Especial


Um presidente inteligente e amante
da natureza

 

Rodolfo Salm

 

O diretor emérito do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), Warwick Kerr, disse ao Correio, em julho do ano passado (edição 253), que a área de 30 milhões de hectares já desmatada da Amazônia, se bem recuperada, daria para alimentar o mundo, mas que “somente um forte componente na educação dos jovens conseguiria alertar o povo para o caminho certo”. O Professor Kerr comentou a ameaça à nossa soberania nacional que é a apropriação externa da maior das riquezas amazônicas –a informação, na forma de experiência dos índios e ribeirinhos e de material genético para o desenvolvimento de produtos patenteáveis. Discutiu também as estimativas de que, em grande parte, graças às obras de infra-estrutura do programa Avança Brasil, de 50 a 80% da floresta serão destruídos até 2020. Concluiu que, “para que não haja aquela destruição, é preciso que haja 5 seqüências de presidentes inteligentes e amantes da natureza”.

O presidente deve ser um amante da natureza para que compreenda seu valor para o bem-estar humano. Para a preservação da Amazônia, são necessários esforços massivos de integração da pesquisa básica em ecologia com as finalidades da educação ambiental. É urgente a multiplicação de campus avançados de todas as nossas universidades na região, para que brasileiros façam pesquisas, levantamentos e experimentos na floresta. Se, por uma lado, é grande o trânsito de cientistas estrangeiros na Amazônia, por outro, são imensas as dificuldades enfrentadas pelos nossos pesquisadores. Na base de pesquisas do Projeto Pinkaití, por exemplo, os raros brasileiros atuantes são vinculados a universidades estrangeiras, instituições de ensino massificado, onde temas do interesse nacional são desqualificados como “desinteressantes”. Gastam-se fortunas por uma “ciência” dominadora, estranha e alheia à linguagem e aos problemas do povo brasileiro.

Um presidente inteligente é importante, pois medidas urgentes e radicais são necessárias para se conter a destruição da floresta. Devem ser suspensos o corte de árvores da mata virgem e quase toda a derrubada de florestas. É vital a paralisação e revisão de todos os componentes amazônicos do Avança Brasil. Projetos como o das hidrelétricas do Xingú e do gasoduto Urucu-Porto Velho devem ser engavetados e rodovias como a Transamazônica e a Cuiabá-Santarém, interditadas com cancelas que impeçam a entrada de gado e a saída de madeira, permitindo somente o trânsito de moradores e apoio para que tenham saúde e educação. O crescimento das áreas mais populosas deve ser contido e projetos de descolonização formulados, visando ao esvaziamento das áreas mais distantes.

O Lula possui as duas qualidades necessárias para ser o primeiro dos 5 presidentes que evitarão a destruição da floresta. Mas florestas não renascem em um dia e não se faz revolução cultural por decreto. Imagino que seria complicado tomar, assim de pronto, todas medidas listadas para se apagar um “incêndio” que historicamente se fomenta; é preciso um plano para os próximos 20 anos. Mas, em seu primeiro pronunciamento como presidente eleito, Lula foi claro: "Nosso governo será um guardião da Amazônia e da sua biodiversidade. Nosso programa de desenvolvimento, em especial para essa região, será marcado pela responsabilidade ambiental". Fez-se uma opção pela soberania nacional e pela preservação da nossa diversidade cultural e biológica, em oposição à queima alucinada da mata.

 

Rodolfo Salm, doutorando em biologia pela Universidade East Anglia (Inglaterra), pesquisador do Projeto Pinkaiti Aldeia A’Ukre.

 

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