Autoritarismo e luta pelo poder
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- Waldemar Rossi
- 28/07/2009
Os efeitos causados no Senado pelos desmandos do seu presidente, José Sarney, chegaram ao Planalto e estão provocando fortes rachaduras no "edifício" político do Executivo. Embora saibamos que os senadores do PT têm caminhado de mãos dadas com o presidente Lula, apoiando-o incondicionalmente em todas as suas ações, incluindo as reformas que visam eliminar direitos dos trabalhadores, no episódio em pauta está claro que o racha está dado, já que as divergências vêm à tona. Se para Lula é necessário manter Sarney na presidência do Senado - apesar de tantas falcatruas e crimes por ele cometidos -, porque é seu aliado em tudo o que interessa ao seu projeto de governo, para os senadores petistas, manter apoio a mais um corrupto, publicamente denunciado pela mídia, pode significar suas mortes políticas, porque já sentem na carne os efeitos da decepção popular, através das cobranças amiudadas dos seus eleitores.
Embora não dê demonstração, a postura de Lula em defender Sarney a qualquer preço está deixando sua imagem arranhada no imaginário popular. Isto se deve ao fato de que, mesmo aceitando passivamente tantos desvios éticos por ele praticados, o povo sempre espera que algum político venha provar que vale a pena continuar acreditando no sistema e nas eleições. Apesar de conformado historicamente com a corrupção dos políticos em geral, o sonho popular é que isso possa ser diferente, que possa haver uma nesga de correção em alguém que chegue "lá em cima". Neste sentido, enquanto Lula ainda se sente "por cima da carne seca", os senadores já não têm essa mesma segurança e o racha está se dando num verdadeiro "salve-se quem puder".
Dos 12 senadores petistas, pelo menos oito querem que Sarney deixe a presidência do Senado, conforme notas públicas, incluída a resposta de Suplicy ao ministro José Múcio: "Se o ministro José Múcio tiver o cuidado de ouvir os senadores do Partido dos Trabalhadores, vai ver que esta posição é majoritária e consistente". Já o senador Flávio Arns foi taxativo ao dizer que a posição da bancada é "totalmente contrária" à do presidente Lula. E que "A bancada é uma coisa, o presidente da República é outra". O jogo de braços está dado.
O episódio, se olhadas com olhos bem abertos as curtas histórias políticas do PT e principalmente de Lula, vem revelar que a ânsia pelo poder foi, ao longo dos anos, gerando posturas e práticas de autoritarismo. E isto milhares de petistas puderam bem sentir durante vários anos de vida partidária. Lula, ao perceber que tinha carisma e que isto poderia levá-lo a uma posição de destaque na política nacional, começou a agir para que nada pusesse em risco sua trajetória pessoal. Para tanto, partido, sindicato e central sindical tinham que ser transformados em correias de transmissão de sua ascensão pessoal.
Foi assim que muitos militantes de peso e com possibilidades de fazer um crescimento político com destaque nacional foram sendo, discreta, mas eficaz e progressivamente, colocados à margem da vida partidária e sindical. Muitos o foram até de forma cruel e alguns até execrados publicamente. Lula nunca admitiu que alguém pudesse a ele se equiparar. A diferença com muitos outros ditadores históricos estava na forma sutil e ardilosa de promover a marginalização. Correntes internas, quando não cooptadas, foram eliminadas. Quem ousou não se enquadrar às suas ordens ou aspirações pessoais foi sendo progressivamente desacreditado dentro do "seu" partido, dentro do "seu" sindicato e da própria "sua" CUT.
Ainda é muito cedo para se conhecer o desfecho do atual episódio na vida do PT. Mas está claro que a tal unanimidade tão apregoada pelos dirigentes da corrente majoritária sempre foi pura balela e que decisões foram inúmeras vezes impostas através de posturas autoritárias – embora acompanhadas de sorrisos mal disfarçados ou irônicos – e muita chantagem política. Quem viveu isso na carne sabe como é.
Para quem ainda tiver dúvidas do que vai aqui refletido bastará fazer uma retrospectiva dos anos de governo petista e perceber quanta gente que, tendo acreditado na lealdade política de Lula com seu povo, ao perceber o engodo, deixou seus postos no governo e voltou à vida normal. Alguns deles ousaram escrever sobre suas decepções, enquanto que outros aceitaram fazer apenas breves declarações. Seus testemunhos devem ser considerados. E todos os amantes da justiça têm o dever de agir para que o povo trabalhador não tenha um prejuízo ainda maior do que já vem tendo. Prejuízo por não conseguir entender esse tão enganador e baixo jogo político que visa apenas à disputa pelo poder político e vantagens pessoais, em total desprezo aos direitos e à dignidade de todo um povo.
Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo.
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