Venezuela na mídia: dois pesos, duas medidas, um lado
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- Rodrigo Mendes – Da Redação Colaboraram Valéria Nader e Gabriel Brito
- 11/11/2009
O editorial da Folha de S. Paulo do dia 30 de outubro é dessas peças com rara preciosidade, pois sintetiza tudo que a mídia grande conseguiu produzir como senso comum a respeito dos países que têm governos progressistas na América Latina, em especial da Venezuela. O texto, intitulado "Convite ao tumulto", critica o fato de o Congresso brasileiro ter aprovado a entrada da Venezuela no Mercosul sem nenhum tipo de ressalva.
O editorial apresenta uma argumentação absolutamente frágil para essa aprovação: "pressões do Executivo e lobbies empresariais interessados em manter uma política de ‘boa vizinhança’". A conclusão que se tira ao se ler o texto é que o grande problema da Venezuela é Hugo Chávez. O editorial é claro ao afirmar "será Chávez, e não uma Venezuela abstrata, quem irá dispor de poder de veto sobra as decisões do Mercosul".
Nota-se que o editorial não é, em si, contrário à entrada da Venezuela no Mercosul. Aliás, a posição do jornal sobre isso só ficará mais clara duas páginas depois (ler mais adiante) – em mais uma matéria, como é o costume da Folha, em que o assunto é sua própria opinião e não um fato em si. Ou seja, o editorial apenas problematiza a questão da Venezuela e o que pode acontecer com o país sendo membro efetivo do bloco.
O destaque na manchete da Folha do mesmo dia, duas páginas depois do editorial, era a ausência de qualquer ressalva à entrada da Venezuela. Essa frase específica demonstra onde estava, para a Folha, a ênfase do debate. Segundo a lógica expressa ali, é claro que é preciso aprovar a entrada da Venezuela no Mercosul por conta do vultoso poderio econômico que seu petróleo traz ao bloco. Ainda mais em tempos de pré-sal.
Isso é o detalhe; o ponto central que a Folha quer focar são as ressalvas. Por conta de seu regime, por conta dos supostos atentados contra a democracia (aqui, ainda um ponto polêmico), enfim, por conta de Chávez ser um governo identificado como "de esquerda" – e afinal, nada pode ser mais ultrapassado que ser de esquerda.
A última edição da revista Veja também trouxe um texto sobre o assunto, novamente, como é seu costume, com críticas raivosas e babentas a Chávez. Isso chegou a ser tema de debate na redação do Correio da Cidadania, e decidimos não tratar da Veja nesse artigo, pois a idéia é debater jornalismo. Infelizmente, a Veja não se enquadra mais na categoria jornalismo.
Vizinha ao editorial de 30 de outubro, a coluna de Eliane Catanhêde – contumaz e conhecida crítica de Chávez - faz uma branda crítica à oposição demo-tucana ao governo federal por conta de sua polarização contrária à entrada da Venezuela no Mercosul. A articulista elenca uma série de argumentos favoráveis à entrada do país governado por Hugo Chávez que, segundo ela, são muito mais fortes do que o eventual ônus político que o presidente venezuelano traria ao bloco.
Chama atenção expressão usada por Catanhêde no final do primeiro parágrafo ao dizer que "nem mesmo discurso" tinha a oposição para querer barrar a entrada da Venezuela. Bom, se queria saber de onde se cria o discurso que baseia uma posição contrária à entrada da Venezuela, Eliane Catanhêde deve ter descoberto ao abrir a Folha daquela sexta-feira e ler, depois de olhar satisfeita para sua própria coluna, o texto à esquerda (geograficamente) do dela.
Pois esse editorial provê toda a munição que qualquer um precisa para criar um discurso contra a entrada da Venezuela no Mercosul. O texto afirma ainda que o regime venezuelano tem apenas "fiapos" de democracia, o que contribuiria para a situação supostamente já instável do bloco de integração.
Brilhantemente desmontada por uma de suas mais importantes articulistas, a Folha, ao lado da maioria dos grandes veículos de comunicação, é responsável por criar uma névoa com grande capacidade de ofuscar o que acontece na Venezuela. Não por acaso, esses mesmos veículos são muito importantes não só na construção desses argumentos utilizados pela oposição, mas pela aceitação desses argumentos.
Pois a criação de um senso comum de que a Venezuela tem uma "ditadura" (ainda que o termo seja empregado com extrema cautela e parcimônia, pois, por mais problemático que seja, o governo chavista, sob muito poucos critérios, pode ser considerado uma ditadura) e representa um retrocesso na democracia latino-americana, entre uma série de outros "problemas" de ordem interna e externa, é, em grande parte, oriunda muito mais da contra-propaganda jornalística do que de qualquer experiência real que o povo brasileiro tenha sofrido por causa do regime venezuelano.
Continua certa Eliane Catanhêde ao informar que a discussão em torno ao tema não é de ordem político-ideológica, mas muitos mais de ordem comercial. Ainda mais porque essa foi a motivação do governo brasileiro ao aprovar o tema, apontada no relatório final aprovado no Congresso. Em nenhum momento a base governista responsável por bancar a posição declarou qualquer simpatia ao governo venezuelano – nenhum crime aí. Apenas apontou a importância econômica que a Venezuela trará ao Mercosul.
Chávez sempre esteve em maus lençóis quando sob o foco da mídia brasileira – e costuma estar sob o foco, pois a cada passo seu é acusado de ser antidemocrático. Mas uma breve comparação feita na redação do Correio instala uma reflexão: quando esteve Álvaro Uribe, presidente colombiano que sempre fez tudo aquilo que Chávez é acusado de ameaçar fazer, sob os holofotes da mídia? Será Uribe, principal aliado declarado dos Estados Unidos na América do Sul, parceiro militar do exército estadunidense, alvo de julgamento tão criterioso dos senadores da República em uma eventual situação parecida?
A resposta virá quando, e se, a Colômbia pedir formalmente ingresso no Mercosul. Mas Uribe já tem larga vantagem. Ainda que, economicamente, seu país tenha uma significância muito menor que a Venezuela, seu presidente nunca foi acusado pela mídia brasileira de ser golpista nem antidemocrático. Na verdade, Uribe não é um fator de instabilidade sob o ponto de vista das elites e, consequentemente, da mídia grande.
Rodrigo Mendes é jornalista; Valéria Nader, economista, é editora do Correio da Cidadania; Gabriel Brito é jornalista.
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Comentários
Aliás, justiça seja feita, outro Lullista, além do próprio Collor, era o Luiz Nassif que tinha como bordão a frase "Collor mudou posittivamnente a agenda política e econômica do Brasil".
Mas, a própria Direita venezuelana DESAUTORIZOU recentemente que a Direita Brasileira iompeddise a entrada da Venezuela no Mercosul.
Que humilhação passaram os comandantes da barreira! Deram Nó em Pingo d'água, para justificar a mudança de voto no Senado.
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