"A
Marcha Pelo Brasil e Contra FHC quer discutir uma alternativa ao modelo neoliberal,
esgotado e fracassado." Para João Pedro Stédile e César Benjamin, esta é a
explicação dos objetivos do movimento iniciado há duas semanas. Em entrevista exclusiva
concedida ao Correio pouco antes dos dois se dirigirem para Matias Barbosa, onde se
integraram à Marcha, Stédile e Benjamin fizeram uma análise do movimento que lideram.
"O nível de mobilização é surpreendente e em certos casos
comovente. O Brasil está aberto à discussão de uma alternativa ao modelo econômico de
FHC e ao neoliberalismo. O principal objetivo da marcha é dar um exemplo na direção do
debate dessa alternativa", afirmou Benjamim.
Para Stédile, o governo Fernando Henrique está se portando como um time
que está empatando o jogo em zero a zero e, aos cinco minutos do segundo tempo, torce
desesperadamente para o jogo acabar, com medo de perder. "O governo FHC é isso.
Acabou", avalia o sem-terra.
Sobre a luta pela terra, nos termos colocados pelo professor Gilberto
Felisberto Vasconcelos, em entrevista publicada na semana passada neste Correio, Stédile
concordou com a afirmação do sociólogo segundo a qual "os americanos querem a
terra para se apoderarem da energia do próximo século e o MST é o seu principal
adversário: quer a terra para produzir e promover justiça no campo e perspectivas de um
projeto autônomo para o Brasil e os brasileiros".
César Benjamim foi além. Para ele, "o governo cassou a palavra da
oposição através do marketing agressivo e de uma certa acomodação dos partidos
populares. A Consulta Popular, entidade que promove e coordena a Marcha, decidiu buscar
discutir com a população um projeto alternativo", explicou.
Stédile acredita ainda que as elites estão tentando ocupar espaços,
para impedir a derrocada de seus interesses, concentrados no atual modelo econômico, e
têm algumas alternativas, ambas perigosas: Antônio Carlos Magalhães, que, segundo o
sem-terra, "depende de fatores a serem examinados no momento dos fatos políticos,
pois sofre de debilidade eleitoral no conjunto do país", e Ciro Gomes, "um
projeto disfarçado no campo dos interesses dos donos do poder".
O líder sem-terra também comentou a preocupação da imprensa com o
número de manifestantes que chegarão a Brasília no final da Marcha. "Nós não
estamos preocupados se vamos ter mil, dez mil, cem mil em Brasília. Essa dança de
números é coisa da mídia e tem dedo do governo. Se não conseguirmos cem mil, vão
dizer que fracassou. Não é assim: por onde estamos passando, estamos discutindo a
alternativa política, econômica e social ao que está aí e isso vai representar não
cem mil, mas milhões de brasileiros. É lógico que não vão dizer isso. Não têm
interesse. Gostam de tapar o sol com a peneira".
Segundo Stédile, não há por que comparar a Marcha deste ano com a
realizada em 1997 pelo MST, que culminou na maior manifestação contra o governo FHC já
realizada. "Essa não é a Marcha do MST, mas de todo o movimento popular organizado.
É diferente. Tem objetivos mais amplos, é um passo à frente".
Saiba o que é a Marcha Pelo Brasil
e Contra FHC
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A Marcha Pelo Brasil e Contra FHC, que vai passar por 120 cidades de 15
estados brasileiros, tem por objetivo conscientizar a sociedade sobre o desmonte que a
gestão Fernando Henrique Cardoso vem fazendo no país e reforçar a luta contra as
privatizações da Telebrás, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal.
A Marcha deve chegar a Brasília em 7 de outubro e no momento está
composta por mil caminhantes, oriundos de todos os estados da federação e pertencentes a
diversas organizações sociais. As mulheres somam aproximadamente 20% dos caminhantes e a
maioria dos participantes são jovens.
A Marcha pelo Brasil possui diferenças significativas em relação à
Marcha a Brasília organizada pelo MST em 1997. Segundo os coordenadores, esta Marcha é
uma experiência inovadora para todos os movimentos que dela participam e deverá
contribuir para as articulações futuras. A organização da Marcha dividiu os
caminhantes em brigadas de 20 pessoas, cada uma com um coordenador e um secretário, que
têm a tarefa de registrar tudo que julgarem interessante e curioso na viagem. Os demais
integrantes da brigada estão divididos por tarefas, que incluem cozinha, limpeza,
panfletagem e formação. A Marcha possui duas coordenações: uma política, formada por
representantes das organizações e movimentos que participam da atividade, e uma geral,
composta pelos coordenadores das brigadas.
Segundo os coordenadores, os principais problemas que devem ser
enfrentados dizem respeito à alimentação. Eles esperam ter o apoio das comunidades,
embora se tenha um estoque de garantia, principalmente para o primeiro mês. A
coordenação conclama a todos para que intensifiquem as campanhas nos estados para o
recolhimento de contribuições da solidariedade.
A conta da Marcha é: Bradesco, C/C 2601-8, agência 2716-2.
(Ana Júlia de Grammont)
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