Correio da Cidadania

Democracia em risco

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Descrevo fatos que comprovam a tese do crescimento do grau de soberania do Brasil na década de 2000 e em anos recentes, em contraposição ao alto nível de subalternidade conseguido graças às tragédias ocorridas na década de 90. Mas, no momento, só é de interesse comprovar o crescimento da soberania.

 

Ainda no governo Sarney, as bases de uma união tarifária e comercial de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai foram estabelecidas e ela veio a se efetivar em 1991, durante o governo Collor, com a criação do MERCOSUL. Foi uma afirmação de independência destes países à subjugação a países desenvolvidos.

 

Durante o governo FHC, o Congresso nacional rejeitou duas propostas que acarretariam perda de soberania para o país. Elas foram a cessão de área da base de Alcântara para os Estados Unidos e a permissão para o Brasil ingressar na ALCA, também de interesse dos Estados Unidos. Pelo presidente FHC, estas propostas seriam aprovadas.

 

No governo Lula, foi firmado um acordo com a França para a construção de submarinos convencionais com transferência de tecnologia, contrariando a intenção estadunidense de controle do poder militar no mundo. Neste governo, foram criadas a UNASUL, União de Nações Sul-Americanas, e a CELAC, Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos, que receberam obviamente a rejeição de quem quer continuar dominando o mundo e vê, nestas iniciativas, perda de hegemonia.

 

Ainda no governo Lula, houve a criação formal do BRIC e, depois, a entrada da África do Sul no grupo, o que fez a sigla mudar para BRICS, em ambos os eventos com forte participação do Brasil. Este acordo de países emergentes, especificamente, Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, contraria os interesses econômicos, políticos e geopolíticos dos Estados Unidos.

 

Ocorreu, também durante o governo Lula, a correta mudança da política externa do Brasil, que buscou a aproximação aos países em desenvolvimento da África, do Oriente Médio e de outras regiões, sem perder a boa relação com os Estados Unidos e a Europa. Graças à diplomacia brasileira, o Brasil é visto, hoje, como um bom mediador de conflitos, porque tem adotado uma linha de não alinhamento automático com nenhuma potência e, em diversos momentos, tem se colocado a favor da conciliação e da paz.

 

O presidente Lula determinou à Petrobras que comprasse plataformas no Brasil, mesmo que fossem um pouco mais caras. Mas, o mais importante de tudo é que o Brasil descobriu, durante o governo Lula, uma gigantesca reserva de petróleo, na região do Pré-Sal, de até 100 bilhões de barris ou, no mínimo, 60 bilhões. Esta descoberta representa a segurança energética futura do Brasil e uma enorme fonte de renda. Entretanto, ela é vista, pelos países desenvolvidos, como uma possível grande contribuição para as suas seguranças energéticas.

 

Para exploração desta riqueza, o governo Lula conseguiu aprovar o modelo de partilha, que, se bem administrado, dará mais benefícios para a sociedade, retirando recursos das empresas petrolíferas e os colocando no recém-criado Fundo Social. Além disso, o governo conseguiu aprovar também a Petrobras ser a operadora única do Pré-Sal, o que será determinante para a ocorrência de um novo ciclo de desenvolvimento, uma vez que esta empresa maximizará a compra de bens e serviços no país.

 

O governo Dilma decidiu comprar o jato de defesa de empresa sueca, que permitirá transferência de tecnologia, em detrimento do jato da empresa norte-americana. Dilma propôs aos países uma ação conjunta para conter a espionagem, principalmente da CIA e da NSA, órgãos do governo dos Estados Unidos. O Banco Central brasileiro deixou de trabalhar para maximizar o rendimento do grande capital e passou a cuidar dos interesses da sociedade brasileira, ação esta que foi considerada, pelos analistas comprometidos com o capital, como ferimento à autonomia deste banco.

 

A presidente Dilma teve um deslize na questão da soberania quando leiloou Libra, um gigantesco campo que tinha sido descoberto pela Petrobras. No futuro, historiadores poderão justificar esta agressão à soberania, porque, hoje, é incompreensível. Contudo, recentemente, a presidente se recuperou ao tomar a decisão de entregar diretamente à Petrobras, sem leilão, quatro campos do Pré-Sal, que somam cerca de 14 bilhões de barris, desde que a empresa assine contratos de partilha com a União. Esta decisão não agradou às petrolíferas estrangeiras, que queriam ver os campos leiloados.

 

Na reunião dos BRICS do mês de julho do presente ano, com Dilma representando o Brasil, foram criados o banco e um fundo monetário dos BRICS. O Banco Mundial e o FMI são dominados pelos Estados Unidos. Assim, os emergentes precisavam se livrar deste constrangimento. Nesta mesma reunião, foi decidido que a moeda de referência do comércio entre eles seria qualquer uma das cinco moedas dos países que compõem o grupo e, não mais, o dólar. Estas medidas podem ser consideradas como atos de rebeldia contra o sistema vigente.

 

O imenso contingente de brasileiros que saíram da miséria e entraram na faixa da pobreza, e o outro, que saiu da pobreza e passou para a classe média, resultaram no fortalecimento do mercado consumidor nacional. Então, o Brasil de Lula e Dilma está criando obstáculos para a depredação causada pelo capital internacional, consolidando a economia brasileira e garantindo segurança alimentar, além de trazer melhores condições de vida para nossa sociedade. Tudo isto em detrimento do atendimento aos interesses externos.

 

Aos olhos do império, esta ousadia brasileira precisa ser estancada, o mais rápido possível, principalmente porque o Brasil é um país com imenso território, oferecendo inúmeros recursos naturais e tem um gigantesco mercado consumidor. Assim, o capital internacional e seu principal país sede estão tramando a virada do jogo eleitoral no Brasil. Os golpes militares caíram de moda, pois o povo não aceitaria um novo golpe. Eu ficaria muito feliz se pudesse escrever que os militares brasileiros, se convocados por forças estrangeiras, se negariam a reeditar esta história. Mas não tenho tanta certeza.

 

Resta o golpe midiático. A mídia convencional já está, há muito, toda vendida. Recursos financeiros para a virada eleitoral não faltam. A CIA, a NSA e outras agências irão subvencionar os candidatos fiéis a eles para pagar marqueteiros, comprar materiais de campanha, votos em regiões carentes e apoios políticos, haja vista o caso ainda não comprovado do candidato a governador de Pernambuco pelo PSB, que foi acusado de estar oferecendo dinheiro em troca da adesão de partidos menores à sua coligação. Enfim, serão recursos irrestritos colocados à disposição das candidaturas com alguma chance de vitória sobre Dilma. Certamente, isto é um golpe à democracia.

 

Finalizando, o presidente do Equador, Rafael Correa, em entrevista ao jornal “Brasil de Fato”, relacionado ao presente tema, disse: “O aturdimento em que caíram as antigas direitas nacionais e internacionais, depois da ‘débàcle’ do neoliberalismo, já foi superado; no momento, observa-se claramente uma coordenação das forças reacionárias mundiais, continentais e nacionais”.

 

 

Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia e colunista do Correio da Cidadania.

Blog do autor: http://www.paulometri.blogspot.com.br/

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