Correa e Odebrecht: bom exemplo que vem do Equador
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- Andrea
- 26/09/2008
Na recente tensão entre o governo equatoriano e a empreiteira brasileira Odebrecht, um aspecto deve ficar bem claro: a pendenga envolve uma nação insatisfeita com serviços mal prestados e uma empresa estrangeira que não cumpriu com sua parte naquilo que foi combinado. É isso e nada mais que isso. Nem de longe se trata de qualquer tipo de desentendimento entre Brasil e Equador, como se tem pintado em parte da imprensa.
O bom relacionamento entre os dois países se mantém no mesmo patamar, conforme as recentes declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da ministra das Relações Exteriores do Equador, Maria Isabel Salvador.
"É uma situação que tem a ver com a relação de uma empresa privada com o Estado equatoriano. De nenhuma maneira essa situação afeta as excelentes relações bilaterais que mantemos com o Brasil e com seu governo, com quem temos áreas muito importantes de colaboração em muitos temas", ressaltou a ministra.
Lula, por sua vez, disse confiar num rápido acordo entre as partes envolvidas. ''Na hora em que chegar a necessidade de eu falar com o Rafael (Correa), falarei'', disse. ''Quando tiver uma decisão, tenho certeza de que o presidente Rafael Correa vai me telefonar e vai discutir comigo, como dois dirigentes civilizados fazem''.
Exageros por toda parte
Não poderia ser diferente a reação dos líderes políticos dos dois países. Jornais como O Estado de S. Paulo chegam a falar em ''crise bilateral'' ao tratar do caso. O governo equatoriano, no entanto, exige apenas o que lhe é de direito: o pagamento de uma indenização por falhas no funcionamento e paralisação da central hidrelétrica San Francisco, construída pela empreiteira. A obra apresentou falhas e deixou de funcionar um ano depois de ser concluída.
Paralisada desde 6 de junho, a hidrelétrica San Francisco é a segunda maior do Equador e o governo argumenta que sua paralisação estaria colocando em risco o abastecimento de energia no país. A Odebrecht também é responsável pelas obras de outra hidrelétrica, uma rodovia e um aeroporto no Equador.
A grita do dia, após a intervenção do governo nas obras, diz respeito à ''ameaça'' de Rafael Correa em não pagar ao BNDES o empréstimo de US$ 243 milhões, tomado para a construção da hidrelétrica.
''Esse crédito foi dado por meio da Odebrecht e também tem graves irregularidades, porque tem dinheiro que nem sequer entra no país, é dinheiro que se contabiliza lá (no Brasil) como crédito interno e na verdade é um dinheiro emprestado à empresa. É um empréstimo de mais de US$ 200 milhões para um projeto que não presta'', explicou Correa.
Dívida não é do Equador
A ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, trouxe um pouco de luz ao imbróglio nesta quinta-feira (25), ao comentar rapidamente o caso. ''O empréstimo foi feito para a Odebrecht, e não para o governo equatoriano''.
Em nova nota divulgada ontem, a Odebrecht disse que os problemas que resultaram na paralisação da usina decorreram ''de erupção do vulcão Tungurahua (...) não considerada no projeto de engenharia de responsabilidade do governo equatoriano''.
A empresa disse que só não assinou um acordo com o governo, o qual incluía assumir os custos dos reparos, estimados em US$ 25 milhões, e a extensão da garantia por mais um ano, porque não teve a ''anuência'' das outras empresas do consórcio, a francesa Alstom e a austríaca VA Tech Hydro.
Esquema conhecido
Esse jogo de ''não é comigo'' praticado pelas empresas envolvidas com a hidrelétrica equatoriana já é conhecido dos brasileiros, bem como alguns dos personagens envolvidos. Entre os funcionários brasileiros da Odebrecht que tiveram os direitos constitucionais suspensos pelo governo do Equador devido a problemas na hidrelétrica San Francisco está o engenheiro Fabio Gandolfo.
Em janeiro de 2007, Gandolfo comandava a construção da linha 4-amarela, cenário do maior acidente da história do metrô de São Paulo, quando a abertura de uma cratera perto da marginal Pinheiros deixou sete mortos e vários feridos. Laudo do IC (Instituto de Criminalística) apresentado em agosto apontou problemas na execução da obra e deficiência na fiscalização.
Segundo informações da Folha de S.Paulo, depois do acidente, Gandolfo, funcionário da empresa há 20 anos, foi ''promovido'' a chefe das operações no Equador, cargo que ocupa desde junho de 2007.
Exemplo a ser seguido
Cada caso dessa natureza merece ser analisado individualmente, mas a postura do presidente Rafael Correa precisa servir de exemplo não somente para países da América do Sul, mas para todas as nações em desenvolvimento do planeta.
Não há mais espaço nas relações político-econômicas para empresas multinacionais entrarem em outros países, executarem serviços de baixa qualidade e nada ser feito contra tais ações. O que deve ser buscado em pleno século 21 é um procedimento simples e perfeitamente cabível a qualquer nação soberana: serviços bem feitos devem ser pagos corretamente; descumprimento de contrato deve ser resolvido judicialmente, não a partir de pressões e gritaria via imprensa.
Fonte: Pátria Latina.