Correio da Cidadania

Cesáreas e sua indicação

0
0
0
s2sdefault

 

 

 

Como médica, neonatologista e jurista começo afirmando: medicina não é tendência ou modismo, mas a busca da melhor maneira de salvar sem agredir! Medicina humanista é somente isso!

 

Parece pouco, mas não é. Salvar sem agredir é muito complexo. Dessa forma, digo que toda cesárea deve ter uma indicação, seja pelo risco de vida materna, seja pelo sofrimento fetal. Se está tudo normal, o parto irá ser normal!

 

No entanto, em que momento teremos certeza de sua normalidade?

 

E o que vem a ser situações de “risco habitual”, como definido na Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que permite partos cesarianos por escolha da mãe somente a partir da 39ª semana de gestação, já que os compêndios versam que “não há parto sem risco e todo parto é uma situação de possível risco”? Resolução complicada, a meu ver.

 

Enquanto jurista, vejo como uma maneira de regrar situações que ocorrem na sociedade em geral. Ou seja, as mães escolhem o tipo de parto, pois estão diretamente envolvidas, e os médicos “precisam se respaldar”, caso o parto escolhido gere sequelas e futuros processos judiciais.

 

Será que o outro tipo de parto, se escolhido, iria gerar as mesmas sequelas? Difícil saber.

 

E em qual momento iremos definir se há risco ou não para a gestante e o feto? Este irá variar. Pode ser no último momento de um trabalho de parto, como ocorre nos casos de um parto normal que se transforma em cesárea de emergência.

 

Neste caso, quem será consultado? A consulta será baseada em um único fato: salvar a vida da criança e deixá-la, dentro do possível, sem sequelas.

 

Tudo com muito equilíbrio, pois na maioria das vezes quem irá carregar as sequelas de um parto mal conduzido é a criança e, consequentemente, sua genitora. Medicina não se resume em papel, exames ou idade gestacional.

 

Muitas vezes a idade gestacional nada ou pouco tem a ver com o sofrimento em que se encontra uma criança no útero materno. Um feto com 40 semanas de idade

gestacional pode estar em sofrimento fetal, enquanto outro com 36 semanas em perfeita vitalidade. Consequentemente, a idade gestacional não irá definir vitalidade. No primeiro caso será indicada a cesárea para retirar a criança daquele estado e evitar sequelas.

 

A resolução do CMF é perigosa, pois medicina, assim como o direito, é o caso concreto, o momento, e este irá dizer qual a melhor maneira de se conduzir um parto. Isto é, conduzir sem agredir.

 

Conduzir sem agredir não é uma conduta momentânea, mas uma conduta para o futuro. Para um futuro sem pesares para aquela criança, sua mãe e toda a família.

 

Ah, a medicina... Não é gasometria, não é hemograma, mas o paciente em seu momento único. Exames dão suporte ao paciente e não o oposto.

 

Termino destacando que este momento único seja pautado em quem estudou para lidar com GENTE, falar com GENTE, tocar em GENTE. Convencer gente do que é o melhor para seu futuro, expondo devidamente escolhas e riscos.

 

E quanto mais se lidar com gente menos serão necessários papéis, consentimentos e resoluções. Estes, sim, falham e deixam brechas, principalmente no caso concreto.

 

Melina Pecora é médica e jurista, formada pela FMRP-USP com títulos de especialista em Pediatria e Neonatologia.

0
0
0
s2sdefault