Polícia do Paraná diz que
grampo no MST foi ilegal
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Por
Jair Borin
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Os
trechos de uma conversação telefônica entre dois membros do MST, gravados com
autorização da juíza Elizabeth Khater, são ilegais, na avaliação da polícia civil
do Paraná. Essas gravações foram usadas pelo secretário de segurança do Estado,
Cândido Martins de Oliveira, em entrevista ao Jornal Nacional da TV globo, com a
finalidade de difamar a imagem do MST junto à opinião pública. A gravação foi feita
no telefone da Cooperativa COANA, que comercializa a produção dos assentamentos do MST,
em Querência do Norte, no noroeste do Paraná. Na conversa gravada, um dos sem-terra diz
ao outro que iria cortar a cabeça da Juíza Elizabeth Khater com uma foice. Tratava-se
evidentemente de uma explosão verbal inconseqüente, tanto que até hoje não se
instaurou inquérito algum para apurar o fato. Mas a mídia deu enorme destaque à
entrevista do Secretário, a fim de "demonizar" o MST e desviar a atenção do
acampamento que os sem-terra haviam feito no mesmo dia em frente ao Palácio do Iguaçu, a
fim de protestar contra os despejos ilegais realizados em Querência do Norte.
No dia 7 de julho último, o Corregedor Geral da Polícia Civil do
Paraná, Annibal Bassan Jr., solicitou parecer de três corregedores acerca da legalidade
do "grampo" colocado no telefone da Cooperativa. As conclusões dos corregedores
foram demolidoras, como se pode ver no box desta matéria.
O documento foi aprovado pelos 16 delegados que compõem o Conselho da
Polícia Civil do Paraná, para ser encaminhado ao Conselho Superior da Polícia, órgão
máximo do sistema de segurança do Estado, integrado por cinco membros e presidido pelo
Secretário da Segurança. Uma cópia, contudo, foi encaminhada extra-oficialmente ao
Secretário Cândido Martins, antes da reunião. Este determinou ao Delegado Geral, Newton
Tadeu Rocha, que recolhesse o documento. Temia-se que os fatos ali descritos pudessem
determinar a demissão do Secretário. Todas as cópias foram então recolhidas -
"por razões técnicas"-, provocando com isso um grande mal-estar na cúpula do
Polícia Civil. A crise estourou no dia 16 passado, quando o Corregedor Geral da Polícia
Civil, Delegado Annibal Bassan Jr., pediu demissão do cargo e entregou aos conselheiros o
documento recolhido e uma carta, que o Correio está reproduzindo em retranca nesta
matéria. Doze delegados da Corregedoria e da Escola de Polícia solidarizaram-se com o
Corregedor demissionário. O delegado juntou ainda cópia do ofício de 24 de março, em
que o Comandante da Polícia Militar solicita do Secretário Candido Martins ordem para
pedir autorização judicial para "grampear" o telefone da Cooperativa. Esse
pedido fere frontalmente o artigo 3 da lei 9.296, pois, de acordo com esse preceito,
somente o Delegado de Polícia ou o Promotor de Justiça são autoridades competentes para
solicitar interceptação de comunicações telefônicas. No entanto, no mesmo dia, o
Secretário autorizou o pedido.
Coletiva tumultuada
Uma xerox do documento dos corregedores foi parar nas mãos da CPT
(Comissão Pastoral da Terra). Na última quarta-feira, o advogado da Comissão, Darcy
Frigo, acompanhado por membros de várias entidades da sociedade civil e pela bancada
estadual do PT, exibiu essa cópia do documento dos corregedores, em tumultuada entrevista
coletiva, realizada na Assembléia Legislativa do Estado. O tumulto foi causado por um
cinegrafista sem credencial e que não soube identificar o veículo para o qual
trabalhava. Interpelado pelo deputado Irineu Colombo, ele se retirou correndo e entrou no
Palácio Iguaçu, sede do Executivo paranaense.
No dia 19, os advogados Darcy Frigo e Avanilson Alves Araujo entraram com
representação junto ao Ministério Público Estadual, solicitando abertura de inquérito
policial contra a juíza Elizabeth Khater, o secretário Cândido Martins e o Comandante
da Polícia Militar do Paraná, major Valdir Neves, pela prática do crime definido no
art. 10 da Lei 9.296, que diz: "Constitui crime realizar interceptação de
comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da
Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei". O
crime é punido com penas de reclusão que variam de dois a quatro anos, sem prejuízo. A
representação foi assinada também por Dom Ladislau Biernaski, arcebispo auxiliar de
Curitiba, e por outros representantes de entidades da sociedade civil.
Corregedor nega "erro técnico"
No âmbito interno da polícia do Paraná, foi
confirmado, pela reportagem do Correio, que o secretário de segurança Cândido Martins
interveio na circulação do documento com temor de ser demitido, alegando erro técnico.
Este erro, entretanto, não havia no documento, afirmou o delegado Annibal Bassan. O
delegado afirma que, no caso do "grampo", houve invasão de competência da PM
sobre a Polícia Civil, uma vez que tanto o sargento solicitante como o major não
poderiam fazê-lo. A lei que rege a matéria é clara, diz o delegado. Esta invasão só
foi possível com o beneplácito da juíza Elizabeth Khater. As atitudes tanto dos membros
da PM quanto da juíza, neste caso, configuram clara intervenção sobre área de
competência que só pode ser exercida pela polícia civil.
Indagado das razões da sua demissão, o delegado Bassan declarou que o
motivo específico de sua atitude foi a revogação, pelo secretário Cândido Martins, do
provimento n. 7/99, que determinava normas para o comportamento da Polícia Civil. Não
concordando com essa ordem, uma vez que não estava fazendo outra coisa senão determinar
o cumprimento da lei, o delegado Bassan decidiu pedir demissão do cargo. |
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