Correio da Cidadania

Movimentos sociais denunciam uso de poder público em prol das usinas no rio Madeira

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Uma verdadeira força-tarefa, que conta com uma articulação entre o setor público e o privado, está sendo posta em marcha em Rondônia, especialmente na capital Porto Velho. O objetivo: coletar, através de intimidação, o maior número possível de assinaturas para um abaixo-assinado favorável à construção das usinas hidrelétricas Jirau e Santo Antônio, no rio Madeira.

Quem denuncia o clima de coação e o uso da máquina pública para atingir as metas de "adesões" é o Fórum Independente Popular do Madeira (FIPM), entidade que reúne organizações como o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), associações ribeirinhas e a Comissão Brasileira Justiça e Paz.

Na quarta-feira (dia13), estas e outras entidades divulgaram carta na qual explicam sua oposição à construção das usinas e critica "o uso da máquina pública para fins particulares pelo Governo do Estado, pela Prefeitura Municipal, bem como pelos legislativos municipal, estadual e federal".

Computador, TV de tela plana...

Luís Massimo, inspetor de educação da Escola Coronel Carlos Aloísio Weber, na capital, atesta que o governador do Estado, Ivo Cassol (PPS), e o prefeito de Porto Velho, Roberto Sobrinho (PT), "estão usando a máquina pública para forçar os funcionários a votarem a favor das hidrelétricas". Segundo Massimo, os professores levam para as escolas o abaixo-assinado e dão para os alunos assinarem. Além disso, estudantes também estão sendo recrutados para a coleta, recebendo brindes em troca: "o aluno que levar mais assinaturas ganha um computador, o segundo ganha uma TV de tela plana".

Massimo revela que Cassol viajou o Estado inteiro e convocou reuniões com todos os diretores de escolas estaduais, entregando a cada um 50 folhas com espaço para 25 assinaturas cada. Os diretores, por sua vez, pressionados a alcançarem as metas, envolvem professores e alunos. O inspetor conta que não aceitou participar da coleta e levou o caso ao Ministério Público Estadual.

Capacitação

Segundo o FIPM, o prefeito de Porto Velho foi o primeiro a anunciar uma meta de assinaturas: 50 mil. Em seguida, foi a vez do governador do Estado prometer 200 mil. Para tal, determinou que suas secretarias fizessem o esforço que fosse necessário. Pontos de atendimento ao público dos órgãos estaduais foram orientados nesse sentido e os funcionários públicos, além de obrigados a assinar, também foram instruídos a fazer assinaturas. Segundo a denúncia do Fórum, Ivo Cassol escalou as secretarias da Casa Civil e de Finanças para centralizar o processo.

Mas, como se não bastasse o peso dos governos estadual e municipal, o governo federal participa ativamente das pressões pelo início das obras das hidrelétricas. Mesmo sem o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) ter concedido a licença prévia ambiental para o projeto, mais de 3 mil trabalhadores de Porto Velho começaram, no final de abril, a receber capacitação para atividades relacionadas à construção das usinas, como armador e operador de máquinas pesadas. Trata-se do Plano Setorial de Qualificação (Planseq) Hidrelétrica, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Estão sendo oferecidos também cursos nas áreas de comércio, agricultura familiar e empreendedorismo já que, segundo o órgão, com a obra de infra-estrutura podem ser criados novos negócios na região. Os cursos contarão com investimentos de R$ 1,3 milhão, recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). São parceiros no Planseq Hidrelétrica a Prefeitura de Porto Velho, o governo de Rondônia, a Federação do Comércio (Fecomércio-RO), a Central Única dos Trabalhadores de Rondônia (CUT-RO) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), que ministra as aulas.

Para o FIPM, "como as usinas sequer alcançaram a Licença Prévia, a antecipação desse processo de qualificação direcionado constitui uma forma de pressão indevida sobre o processo de licenciamento no interior do próprio governo". Como demonstração disso, destaca-se a declaração do ministro do Trabalho, Carlos Lupi: "A qualificação do trabalhador não tem nada a ver com a licença. Tem a ver com uma necessidade futura. Se não tiver a licença, aquele trabalhador pode ficar qualificado e não ter emprego, isso é muito ruim. Mas eu espero que tudo acabe se organizando".

Campanha aberta

O Fórum denuncia ainda que a assinatura do abaixo-assinado pró-usinas faz parte do ato de inscrição dos candidatos a uma vaga nas eventuais obras. A participação em programas como o Fome Zero e o Bolsa Família, do governo federal, e em benefícios às comunidades ribeirinhas executados pela Prefeitura de Porto Velho também são condicionados ao apoio às usinas.

Na esfera privada, a campanha também é grande. De acordo com a FIPM, empresas vinculadas à Federação das Indústrias do Estado de Rondônia (Fiero), Fecomércio-RO, Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada de Rondônia (Sinicon-RO) e Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de Rondônia (Sinduscon-RO) estão coagindo seus funcionários, fornecedores e clientes a registrar o apoio às usinas.

Além disso, a mídia também vem sendo amplamente usada. "Tem uma vinheta em todas as rádios e televisões, quase todas comerciais, que fala, basicamente, que o Brasil precisa da energia de Rondônia, que sem ela viria o apagão. Mostra que as usinas significam progresso, emprego e desenvolvimento para o Brasil e para Rondônia", conta Luis Fernando Novoa Garzón, sociólogo e professor da Universidade Federal de Rondônia (Unir).

 

Fonte: Agência Brasil de Fato

 

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