a Rússia colabore na queda do ISIS e na paz na Síria do que em resolver esses dois importantíssimos problemas.

 

Não é o que se espera de um prêmio Nobel da Paz. Putin, visto como um autêntico déspota (talvez até seja), vem se comportando de uma forma muito mais digna.

 

Sua oferta de união aos norte-americanos para ajudar o Iraque a se livrar do ISIS merece palmas. O mesmo para sua atuação na Síria, atacando os bárbaros do Estado islâmico e os terroristas e exercendo seu direito de auxiliar um aliado ameaçado por uma “revolução”.

 

Ganhou mais pontos ainda ao formular propostas aceitáveis para acabar com a terrível guerra que vem devastando a nação síria.

 

Obama vê tudo isso com maus olhos. Por seus atos e palavras deixa claro que o mais importante para os EUA é deter o protagonismo da Rússia em questões internacionais e impedir que se torne uma potência influente no Oriente Médio.

 

Questões como o ISIS e a guerra da Síria estão ficando em segundo plano. Será isso o excepcionalismo estadunidense?

 

 

Leia também:


Síria: como foi perdida a paz


Como os EUA destroem o Iraque e a Síria


Os sete mitos criados pela mídia ocidental que ajudaram a destruir o Iraque (1)


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Luiz Eça é jornalista.

Website: Olhar o Mundo.

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