A serpente e o MST

Por Luiz Antonio Magalhães

Na semana passada, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) voltou para as primeiras páginas dos grandes jornais do país. A ocupação da fazenda do poderoso embaixador Paulo de Tarso Flecha de Lima, que atualmente serve em Roma, e um suposto "rompimento" de relações entre o Movimento e a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) foram os fatos que levaram os sem-terra para as manchetes.

Na Folha de S. Paulo, edição de terça-feira, a maior foto da primeira página, publicada acima da dobra, dizia respeito aos sem-terra. Alguns integrantes do movimento – a maior parte vestindo a tradicional camisa vermelha com a estampa do MST – apareciam segurando uma enorme cobra. A legenda explicava que se tratavam de trabalhadores que ocuparam a fazenda do embaixador.

Nem precisava de legenda. A intenção do jornal ao publicar a foto era bem outra. Tal e qual fez a revista Veja há algum tempo, quando publicou uma capa com o líder sem-terra João Pedro Stédile com o semblante fechado em um fundo todo vermelho, a Folha quis "demonizar" o MST. A cor vermelha, a serpente e o olhar dos trabalhadores não deixam dúvidas: a foto foi escolhida a dedo. Pode não ter sido pautada, mas não foi parar na primeira página do jornal à toa.

No caso do "rompimento" da CNBB com o MST, trata-se da forma clássica de intriga política. Desta vez, porém, a coisa foi tão mal feita que a intriga durou menos de 24 horas, tempo necessário para que os religiosos reafirmassem que continuam apoiando os sem-terra.

A superação da Veja

Toda semana tenho um certo temor de ficar sem assunto para a coluna do Correio. Afinal, o objeto destas Entrelinhas é a análise da mídia. Mas e se a imprensa não chutar nenhuma bola fora em uma determinada semana? Ficamos sem artigo?

Quando esse tipo de angústia aparece, procuro lembrar que existe uma publicação chamada Veja. Não tem erro, ela está sempre lá, cometendo absurdos. É até covardia criticá-la.

O que me espanta é que, semana a semana, a revista da editora Abril consegue superar-se nas bobagens que publica. Confesso que quando vi as capas da Veja e da Vejinha SP da semana passada – repito, apenas vi as capas, sem nem sequer folhear para saber o que tinha dentro – fiquei contente: tenho assunto para o Correio, se nada pior acontecer.

Na Veja, o destaque da capa é para a turma dos que suaram muito e conseguiram ganhar - por meio do trabalho - mais de 1 milhão de reais no Brasil. Sim, a revista descobriu que essa gente existe e resolveu fazer alguns "personagens", como se diz no jargão do jornalismo. Edificante.

E tem mais: o semanário garante que essa turma - que ganha muito apenas trabalhando - só faz crescer. Mas não vou descer ao que a reportagem conta, seria demais para o estômago do leitor.

Na Vejinha, a capa traz um assunto mais ‘light’ – que Aldo Rebelo me perdoe pelo uso do estrangeirismo, mas é uma ironia, ou pretende ser: o perfil dos jovens milionários solteiros (neste caso, valeram os herdeiros).

Como se vê, um belíssimo conjunto de capas. Fico por aqui, pensando na dificuldade do pauteiro da Veja em arrumar, toda semana, coisa menos relevante do que a da semana anterior para a edição seguinte. Uma barra. E também na mediocridade da nossa classe média, que faz desta a revista mais vendida do Brasil...

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