Correio da Cidadania

Com razão e com limites

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Na luta política, para conquistar aliados e criar um movimento contra inimigos poderosos, é preciso combater com razão e com limites. Isso é verdade tanto para governos populares, ou de coalizão, quanto para a luta pela reforma agrária. Há governos populares que supõem ser possível desprezar os interesses de alguns setores sociais da sociedade, da mesma forma que algumas lideranças camponesas acham que podem descartar as classes médias urbanas de seu rol de aliados.

 

A razão dos camponeses, sem-terra ou com pouca terra, consiste em que o Brasil possui muitas terras disponíveis, e que essas terras se encontram extremamente concentradas nas mãos, tanto de latifundiários de novo tipo, capitalistas, quando de latifundiários de "velho tipo", neste caso em geral ociosas ou pouco produtivas. Também lhes dá razão o absurdo econômico e social de tantas terras ociosas em contraste com milhões de camponeses sem-terra ou com pouca terra.

 

Os limites da luta camponesa pela reforma agrária, por outro lado, são dados pela sua força social, hoje relativamente pequena, em comparação com os trabalhadores assalariados, as classes médias urbanas, e os setores da classe média rural que possuem terra. São dados, ainda, pela força econômica quase nula dos atuais camponeses sem-terra, em comparação com o agronegócio capitalista, com o "velho latifúndio", e com a classe média rural proprietária. Sempre vale lembrar que, na primeira metade do século 20, o campesinato sem-terra de então possuía alguma força econômica, ao trabalhar nas parcelas cedidas pelos latifundiários, em troca de sua semi-servidão.

 

Tais limites impõem à luta pela reforma agrária, mais ainda do que antes, uma escolha clara dos alvos a serem batidos, e das alianças que devem ser realizadas. Se as lideranças camponesas batem com a mesma força contra o "velho latifúndio" e o "novo latifúndio", unificando-os sob uma mesma mira, estão certamente reforçando os inimigos, ao invés de dividi-los, como manda a arte da política.

 

Se, além disso, batem nas classes médias urbanas, culpando-as pelos desastres do capitalismo, e por outros defeitos implícitos ou explícitos, estão simplesmente perdendo aliados importantes, mesmo que nem sempre firmes. Em outras palavras, mesmo que consigam aliar-se aos trabalhadores assalariados urbanos e rurais, isolam-se social e politicamente, tornando ainda mais difícil estruturar uma força social capaz de impor algum tipo de reforma agrária no Brasil.

 

Nas condições do Brasil, quem quer que pretenda realizar algum tipo de reforma, seja a agrária ou outra, terá que contar com o apoio e participação das classes médias, por seu peso econômico, social e político. Pouco importa que até tenha razão em considerar egoístas ou mesquinhos seus interesses de classe. Terá que levá-los em conta porque, se elas estiverem do outro lado, poderão causar estragos profundos à luta popular. A história brasileira não é longa, mas tem muitas experiências a respeito.

 

 

Wladimir Pomar é escritor e analista político.

 

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