Correio da Cidadania

Plebiscito sobre a privatização da Vale do Rio Doce

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Consulta começa em 1º de setembro e questiona venda da empresa; juristas apontam irregularidades no processo de leilão.

 

Mais de 60 entidades da sociedade civil, pastorais da igreja, juristas e movimentos sociais promovem um plebiscito popular sobre a anulação do leilão de privatização da Vale do Rio Doce, realizada em maio de 1997, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, com base na avaliação de ações de contestação ainda em julgamento na Justiça brasileira.

A consulta popular, que acontece entre 1° e 9 de setembro, reúne um amplo leque de organizações populares, como MST (Movimento Sem Terra), CUT (Central Única dos Trabalhadores), Conlutas, UNE (União Nacional dos Estudantes), Assembléia Popular e Marcha Mundial das Mulheres, entre outros.

Em dezembro de 2005, o plenário do Tribunal Regional da Justiça Federal, em Brasília, definiu que as 60 ações em tramitação que contestam a venda devem ser julgados. A Vale questionou a decisão em reclamação ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), onde o processo está atualmente em julgamento. A possibilidade legal de declaração de nulidade do leilão abre uma porta aos movimentos que propõem a consulta.

 

"O plebiscito promove o exercício legítimo e legal de decisão sobre temas importantes, como o uso e destino de nossas reservas minerais, e pode ser um indicativo para que os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário respeitem também a vontade do povo", afirma João Paulo Rodrigues, integrante da coordenação nacional do MST.

À época da privatização, a Vale do Rio Doce tinha um patrimônio avaliado pelo seu comitê financeiro de US$ 40 bilhões. Entretanto, a venda das ações do governo para as mãos do capital privado ficou em R$ 3,3 bilhões de reais. Atualmente, a companhia é avaliada em R$ 100 bilhões. No primeiro semestre deste ano, o lucro líquido da empresa ficou em R$ 10,937 bilhões.

“A venda da Vale do Rio Doce foi uma grande ilegalidade e um verdadeiro atentado ao patrimônio nacional. Um ato desses não pode ficar impune, sem conseqüências. É preciso que o povo tome consciência disso e deixe de ser marginalizado, como sempre foi na história do Brasil, e pressione a Justiça para julgar as ações populares contra a privatização”, explica o jurista e professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Fábio Konder Comparato.

O advogada Eloá Cruz, que acompanha o caso, ingressou com uma das ações contra a venda da empresa. “O Bradesco, um dos responsáveis pela avaliação da empresa, transformou-se em um dos acionistas, o que é proibido”, alega.


O membro da comissão Episcopal para o Serviço da Caridade, da Justiça e da Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o bispo de Jales D. Demétrio Valentini, chama a atenção para apropriação privada de recursos naturais. “A Vale hoje transfere como lucro para alguns o que é patrimônio de todos”, diz ele.


Para Comparato, a questão vai além do próprio processo de privatização e tem relação com a natureza do poder no país. “O Estado brasileiro não era dono da Vale do Rio Doce, que é um patrimônio que pertence ao povo brasileiro. O Estado era mero gestor e nenhum mandatário poderia vender um bem que pertence ao proprietário sem o consentimento dele”, defende Comparato.

Sem motivos

As justificativas para a privatização da Vale na época eram a hipotética incapacidade do Estado em gerir a empresa e a necessidade de gerar caixa para pagar a dívida. “Vendemos empresas, perdemos um patrimônio e a dívida aumentou. Hoje a dívida interna ultrapassa R$ 1 trilhão e a dívida externa é de mais de 200 milhões de dólares”, aponta a auditora fiscal da Receita Federal, Maria Lucia Fatorelli, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Unafisco Nacional).

Fundada em 1942 durante o governo de Getúlio Vargas, a Vale do Rio Doce sempre foi uma empresa lucrativa e contribuiu para o crescimento nacional. “Como o Estado não tinha condições de gerir, se sob a direção do Estado se tornou a maior exportadora de minério de ferro do mundo?”, questiona Comparato. Um exemplo da capacidade de administração do Estado é a Petrobras, atualmente a maior empresa da América Latina.

Procedimentos

A votação ocorrerá em todos os estados do país mediante apresentação de documento de identidade, e o resultado final será divulgado no dia 25 de setembro, quando os movimentos deverão entregar uma cópia do registro do processo e da apuração aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

A iniciativa do plebiscito popular já foi usada para promover o debate sobre outros temas, como a implementação da Área de Livre Comércio para as Américas (Alca). Nessa consulta, realizada em 2002, participaram 10 milhões de votantes, com o envolvimento de 140 mil militantes na organização.

 

Segundo pesquisa nacional realizada em junho pelo Instituto GPP, a pedido do DEM (ex-PFL), 50,3% da população se colocou a favor da retomada da Vale pelo Estado brasileiro, enquanto 28,2% foram contrários e 21,5% não souberam responder.


Neste ano, o plebiscito popular e informal pergunta se a Vale deve continuar nas mãos do capital privado. O plebiscito também consultará a população sobre a dívida pública, a gestão da energia elétrica e a reforma da previdência.

A Campanha "A Vale é nossa" produziu um documentário sobre o processo de privatização da Companhia Vale do Rio Doce, que está dividido em três partes e disponível na internet nos seguintes endereços:


http://br.youtube.com/watch?v=LM6oph1muCI/
http://br.youtube.com/watch?v=qBEK1Wup0dw/

http://br.youtube.com/watch?v=GfwlYZeVjF4/

 

Fonte: MST.
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