Correio da Cidadania

Os significados da absolvição de Renan

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Dois são os aspectos a se levarem em conta para uma primeira análise da absolvição de Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, na sessão de quarta-feira, por 40 votos a 35, com 6 abstenções. Um diz respeito ao rito do processo e o outro, ao jogo político em curso no país. Vamos a eles.

Primeiro, é preciso dizer que, definitivamente, não foi um embate em que os contendores tiveram os mesmos espaços para explicar seus pontos de vista, especialmente na reta final que antecedeu a votação de ontem, quarta-feira, no Senado da República. Muito pelo contrário: o que se viu foi um massacre midiático raramente assistido na política nacional e que talvez só tenha paralelo no episódio do escândalo do mensalão.

Sim, Renan Calheiros, presidente do Senado, foi massacrado na imprensa desde abril deste ano. Pode até ser que Renan seja um picareta e que o lobista da Mendes Jr. tenha pago todas as despesas da ex-namorada do senador, a já célebre Mônica Veloso. O pequeno problema é que ninguém conseguiu provar que o lobista pagou as tais contas. Foi por este motivo que Renan se safou na votação de ontem, e não porque o PT e o governo "operaram" a favor do presidente do Senado (qualquer energúmeno que saiba fazer contas é capaz de perceber que, tendo o PT rachado na votação, o que faltou foi voto da oposição, e não da base aliada...).

Nesta semana, teremos na mídia as mais variadas análises sobre o que ocorreu. A maior parte dos colunistas vai falar em crise moral, avacalhação do Congresso, fim do mundo e outras coisas ainda mais graves. Calma, caro leitor, o Brasil não acabou porque Renan foi absolvido. Na verdade, ainda que o senador seja culpado e no futuro reste provado que ele de fato recebeu favores de seu amigo lobista, a absolvição tem um aspecto positivo que é o de mostrar que a imprensa não tem força (ainda) para assumir o papel de polícia e Justiça. A mídia quer investigar, julgar e condenar, mas este não é o seu papel. Renan merece ser julgado e, provada a sua culpa, condenado, mas na Justiça ou no Senado, se a alegação for de falta de decoro parlamentar. Ninguém pode nem merece ser julgado e condenado pela mídia e é sempre bom lembrar o Caso Dreyfus nessas horas.

Posto isto, vamos então ao que merece ser assinalado do ponto de vista do processo político em curso no país. A absolvição de Renan mostra que, daqui para frente, tudo no Brasil tem como perspectiva a eleição de 2010. A oposição queria a cabeça de Renan para enfraquecer Lula, não para derrubar um político que apenas eventualmente é aliado do presidente, como foi de Collor de Mello e Fernando Henrique. Perdeu a batalha, mas não a guerra. Vai continuar tentando, seja na guerrilha contra Calheiros, seja em outras que ainda poderão surgir, sempre com o objetivo de alvejar Lula. É do jogo e o PT nem pode reclamar, porque já jogou este mesmo jogo estando do outro lado do tabuleiro.

Do que se viu ontem, no Senado, a oposição é mais frágil do que se supunha. Apesar do imenso apoio da mídia, não conseguiu amealhar os votos necessário para mandar Renan para as Alagoas, como pretendia. Nada indica que vá conseguir obstruir as votações importantes no Congresso, embora possa atrapalhar e forçar negociações em torno das matérias relevantes da pauta legislativa. Também é do jogo e é assim em qualquer democracia liberal em funcionamento. Se a mídia joga de um lado, Lula já mostrou que resiste e tem ao seu lado a força dos fatos: seu governo está fazendo os brasileiros viverem muito melhor do que as gestões que o antecederam. O povão não parece muito sensibilizado para os deslizes dos aliados do presidente e opina com os olhos no bolso, que parece bem mais cheio do que no passado, daí a alta popularidade presidencial e a fácil reeleição obtida em meio ao tal "maior escândalo de corrupção" da história.

Doravante, o jogo vai ficando mais pesado a cada dia que passa, porque a eleição de 2010, hoje tão remota, a cada diz que passa fica mais presente. Hoje, a oposição não tem candidato, não tem estratégia e está dividida. Não tem nem sequer um discurso alternativo para dizer o que fará de melhor do que Lula fez. Toda a crítica se resume a um neo-udenismo incapaz de derrubar Renan Calheiros com todas as capas de Veja e editoriais dos jornalões de São Paulo e Rio de Janeiro. Convenhamos, é muito pouco.

Mais do que atestar a força do governo, a absolvição de Renan Calheiros revelou ao país a fraqueza das oposições. Para o presidente Lula, esta foi uma boa notícia, ainda que momentaneamente provoque um sentimento belicista da oposição contra o seu governo. Ademais, para Lula não há nada melhor do que um presidente do Senado fraco e devedor dos decisivos votos petistas.

No fundo, o cenário nacional caminha para um "chavismo" não do presidente ou de seu partido, mas da oposição, que cada vez mais se parece com a venezuelana: antipopular, oportunista, golpista, sem discurso e fragilizada. Tem gente que morre de medo dos cansados tucanos e democratas a cada pio que a mídia dá contra Lula. Bobagem: a política é no fundo um combate diário e a medição das forças, no Senado, mostra que PSDB e DEM pagaram para ver e perderam dinheiro. Renan está rindo à toa, com a ajuda do governo, é certo, mas também em função da enorme incompetência da oposição.

 

Quinze anos anos atrás, Zé Dirceu e sua turma teriam liquidado o presidente do Senado em questão de dias e sem a ajuda da revista Veja. Hoje, Calheiros deve agradecer a Deus pela tibieza de uma oposição que não sabe a que veio nem o que quer. Lula já sabe disto – em 2006 nem mesmo os "aloprados" lhe tiraram a reeleição – e provavelmente espera tirar proveito das bobagens dos adversários em 2010, quando poderá fazer seu sucessor com mais folga do que se supõe hoje. E, para usar uma boa analogia futebolística, deste jeito não vai nem precisar combinar com os russos.

 

 

Luiz Antônio Magalhães é editor de política do DCI e editor-assistente do Observatório da Imprensa (www.observatoriodaimprensa.com.br). Blog do autor: www.blogentrelinhas.blogspot.com

 

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