‘CIM’ ou Não para o Plano Nacional sobre Mudanças Climáticas?
- Detalhes
- Andrea
- 25/09/2008
O governo federal, mais uma vez, demonstra que não está preparado para lidar seriamente com os desafios brasileiros de um problema global: o aquecimento planetário e as mudanças climáticas. O próprio governo, por intermédio do ministro de Meio Ambiente Carlos Minc e do Comitê Interministerial de Mudança de Clima (CIM), chefiado pela ministra-chefe da Casa Civil Dilma Rousseff, havia anunciado e reiterado que no dia 23 de setembro tornaria pública a primeira versão do Plano Nacional sobre Mudanças Climáticas. Essa versão, segundo o governo, ficaria aberta para comentários através de consulta pública por 30 dias para, depois, ser lançado pelo presidente Lula em evento anterior à 14ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), em Poznan, Polônia.
Apesar de, nas negociações internacionais, o Brasil desempenhar um papel importante; no campo interno, o governo federal tem políticas setoriais e programas que aprofundam a crise ambiental e social, uma vez que dão prioridade ao crescimento econômico irresponsável, desconsiderando os impactos ecológicos e a necessidade da integridade de nossos ecossistemas para permitir um desenvolvimento sustentável e digno para todos e todas. Isso se traduz em agressiva dedicação a obras e iniciativas altamente questionáveis, como as usinas hidrelétricas no Rio Madeira e outras, as usinas nucleares, a expansão da fronteira agrícola e pecuária, transposição de águas do rio São Francisco e outras iniciativas incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Nos últimos anos, o governo federal ignorou a responsabilidade brasileira, diferenciada dos países industrializados e de outros países em desenvolvimento mais pobres, no tocante a compromissos apropriados referente às suas emissões de gases de efeito estufa. É sabido que a maior parte das emissões brasileiras provém do desmatamento e de mudança do uso do solo, mas as tendências da evolução do setor energético apontam para aumento de emissões pelo uso de combustíveis fósseis (seja para termoelétricas ou transportes). A mera expansão do uso de etanol e de biocombustíveis não é resposta adequada e de longo prazo para uma política séria de transporte e mobilidade sustentável. Além disso, não é suficiente para responder aos desafios globais de mitigação de gases de efeito estufa e, portanto, não é a única contribuição que o Brasil, como quarto emissor global, pode oferecer.
Um plano sério em qualquer tema ou área deve ter objetivos e ações que possam ser mensuráveis, verificáveis e relatáveis. Isso se traduz em metas e compromissos para os diferentes setores da economia e da sociedade, bem como responsabilidades e atribuições para os diferentes níveis de governo. O Brasil não pode, em função de sua responsabilidade comum e diferenciada, fugir do debate sobre a adoção de compromissos nacionais que sinalizem na direção da desaceleração do crescimento das emissões, estabilização e posterior redução, em prazos compatíveis com a necessidade mundial de conter o aquecimento global nos níveis indicados pelo IPCC. Isso significa que o país deve urgentemente ter um plano com ações e objetivos que permitam hoje, e ao longo da próxima década, ampliar a sustentabilidade sócio-ambiental do nosso desenvolvimento por um lado e contribuir efetivamente para os esforços mundiais de mitigação do aquecimento global, por outro.
O atraso na divulgação de um rascunho do Plano é sinal também da incapacidade do governo de conduzir um processo participativo e bastante abrangente para a pactuação de ações em mudança de clima. O CIM, criado pelo Decreto n° 6.263 de novembro de 2007, tinha inicialmente até 30 de abril de 2008 para apresentar uma versão preliminar do Plano, prevendo consultas públicas. Nem o prazo, nem o processo de consultas, foram levados a cabo pelo governo federal. Algumas consultas só foram realizadas por iniciativa do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas (FBMC), com apoio financeiro estrangeiro e em parceria voluntária com entidades de diversos setores da sociedade, entre eles o Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (FBOMS).
Em 11 de setembro, na apresentação da síntese das consultas setoriais feitas pelo FBMC, percebeu-se que alguns setores privados e do governo se mostram resistentes à adoção de compromissos nacionais para limitação ou estabilização das emissões brasileiras, apesar desses setores muitas vezes declararem publicamente que são favoráveis às metas. Nas consultas, representantes governamentais afirmavam que o plano conteria somente ações de curto prazo já em curso e, portanto, não é surpresa, conforme noticiado pela mídia, que o resultado desse processo seja um simplório apanhado de várias ações esparsas e desconexas que o governo pretende chamar de "Plano", ou talvez queira fazer a sociedade acreditar que há "estratégia". Não há!
Temos um governo deslumbrado com o petróleo do pré-sal, com o crescimento econômico e insensível, imaturo, em face ao cataclisma climático que se anuncia. Quem se preocupa com o futuro do país deve organizar sua agenda para preparar-se, evitar, mitigar e – inclusive – aproveitar as oportunidades da nova realidade crítica que se agiganta. Fomos abençoados, "gigantes pela própria natureza", mas não podemos viver "deitados em berço esplêndido".
Nosso governo - deslumbrado com a expansão agrícola no Cerrado, com a produção de carne na Amazônia, com o crescimento das colunas de fumaça das fábricas, dos escapamentos dos automóveis e das motocicletas – ainda não consegue envidar esforços para gerar uma estratégia nacional para as mudanças climáticas. A competência para elaborar este Plano é do CIM, presidido pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff que, como divulgado pela mídia, pressiona o quanto pode (e não pode) por novas usinas hidrelétricas, novas usinas nucleares, por novos projetos concentradores de capital; porém, não quer se empenhar com questões sócio-ambientais. O ministro do Meio Ambiente, que coordena o Grupo Executivo do CIM, não consegue articular a elaboração do Plano Nacional sobre Mudanças Climáticas. E assim, nós do GT Clima/FBOMS nos manifestamos com veemência em repúdio à inépcia do CIM. Aqui estamos, e pressionamos, pois como sabemos todos: "O clima vai esquentar e é bom se planejar para o que virá!"
Grupo de Trabalho de Mudança do Clima – GT Clima/FBOMS
Contato:
Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (FBOMS)
Fone (61) 3033.5535 e 3033.5545
E-mail e Website: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo. / http://www.fboms.org.br/