Um registro para a história
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A cidadania precisa tomar nota do que está acontecendo com o MST. É um registro necessário para documentar o comportamento do governo e da mídia em relação a um movimento social reconhecido interna e internacionalmente como importante instrumento de justiça social e de democratização do país.

O registro é este: a elite dominante não quer a reforma agrária porque ela implica necessariamente uma reestruturação de toda a sociedade brasileira e isto abala seus privilégios. Conseqüentemente, o governo FHC, que está a serviço dessa elite, também não quer a reforma agrária. E os veículos de comunicação, monopolizados por grandes grupos econômicos, fazem coro com o governo.

Contudo, nem o governo nem a mídia podem dizer publicamente que são contra a reforma agrária, porque se trata de uma determinação constitucional e porque o povo tem se manifestado consistentemente favorável a ela. Por isso, o governo, hipocritamente, proclama-se defensor da reforma e gasta rios de dinheiro em propaganda para convencer o povo de que a está executando. Mas, na verdade, aplica na sua execução menos recursos do que destina à propaganda que alardeia suas ações e, por baixo do pano, procura por todos os meios asfixiar o movimento social que está impulsionando a reforma.

A tática usada é a do ataque "em pinça". De um lado, monta-se uma campanha de propaganda para passar subliminarmente à opinião pública a imagem de que o MST é apenas o biombo de um grupo subversivo que usa a bandeira da reforma agrária para promover uma revolução armada no país. De outro, monta-se outra campanha para destruir a imagem de seriedade que o movimento construiu nestes vinte anos, fazendo a opinião pública acreditar que ele se financia de modo irregular.

Da primeira tarefa encarregou-se a revista Veja, em matéria que revoltou todos quantos desejam viver em uma sociedade sem patrulhamentos ideológicos. Da segunda, a maioria dos órgãos de imprensa. O jornal Folha de S. Paulo, por exemplo, dedicou, só na última semana, 26 matérias e 12.000 centímetros quadrados de suas páginas para incutir nos leitores a palavra chave: "desvio de verbas". O efeito procurado, também subliminar, é enredar o MST no mar de lama que assola o país e especialmente o governo.

É difícil prever o desfecho desta ofensiva. Todas as anteriores terminaram em fracasso. Esta, contudo, está sendo desfechada com uma violência inusitada. O recado da classe dominante é inequívoco: na democracia neoliberal não há lugar para qualquer movimento popular autêntico, independente, capaz de atuar por si próprio e de pressionar por seus direitos. Tudo tem de ser dado de cima para baixo.

Os próximos dias dirão se essa posição poderá sustentar-se. De qualquer modo fica o registro: governo e mídia estão asfixiando um movimento popular autêntico. Como a História não pára, esse registro pode ser importante para fixar responsabilidades quando a presente conjuntura evoluir.


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