Governo faz manobra para isolar 
José Rainha e dividir o movimento sem-terra
 
Apesar da boa colocação de Fernando Henrique Cardoso nas pesquisas de intenção de voto, a equipe que coordena a campanha do presidente-candidato continua firme na intenção de não abrir espaços para o crescimento da oposição. Alguns dos expedientes que vêm sendo utilizados para barrar o crescimento de Lula, em especial, lembram muito a campanha de 1989, quando a equipe de Fernando Collor apresentou o depoimento de Míriam Cordeiro, ex-namorada do petista, no horário eleitoral gratuito no rádio e na televisão.
Desta vez, no entanto, os ataques não são tão diretos. A tática é “vazar” notícias sem qualquer fundamento para a grande imprensa e o alvo nem sempre é o candidato petista, mas muitas vezes os seus aliados. Há duas semanas, por exemplo, a revista Isto É publicou uma extensa matéria acusando o líder sem-terra José Rainha de “jogo duplo”. De acordo com a reportagem, Rainha seria um traidor do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), um espião a serviço de FHC dentro do movimento. Mais ainda: o governo teria concedido um crédito de R$ 15,5 milhões à Cocamp, cooperativa de Rainha, e estaria fazendo “vista grossa” para as irregularidades cometidas pelo líder sem-terra no seu gerenciamento.
A reportagem da Isto É, na verdade, foi apenas a “versão final e acabada” de uma série de notas que apareceram nas colunas dos principais jornais do país e que davam conta de um encontro, no dia 18 de agosto, em pleno Pontal do Paranapanema, entre o presidente e José  Rainha.
O encontro naturalmente não aconteceu e a revista resolveu contar a “história secreta” das negociações entre o governo e o líder sem-terra. Recheada de afirmações de figuras do alto escalão do governo —o presidente do Incra, Milton Seligmann, por exemplo, diz conversar “todo dia” com Rainha—, a reportagem não ouviu as principais  lideranças do movimento sem-terra, muito menos o principal envolvido na intriga, José Rainha Jr. 

A versão de Rainha
Principal envolvido na mirabolante história da revista, o líder sem-terra José Rainha Jr. nega as acusações de traição ao MST. Rainha acusa o governo federal de montar uma "armação” para dividir o movimento e desmoralizar seus líderes. “A reportagem é uma grande sacanagem. Isto é coisa plantada pelo Palácio do Planalto. A revista nem me procurou para saber o que eu tinha a dizer sobre isso tudo”, explica Rainha.  
Do Pontal do Paranapanema, onde participava de uma ocupação de terra do MST, Rainha contou à reportagem do Correio, por telefone, que a revista já está sendo processada pelo advogado e deputado federal Luiz Eduardo Greenhalgh. “Quero direito de resposta e vou exigir a reparação dos danos morais  na Justiça.”  
Para Rainha, a intenção do governo é “acabar de uma vez com o MST” e a reportagem, uma das formas de obter resultados. “A burguesia acha que deve acabar com todos os movimentos populares. Mas desta vez eles não vão ter o mesmo sucesso. O MST existe em função de sua coerência, de sua luta e prática. O movimento está unido e não vai se abalar”, diz o sem-terra. 

“Calúnia pura”
Para Gilmar Mauro, coordenador do MST em São Paulo, a reportagem da Isto É sequer merece uma resposta oficial da direção do movimento. “É calúnia pura, mais uma tentativa da dividir internamente o movimento. Não vamos responder para não criar polêmica, que é justamente o que eles querem.”
Gilmar explicou ao Correio que os empréstimos concedidos à Cocamp ocorreram em função de procedimentos normais, como a apresentação de um projeto específico, tudo de acordo com a legislação vigente. “Se há irregularidades”, diz o sem-terra, “é o governo quem tem de provar. No fundo, a culpa de qualquer tipo de irregularidade é do próprio governo, que não fiscaliza nada direito.” 
Outra intriga lançada pela imprensa, segundo o dirigente do MST, é o rompimento de Rainha e da secção paulista do movimento com a coordenação da campanha de Lula. “É claro que o MST de São Paulo apóia Lula. O assentamento Che Guevara está cheio de material da campanha. O que nós fizemos foi uma crítica política à postura da coordenação da campanha, que julgou inoportuna a visita do candidato ao Pontal”, explica Mauro. O fato dos paulistas não estarem participando da Marcha pelo Brasil também não é sinal de divisão no movimento. “Nós só não fizemos marchas porque avaliamos que não teríamos condições materiais para isto. Desta vez, a metodologia em São Paulo foi outra. Usamos as brigadas pedagógicas e deixamos a marcha para o final: dia 5 sai uma coluna de Guarulhos rumo ao Ipiranga, em São Paulo, onde faremos um grande ato.”

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