Correio da Cidadania

Poupados no noticiário, donos do dinheiro roubado em Viracopos têm histórico de escândalos

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Uma das notícias mais aguardadas do país tem passeado no pé das páginas do noticiário nos últimos dias. Morta, irrelevante, sem destaque.

Já no dia 6 de março, dois dias depois do roubo de cinco milhões de dólares no Aeroporto de Viracopos, Campinas, o jornal A Cidade, de Ribeirão Preto, deu em primeira mão quem eram os donos do dinheiro, em reportagem grande, específica sobre o tema.

Mesmo descobertos os donos, a chamada grande imprensa ignorou. Assim, dias depois apenas, os donos dos cinco milhões de dólares foram citados na chamada grande imprensa. E de passagem, no pé das reportagens.
 
No fim da tarde de sábado, o Jornal da Band anunciou com destaque novas imagens exclusivas do butim. Ao fim da reportagem, breve, de passagem, a informação: “a operação, declarada a Receita Federal, está registrada no nome do Banco Rendimento S/A, com sede em São Paulo, e tinha como destino um banco suíço”.

No Fantástico do dia seguinte, o alvo da notícia novamente eram imagens do assalto. Lá no fim e novamente de passagem, breve, confirma a informação do registro em nome do Banco Rendimento e acrescenta o nome do banco suíço: Banco Raiffeisen.

Embora tratados sem importância no noticiário, sempre de passagem, os nomes do remetente do dinheiro e de quem iria receber na Suíça merecem maior atenção. Os nomes e o histórico de ambos.

No caso do brasileiro, o presidente do Banco Rendimento, César Ades, aparece no Swissleaks, em que clientes com contas secretas no HSBC suíço foram revelados. O presidente do Rendimento é apontado em seis “Relatórios de Inteligência Financeira” (RIF), do COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), por transações com “indícios de ilícitos”. Os RIFS tem data de 10 de agosto de 2014 a 18 de março de 2015.

A conta de César Ades estava em nome da Grenfel Manegement, com sede nas Ilhas Tortolas. Ter offshore não é ilegal, desde que comunicada a existência para a Receita Federal. Em 2015, na ocasião do Swissleaks, César Ades foi procurado pela reportagem do Globo, mas não quis se pronunciar sobre a conta nem sobre as investigações do COAF.

O barulho em torno dos sócios do Rendimento não para por aí. Abramo Douek, diretor do Rendimento, era do Banco Cidade na virada dos anos 90 quando o banco foi acusado de simulação de prejuízos e de operações irregulares na Bolsa de Valores (venda de ouro e de ações inexistentes na data das operações). O Banco Central absolveu os demais dirigentes, mas foi dada uma multa de R$ 3.490 para Abramo Douek, agora diretor do Banco Rendimento.

Nas eleições de 2016 para a prefeitura de São Paulo, Douek foi doador de R$ 7.500,00 para Marta Suplicy (PMDB). Também diretor do Banco Rendimento, Roger Ades teve o nome envolvido em lavagem de dinheiro no começo da década. Era diretor-administrativo da Alpha Club, acusada de servir de fachada para um golpe de pirâmide da fortuna, propaganda enganosa e falta de registro.

De acordo com reportagem da Folha de S. Paulo de 5 de maio de 2000, a empresa patrocinou o Santos Futebol Clube com contrato de R$ 2 milhões na ocasião. De acordo com a reportagem, a Alpha Clube patrocinava também o Comitê Paraolímpico Brasileiro com contrato de R$ 650 mil, dos quais 40% foram pagos até estourar o escândalo.

Já o diretor do Banco Rendimento Marcelo Maktas Melsohn esteve envolvido em caso barulhento por chamar alguém de ladrão: em um restaurante de São Paulo, vociferou contra o ex-ministro Guido Mantega. Processado, pediu desculpas.
 
Presidente do Banco Raiffeisen foi preso na Suíça na última semana

O histórico de escândalos do Banco Raiffeisen, para onde ia o dinheiro roubado em Viracopos, é grande.

Na última semana, quatro dias depois do roubo de Viracopos, embora não se saiba se existe relação com o assalto, o presidente-executivo do Banco Raiffeisen, Pierin Vincenz, foi preso sob acusação de fraude financeira, como informa o site swissinfo.ch.

Logo após a prisão, o Presidente do Conselho de Administração do banco, Johannes Rüegg-Stürm, renunciou.

O banco tem histórico de escândalos por lavagem de dinheiro. No fim da última década, a filial austríaca do banco foi acusada de lavar dois bilhões de dólares da máfia italiana entre 2005 e 2007. Catorze contas bancárias operavam para tal.

No ano passado, a justiça suíça congelou US$ 22 milhões pagos de suborno da Odebrecht que estavam em contas do ex-presidente panamenho Ricardo Martinelli e seus filhos Luis e Ricardo Martinelli Linares. As contas dos filhos do ex-presidente do Panamá estavam em três bancos, entre eles o Notenstein La Roche (filial do Raiffeisen).

Outro lado:

A reportagem enviou as questões abaixo para o Banco Rendimento, através da assessoria de imprensa:

1- De acordo com reportagem exibida no Fantástico na noite deste 11/3, os US$ 5 milhões do assalto no Aeroporto de Viracopos eram remetidos pelo Banco Rendimento. Gostaria que o banco confirmasse tal informação.

2- Qual a razão para tal envio por avião e não por transferência bancária?

3- Se o dinheiro era do banco ou de algum cliente ou clientes específicos?

4- Se a transação estava devidamente registrada e comunicada na Receita Federal e Banco Central?

5- De acordo com reportagens publicadas na ocasião do escândalo do Swiss Leaks, o presidente do banco, Cesar Ades, aparece em seis relatórios do COAF por transações suspeitas. Se gostariam de comentar.

Respostas:

O Banco Rendimento esclarece que a operação em questão trata-se de prática rotineira do mercado de câmbio, que cumpriu rigorosamente todas as normas da Receita Federal e do Banco Central. A instituição está à disposição das autoridades para cooperar com as investigações dos fatos.


Lúcio de Castro é jornalista e editor da Agência Sportlight de Jornalismo Investigativo, onde a matéria foi originalmente publicada. Diretor da série de documentários Memórias do Chumbo - O Futebol nos Tempos do Condor.



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