Mançano: Morte na Syngenta sela união de atrasado e moderno na violência
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- 01/11/2007
O professor de geografia da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Bernardo Mançano Fernandes, especialista em questão agrária, afirma que ficou impressionado com a execução de Valmir Mota de Oliveira, o Keno, militante da Via Campesina e do MST, na área de experimentos ilegais da Syngenta, que contratou milícia armada para enfrentar os trabalhadores rurais.
"Não é muito comum que as multinacionais utilizem desse tipo de violência. Elas procuram meios político–legislativos para terem o controle dos territórios e dos modelos produtivos. Esses meios são sempre violentos por que atingem milhares de pessoas. Todavia, na região de Cascavel uniram-se atrasado e moderno e acabaram utilizando a violência física", afirma.
Mançano possui graduação em Geografia (1988), mestrado
Professor dos cursos de graduação e pós-graduação da Universidade Estadual
Paulista (Unesp), campus de Presidente Prudente, onde preside o conselho
editorial da coleção Geografia em Movimento, publicado pela Editora Expressão
Popular. Publicou "A formação do MST no Brasil" e "Brava Gente"
(co-autoria com João Pedro Stedile), além de diversos verbetes na Enciclopédia
Contemporânea da América Latino e do Caribe.
A região de Cascavel é berço do MST e, ao que parece, até o momento a
questão agrária no local ainda parece não ter sido foi resolvida. Há um cansaço
tanto de sem-terra e proprietários para negociar e tentar resolver a questão?
Em primeiro lugar é fundamental compreender que não existe solução para a
questão agrária. É possível minimizá-la, mas é impossível resolvê-la. Ela é uma
questão estrutural do capitalismo, criada pelas desigualdades geradas pelo
desenvolvimento econômico. A negociação é condição essencial para a minimização
da questão agrária. Para tanto é preciso diminuir as desigualdades sociais. Os
índices de concentração fundiária na região de Cascavel permanecem os mesmos
desde que o MST nasceu em 1984.
A morte ocorrida no conflito, domingo, dia 21, mostra que milícias
armadas continuam agindo nesses locais impunemente? Isso se tornou mais comum
com o tempo?
Sim, o que impressiona é que isso acorra com a Syngenta Seeds. Não é muito
comum que as multinacionais utilizem desse tipo de violência. Elas procuram
meios político–legislativos para terem o controle dos territórios e dos modelos
produtivos. Esses meios são sempre violentos por que atingem milhares de
pessoas. Todavia, na região de Cascavel uniram-se atrasado e moderno e acabaram
utilizando a violência física.
Os proprietários estão mais preparados para conter possíveis invasões?
O sr. acredita que haja uma descrença, por parte deles, de que as autoridades
possam intermediar e resolver esses conflitos? De que maneira os fazendeiros
poderiam agir nesses casos? O governo poderia de alguma forma, intermediar
esses conflitos? Houve omissão? De que lado?
Há diferentes tipos de organizações de ruralistas. Algumas são mais fascistas
outras mais democráticas. Sabem que o governo tem atuado no sentido de
minimizar a questão agrária. Mas não é isso que eles querem. Eles querem
extirpar os sem-terra, o que é impossível, pois são eles mesmos que criam os
sem-terra. Quanto mais concentram a terra, mais produzem sem terra.
Os ruralistas dizem que os sem-terra se aproveitam do apoio que têm de
parte da opinião pública e do governo para promover as invasões. Dizem também
que o modelo de reforma agrária, como é conduzido hoje pelo governo, está
esgotado. Como o sr. vê essas análises?
Na verdade, eles querem esconder que o modelo que está esgotado é o modelo da
monocultura em grande escala, que tem gerado concentração de riqueza e
destruição sócio-ambiental. Por onde eles passam, há diferentes formas de
devastação. A reforma agrária tem minimizado as desigualdades, gerando trabalho
e produzindo alimentos para o desenvolvimento local.
Por que exatamente aquela região no Paraná é considerada ainda uma área
conflituosa (a situação descrita pelo repórter enviado é que há no local
verdadeiros coronéis "vacinados", por assim dizer, contra movimentos
sociais)? Quais outros locais do país o sr. colocaria na lista de regiões mais
conflituosas em relação à questão agrária, onde ruralista se propõem a fazer o
papel de Estado e da lei?
De acordo com o Banco de Dados da Luta pela Terra, que coordeno na UNESP,
Cascavel, Pontal do Paranapanema, sudeste do Pará, Médio Vale do Rio São
Francisco e entorno de Brasília são regiões onde existem os ruralistas mais
violentos, que querem fazer a lei com as próprias mãos.
Fonte: MST