Correio da Cidadania

Como é conviver com açudes cheios, pós transposição?

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Moradores de cidade reassentada após a construção contam como é conviver com o açude cheio d'água, mas com o regador vazio.

 

Nova Jaguaribara – A Caravana em defesa do rio São Francisco e do Semi-Árido – Contra a transposição127 metros por segundo, o que equivale a 127 mil caixas dágua de mil litros por segundo". visitou a barragem do Castanhão no último dia 26 de agosto. Antes da visita, os membros da Caravana debateram com os moradores de Nova Jaguaribara as incoerências e a falta de políticas públicas para o semi-árido. Océlio Muniz, do reassentamento Acaroba, abriu a discussão dizendo que recebe a Caravana com "tristeza e alegria. Tristeza por conhecer uma realidade de ter muita água, mas de não ter acesso a ela. E alegria por poder participar da Caravana e tentar mudar essa realidade", diz. O coordenador da Caravana, Apolo Heringer, destacou que, quando surgiu o projeto de transposição, parecia uma boa idéia levar água para quem tem sede: o sertanejo; mas, segundo ele, é uma "mentira". E ele continuou: "é um rio com muitos problemas para retirar 127 metros por segundo, o que equivale a 127 mil caixas dágua de mil litros por segundo".

 

Apolo disse ainda que a revitalização precisa de um projeto: "o que o governo tem é uma colcha de retalhos de intervenções. Se querem a revitalização, por que não revitalizam os rios Apodi, Jaguaribe, Piranhas, Açu, Salgado? A transposição não é para beneficiar o povo pobre. Se tivesse uma política pública para o semi-árido, nem surgiria a idéia de transposição".

 

Irmã Bernadete Neves, que há 22 anos acompanha o projeto do Castanhão, disse que "o projeto da transposição pode ser muito bom tecnicamente, mas não contempla o aspecto social". E completou: "nossos três projetos de irrigação deveriam ter iniciado em 1999, mas hoje só tem um funcionando". E questionou: "qual é mesmo a verdade deste projeto? Como fica o Castanhão?".

 

"Na época da seca somos nós que passamos fome. Não há uma política clara para o semi-árido. A água da transposição é para atender a siderurgia. Se todos têm motivos para ser contra, nós, dos movimentos sociais do Ceará, temos motivos em dobro", declarou Maria de Jesus, moradora de Jaguaribara e integrante do Movimento dos Sem Terra do Ceará.

 

O estudante de geografia e dirigente estadual do Movimento dos Atingidos por Barragens (Mab), Iury Charles Paulino, disse que a comunidade já tem o exemplo de como será a transposição, já que existem assentamentos há cerca de quatro quilômetros do Castanhão que não tem água para produzir alimentos. "A barragem não trouxe desenvolvimento do município", afirmou o estudante.

 

"Estamos ao lado do Canal da Integração e estamos numa sequidão danada", conta Daniel Linhares, presidente da Associação Geral do assentamento Mandacaru. Ele ainda fez um apelo à Caravana: "pedimos que vocês que têm acesso em Brasília, que digam ao presidente Lula que olhe para Jaguaribara, onde muito foi prometido e nada cumprido. A gente veio para cá por causa das promessas e ficamos desmotivados porque elas não são cumpridas".

 

O presidente do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, Thomaz da Mata Machado, disse que, após visitar o Castanhão, ficou claro que a água da transposição não é para abastecimento humano. Ele afirmou: "queremos fazer uma discussão sobre o semi-árido brasileiro, pois 63% dele estão na bacia do São Francisco".

 

O diretor do Sindicato dos Técnicos de Segurança do Trabalho de Fortaleza, Domingos Fontes, disse que sempre foi a favor da transposição. A respeito do Castanhão, manifestou sua opinião: "se tem água, tem. Se não está usando, não é problema nosso. É problema da gestão do governo. Temos é que acumular água, pois daqui a 10 ou 20 anos pode servir".

 

Soraya Vanini, da Frente Cearense por uma nova cultura das águas, explicou que o problema do Ceará não é a falta d'água, mas sim de distribuição e acesso. "O espírito de nossa frente é de uma gestão da água. Temos que parar de ficar esperando o governo", avaliou.

 

Jaguaribara e Castanhão

 

Uma cidade planejada. Assim é Nova Jaguaribara, localizada no Ceará. O planejamento do município, com a disposição das ruas ladrilhadas e casas iguais, não é sinal de uma preocupação com o ambiente, engenharia ou arquitetura, como pode parecer. Nova Jaguaribara é "nova" porque precisou ser reconstruída para abrigar os moradores da "velha" cidade, que tiveram que sair de suas propriedades para dar espaço para as águas do Castanhão.

 

A nova cidade "nasceu" com infra-estrutura para que seus reassentados pudessem continuar suas vidas. Entretanto, os moradores reclamam que foram iludidos com promessas que, infelizmente, não foram cumpridas. Promessas de água para irrigação, empregos e geração de renda para a região. Mas nada disso foi cumprido.

 

O Açude Castanhão é o maior açude do Nordeste e pode armazenar até 6,7 bilhões de m3 de água.


Fonte: Assessoria da Caravana de Nova Jaguaribara.

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