Correio da Cidadania

Os cinco anos dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável

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“É impossível que esse modelo, tal como o conhecemos, mantenha de pé as três bases do tripé da sustentabilidade, que na verdade se transformou em um trilema” (Martine e Alves, 2015)

Vamos falar sobre ODS - OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL? - PortoEX
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) sucederam os Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODM). Eles foram propostos como resolução da Rio + 20, Conferência realizada em 2012 e foram elaborados após uma ampla consulta à comunidade internacional e ficaram constituídos por 17 objetivos, 169 metas e mais de 300 indicadores. De 25 a 27 de setembro de 2015, em Nova York, a Organização das Nações Unidas (ONU) realizou um encontro, com status de plenária de alto nível da Assembleia Geral, onde decidiu pela adoção dos ODS. Os indicadores ficaram sob responsabilidade da Comissão de Estatística da ONU.

Os ODSs – a despeito de seus méritos – ajudaram a difundir o mito de que é possível manter o desenvolvimento econômico sem degradar o meio ambiente. Muitas pessoas tentam vender a ideia da viabilidade de um processo de produção de bens e serviços “socialmente justo, economicamente inclusivo e ambientalmente responsável”, mas o chamado tripé da sustentabilidade ocorre de forma manca, pois a economia tem sido inimiga da ecologia.

Na prática, o desenvolvimento sustentável não passa de um oxímoro e o tripé da sustentabilidade não é um tripé, mas um trilema, como mostraram Martine e Alves (2015). Trilema é um termo utilizado quando se tem uma proposição formada de três lemas contraditórios ou que reunem uma escolha difícil entre três opções conflitantes. O crescimento das atividades antrópicas está colocando cada vez mais pressão sobre o Planeta. Está ficando difícil conciliar crescimento econômico, bem-estar social e sustentabilidade ambiental.

Aliás, está aumentando a ruptura entre os polos desse trilema. O pior é que quanto mais avança o modelo de produção e consumo hegemônico, maiores são os riscos globais de colapso, pois temos um “fluxo metabólico entrópico” que dissipa a energia e degrada o “capital natural” da Terra.

No artigo “The contradiction of the sustainable development goals: Growth versus ecology on a finite planet” J. Hickel (2019) observa que existem dois lados dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que aparecem em contradição (oximoro). Por um lado, os ODS dizem que é preciso que a humanidade alcance “harmonia com a natureza” para proteger o planeta da degradação, com metas específicas estabelecidas nos Objetivos 6, 12, 13, 14 e 15. Por outro lado, propõe um crescimento econômico global contínuo equivalente a 3% ao ano, conforme descrito no Objetivo 8, como um método para alcançar o desenvolvimento sustentável. São objetivos contraditórios.

Mas os ODS assumem que as melhorias de eficiência serão suficientes para conciliar a tensão entre crescimento e sustentabilidade ecológica. O artigo de Hickel (2019) testa esta hipótese e conclui que um crescimento global de 3% ao ano torna empiricamente inviável alcançar quaisquer reduções no uso agregado de recursos globais e nas reduções rápidas nas emissões de CO2 suficiente para permanecer dentro do orçamento de carbono de 2º C.

Em outras palavras, o objetivo de número 8 viola as metas de sustentabilidade dos ODS. Além disto, a pandemia do SARS-CoV-2 gerou um pandemônio econômico que vai dificultar o cumprimento das metas de redução da pobreza e de inclusão social.

A humanidade já ultrapassou a capacidade de carga do Planeta e qualquer perspectiva de sustentabilidade deve levar em consideração a necessidade do decrescimento demoeconômico para reduzir a Pegada Ecológica e para recuperar a Biocapacidade via restauração dos ecossistemas.

Referências

ALVES, JED. Como acabar com a fome no mundo?, Ecodebate, RJ, 24/01/2012. http://www.ecodebate.com.br/2012/01/24/como-acabar-com-a-fome-no-mundo-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

ALVES, JED. Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS): boa intenção, grande ilusão, Ecodebate, RJ, 11/03/2015
http://www.ecodebate.com.br/2015/03/11/objetivos-de-desenvolvimento-sustentavel-ods-boa-intencao-grande-ilusao-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

ALVES, JED. O mito dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), Ecodebate, RJ, 23/09/2015
http://www.ecodebate.com.br/2015/09/23/o-mito-dos-objetivos-de-desenvolvimento-sustentavel-ods-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

ALVES, JED. O quintilema da Agenda 2030 da ONU, Ecodebate, RJ, 20/02/2017
https://www.ecodebate.com.br/2017/02/20/o-quintilema-da-agenda-2030-da-onu-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

ALVES, JED. Dilema: crescer sem degradar, # Colabora, RJ, 21/09/2016
http://projetocolabora.com.br/inclusao-social/o-quintilema-da-agenda-2030/

CORREA, S.; ALVES, J. E. D. As Metas de Desenvolvimento do Milênio: grandes limites e oportu-nidades estreitas. Revista Brasileira de Estudos de População, v. 22, n. 1, p. 177-189, 2005. http://www.abep.nepo.unicamp.br/docs/rev_inf/vol22_n1_2005/vol22_n1_2005_11pontodevista_p177a190.pdf

ALVES, José Eustáquio Diniz. Os 70 anos da ONU e a agenda global para o segundo quindênio (2015-2030) do século XXI. Rev. bras. estud. popul. [online]. 2015, vol.32, n.3, pp. 587-598. http://www.scielo.br/pdf/rbepop/v32n3/0102-3098-rbepop-32-03-0587.pdf 

HICKEL J. The contradiction of the sustainable development goals: Growth versus ecology on a finite planet. Sustainable Development. 2019; 1–12. https:// doi.org/10.1002/sd.1947
https://www.researchgate.net/publication/332422285_The_contradiction_of_the_sustainable_development_goals_Growth_versus_ecology_on_a_finite_planet 

MARTINE, G. ALVES, JED. Economia, sociedade e meio ambiente no século 21: tripé ou trilema da sustentabilidade? R. bras. Est. Pop. Rebep, n. 32, v. 3, Rio de Janeiro, 2015 (português e inglês)
http://www.scielo.br/pdf/rbepop/v32n3/0102-3098-rbepop-S0102-3098201500000027P.pdf 

José Eustáquio Diniz Alves, sociólogo, mestre em economia e doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (CEDEPLAR) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). É colunista do Portal Ecodebate, onde este artigo foi originalmente publicado.

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