Cultura de impunidade marca violência no campo no Pará
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- Andrea
- 09/05/2008
"Como foi que se transformou em prostituta a cidade fiel, possuída
pelo direito? Nela, quem morava era a justiça, agora são os assassinos." Is. 1, 21
O mundo assistiu perplexo a mais um caso de impunidade no Pará. Vitalmiro Bastos de Moura, conhecido como Bida, foi absolvido pelo tribunal do júri, em Belém do Pará. Segundo os dados da CPT, em 40 anos de luta e resistência na terra, mais de 800 trabalhadores, lideranças sindicais e sem terra, religiosos e ativistas dos direitos humanos, foram assassinados no Pará. A quase totalidade desses crimes foi cometida por pistoleiros a mando de fazendeiros e madeireiros. Nesse período, apenas 6 mandantes foram julgados e condenados pela justiça paraense, no entanto, nenhum deles permanecem presos. O Poder Judiciário paraense parece ser conivente até mesmo com o descumprimento das penas dos pistoleiros condenados. Nos últimos anos, três pistoleiros condenados por assassinato de lideranças sindicais tiveram suas fugas facilitadas das penitenciárias estaduais. O último foi Welinton de Jesus, condenado a 29 anos de prisão, pelo homicídio do sindicalista Dezinho, teve sua fuga facilitada por uma juíza da vara de execuções penais da capital. Fazendeiros mandantes, em geral, grandes proprietários de terras, usam todo o seu poder de influência financeira e política para permanecerem livres e impunes dos crimes juntamente com os executores e intermediários.
A impunidade no Pará, em crimes ligados a posse da terra, se mantém em função da permanência de outros crimes ligados à grilagem de terra, trabalho escravo e exploração madeireira que mantém o poderio e a prepotência de uma minoria de fazendeiros e madeireiros que não abandonaram suas práticas tradicionais de imposição da violência no campo. Soma-se a isso, a inércia dos aparelhos repressores do Estado, que atuam na maioria das vezes, contra os camponeses e na defesa da oligarquia agrária do Pará. De acordo com o monitoramento feito pela CPT, 73,19% dos casos de assassinatos no campo no Estado, não são apurados, 8,11% dos inquéritos policiais não são concluídos e apenas 18,68% dos crimes transformam-se num processo judicial. No entanto, a média de tramitação desses processos está acima dos 10 anos, provocando a prescrição da maioria dos casos.
A absolvição do fazendeiro Vitalmiro é vergonhosa, pois durante toda a investigação policial e judicial, ficou devidamente provado que Bida e Regivaldo prometeram 50 mil reais para que Raifran assassinasse a missionária. Fato que ensejou na condenação de Bida no primeiro julgamento, a 30 anos de prisão. Durante o último júri, absolveu-se o fazendeiro e ficou provado pelo promotor de justiça e os advogados assistentes de acusação que o pistoleiro Raifran e o intermediário Amair, mudaram seus depoimentos, comprados por mais de 100 mil reais. Prometeram 50 mil para assassinar Dorothy e pagaram mais de 100 mil para que mudassem seus depoimentos e Bida fosse absolvido. O Estado e o Poder Judiciário precisam urgentemente apurar essa denúncia e punir os responsáveis por mais esse crime, pois a impunidade estimula a continuidade da violência.
A absolvição do fazendeiro Bida, se insere no conjunto de violência que nas ultimas décadas vem se alastrando na Amazônia contra a floresta e os povos que nela habitam. Não nos esquecemos do assassinato de Pe Josimo, Chico Mendes, massacre de Corumbiara, Eldorado e tantos outros, que ainda clamam por Justiça! Preocupa-nos a situação de ameaças constantes de morte contra bispos, padres, sindicalistas, indígenas, etc que se vêem obrigados a andarem protegidos por policiais militares para não serem assassinados por pistoleiros a mando de madeireiros e fazendeiros. A absolvição do fazendeiro agrava ainda mais essa situação aumentando a insegurança daqueles que defendem a floresta e os direitos dos camponeses.
Clamamos pelo fim da impunidade e re-afirmamos o nosso compromisso pela Reforma Agrária e pela distribuição da terra e da renda que possa garantir alimento e vida e, esperamos confiantes que o Tribunal de Justiça do Estado do Pará, corrija o equívoco cometido pelo corpo de jurados que contrariou flagrantemente as provas existentes no processo e fará restabelecer a JUSTIÇA em relação ao assassinato da missionária Dorothy Stang.
Belém, 08 de maio de 2008.
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil Regional Norte 02 (Cáritas Regional Norte 02, Comissão Pastoral da Terra, Comissão Justiça e Paz, Pastoral do Menor, Conselho Indigenista Missionário, Pastoral da Criança, Comunidades Eclesiais de Base, Pastoral da Juventude, Pastoral da Comunicação, Pastoral da Juventude Rural, Pastoral da Pessoa Idosa, Pastoral Carcerária)
Comitê Dorothy
Conferência dos Religiosos do Brasil
UNIPOP – Instituto Universidade Popular
FAOR – Fórum da Amazônia Oriental
FASE – Federação de Órgão para Assistência Social e Educacional
ABONG – Associação Brasileira de ONG´s
SDDH – Sociedade Paranaense dos Direitos Humanos
Movimento de Mulheres Trabalhadoras de Altamira
Comitê de Defesa da Vida das Crianças de Altamira
Fórum Popular de Altamira
Fórum Dorothy Stang de Direitos Humanos
Mutirão pela Cidadania
GTA Regional Xingu
Movimento de Mulheres do Campo e da Cidade do Estado do Pará
Maiores informações: José Batista Afonso - coordenação nacional da CPT e um dos advogados de acusação do caso Dorothy (94 3321-2229 / 94 9136-0253)