Correio da Cidadania

Pedro Castillo e os dramas da política

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Quando Pedro Castillo foi eleito presidente do Peru a esperança era de que o país iria encontrar seu caminho no rumo da vida digna para a população, acossada por sucessivos governos corruptos tocados pelos representantes da classe dominante local, que por sua vez é capacho das empresas estrangeiras e países centrais. Castillo, um professor, sindicalista e lutador social, viria para apontar mudanças num país em escombros. Mas, o que se vê é uma oposição disposta a não permitir que ele governe, tendo como aliada a mídia comercial que capricha nas campanhas propagandísticas contra o presidente.

Desde a formação do seu primeiro gabinete de governo a oposição vem colocando entraves, exigindo que determinadas pessoas não possam estar no governo. E o primeiro grande erro de Castillo foi ceder. Ao abrir mão de nomes de sua confiança por conta da resistência no legislativo, o presidente abriu um flanco que não para se de alargar. Já são cinco gabinetes diferentes formados. Desde julho de 2021, quando assumiu o governo, até agora ele vem sofrendo sucessivos ataques e tentativas de impedimento por parte do legislativo e da fiscalia nacional (órgão semelhante a Procuradoria). Acusado de trair a nação e de corrupção, tanto o Congresso quando a fiscal Patricia Benavides, mantêm campanha cerrada na tentativa de tirar Castillo do poder. O fujimorismo - que ainda é forte - é o grande impulsionador da cruzada.

Até agora já foram duas tentativas frustrada de impedimento no Congresso e cinco ações na Fiscalia, por isso os ataques começam a se fazer também na família do presidente, como a investigação contra sua filha Yenefer Paredes, também acusada de corrupção. Esta semana um juiz ordenou que se entrasse na casa do presidente, com ordem de prender Yenefer. Foi um show midiático de grande potência e repercussão. Jogada para enfraquecer e desqualificar Castillo. Tudo isso acontece no mesmo momento em que o Congresso dá início a outro processo pedindo a destituição do presidente. Lá, como cá, também teve apresentação de gráficos do Ministério Público, muito bem divulgado pela mídia local.


O powerpoint deles

Diante de mais esse ataque Pedro Castillo falou neste dia 9 ao povo peruano em cadeia nacional denunciando mais uma tentativa de desestabilização e pedindo que não permita uma quebra constitucional, visto que os ataques seguem sem parada com o intuito de sacá-lo do governo.

Enquanto tudo isso acontece o presidente do Peru tenta colocar em prática algumas de suas propostas, mas tem sido difícil, visto que a maior parte do tempo precisa estar se defendendo dos ataques judiciais e parlamentares.

Uma de suas principais promessas, que foi a de fazer uma nova Constituição, que sepultasse de vez o fujimorismo, morreu no Congresso. O projeto apresentado por Castillo foi arquivado. E, não bastasse isso, a crise econômica que se expressa em todos os países latino-americanos também faz estragos no Peru, provocando mobilizações e protestos contra o preço da gasolina e dos alimentos. A instituição de um estado de emergência e a repressão aos movimentos não tem ajudado muito o presidente, que vai se tornando impopular também entre os seus aliados.

Para os mais empobrecidos Castillo criou uma série de políticas públicas, entre eles o vínculo Wanuchay, uma espécie de bolsa-família, destinado aos pequenos agricultores (65 mil produtores de agricultura familiar) e os títulos Yanapay, para famílias sem renda, cerca de 13,5 milhões de peruanos. São medidas que dão algum fôlego para as famílias, mas como Castillo não consegue avançar nas propostas de mudança estrutural, acabam sendo apenas paliativas. Sozinhas, não se sustentam.

A batalha que hoje se trava no Peru é a da permanente inviabilização de qualquer proposta que venha do executivo, acompanhada de um sistemático ataque moral. Nas redes sociais, o que se vê são ataques à figura do presidente pintado como "ladrão" e "corrupto", que é para colar nele a mesma etiqueta que levou às sucessivas quedas de presidentes anteriores. A "democrática" luta contra a "corrupção" não consegue apresentar provas, mas segue firme no campo simbólico.

É fato que Pedro Castillo não tem uma formação sólida de esquerda, apesar de ter sido declarado como tal. Tanto que logo após se eleger começou a se distanciar do partido Peru Livre, afirmando que não era comunista e sim um socialista conservador, seja lá o que isso seja. Observando a realidade e o peso da direita peruana ele acreditou que poderia governar cedendo alguns anéis, mas a história está aí para provar que não há qualquer possibilidade de uma política de conciliação com a classe dominante dar certo.

Castillo conseguiu entre trancos e barrancos terminar o primeiro ano de mandato, mas a batalha contra ele segue sem trégua. Resta saber se o presidente conseguirá o apoio popular para seguir governando. Fez uma fala dura no discurso feito ontem à nação, mas vai precisar mais do que isso para cativar os peruanos que não conseguem vislumbrar mudanças significativas sob a batuta do professor.

Elaine Tavares

Elaine Tavares é jornalista e colaboradora do Instituto de Estudos Latino-Americanos da UFSC

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