Do sangue de Valmir renascerão sementes de vida
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- 26/10/2007
Em pleno início do século 21, os movimentos sociais e entidades do campo continuam sua luta pela conquista da terra, o agronegócio concentrador de terra e renda, por sua vez, aliado às multinacionais do setor agroindustrial, responde com a violência. A luta sem trégua e sem fronteiras que travam os pequenos por um pedaço de chão e contra as múltiplas formas de exploração de seu trabalho amplia-se por todo o canto e lugar.
Assim, o campo contém as duas faces da mesma moeda. De um lado, está o agronegócio, roupagem moderna do velho e atrasado latifúndio, gerador de pobreza, escravidão e violência. De outro, a rebeldia dos camponeses.
Diante desta realidade, a mesma estatística que registra a violência contra camponeses, retransmite o recado vindo do campo: nem violência de jagunços, de governos locais ou preconceitos da mídia são suficientes para impedir a paciente luta dos trabalhadores e trabalhadoras do campo e de parte dos excluídos da cidade, que querem retornar à terra para resgatar sua dignidade e identidade camponesas. A resistência das camponesas e camponeses se transforma em ações e lutas concretas na busca de direitos que lhes são, insistente e cotidianamente, negados.
As estatísticas da Comissão Pastoral da Terra (CPT) revelam a marcha ascendente dos conflitos no campo. Em 2000, aconteceram 629 conflitos; em 2001, foram 880; em 2002, registraram-se 925; em 2003, foram 1.690; e em 2004, mais de 1.700 conflitos. Em 2006, foram registradas 1.212 ocorrências de conflitos relacionados com a posse, uso, resistência e luta pela terra, que compreende os conflitos por terra, as ocupações e acampamentos, envolvendo mais de 140 mil famílias.
Em 2007, mais uma vez o latifúndio e o agronegócio demonstram e seu verdadeiro caráter brutal e intolerante. No último dia 21 de outubro, por volta das 13h30min, o acampamento da Via Campesina/MST, no campo de experimentos transgênicos da empresa SYNGENTA, em Santa Tereza Oeste, PR, foi invadido por uma milícia de pistoleiros. O militante do MST, Valmir Mota de Oliveira, mais conhecido como KENO, foi executado à queima roupa com dois tiros no peito. Nesta ação violenta, executada por mais de 40 pistoleiros, ficaram gravemente feridas outras cinco lideranças.
A Syngenta é uma das líderes mundiais na área do agronegócio, uma das líderes em proteção de cultivos e ocupante da terceira posição no ranking do mercado de sementes, cujas vendas em 2006 foram de aproximadamente US$ 8,1 bilhões, e com ações nas Bolsas de Valores da Suíça (SYNN) e de Nova York (SYT). Essa empresa utiliza serviços de uma milícia armada que age através de uma empresa de fachada, a NF Segurança, em conluio com a Sociedade Rural da Região Oeste (SRO) e o Movimento dos Produtores Rurais (MPR).
O Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo composto por 45 entidades da sociedade civil vem a publico EXIGIR das autoridades competentes:
1ª - punição dos responsáveis pelos crimes, principalmente dos mandantes, com a prisão imediata dos elementos da milícia;
2º - fechamento da empresa “NF”;
3º- garantia de segurança de vida aos trabalhadores e suas lideranças do acampamento na região;
4ª - desapropriação, pelo governo federal ou estadual, desta área por interesse social colocando-a nas mãos dos trabalhadores para produzir alimentos.
Solidários com a dor e sofrimento da família do companheiro Valmir, o FNRA conclama seus militantes, amigos e simpatizantes a continuar lutando por uma ampla reforma agrária e pelo estabelecimento de um limite para a propriedade da terra no Brasil. Só com a reforma agrária se conseguirá garantir a soberania territorial e alimentar de nosso país e se poderá barrar a crescente entrega das terras brasileiras para estrangeiros enquanto milhares de famílias brasileiras continuam acampadas debaixo de lonas pretas à margem de nossas estradas.
Neste contexto, a única posição defensável é.continuar seguindo a antiga palavra de ordem “a luta continua companheiro!”. Inclusive contra as políticas do próprio governo do Presidente Lula. Parece que a sina dos que lutam pela reforma agrária, como escreveu Frei Beto, em A Mosca Azul, é nunca poder perder a esperança; “a esperança é um pássaro em vôo permanente. Segue adiante e acima de nossos olhos, flutua sob o céu azul, não se lhe opõe nenhuma barreira”.
Após cinco anos de governo, apesar de todas as decepções com o não avanço da política de reforma agrária, na esperança do avançar dos movimentos sociais para o enfrentamento desse modelo de agricultura que tem propagado a morte das sementes, da cultura, da biodiversidade e dos trabalhadores que lutam por seu direito à terra prestamos nossa homenagem ao companheiro:
EM SUA MEMÓRIA, VALMIR MOTA DE OLIVEIRA (KENO), SEGUIMOS...
Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo,
Brasília-DF, 23 de Outubro de 2007.