Guerra da Ucrânia: sem o enfraquecimento de Kiev, a continuação de Moscou
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- Virgílio Arraes
- 30/05/2022
Foto: Mapa da região da Crimeia com destaque para a capital ucraniana, Kiev. Ilustração: Peteri / Shutterstock (adaptado) Retirado de Infoescola
Próximo dos cem dias, o conflito da Rússia com a Ucrânia incorpora-se ao cotidiano da política mundial, visto que nenhum dos lados arrefece o ânimo, de modo que um cessar-fogo avizinha-se, infelizmente, distante.
Preocupações humanitárias permanecem no proscênio de falas de dirigentes de organismos regionais e internacionais, porém governantes calculam dia a dia os impactos da confrontação sobre suas economias, em especial no setor de combustíveis e, em breve, no da alimentação.
A partir de então, avaliam eles os efeitos imediatos nas disputas internas – nos Estados Unidos, os democratas, sob a liderança tíbia de Joe Biden assustam-se com o índice ascendente de inflação e como isso irá influenciar o eleitorado no denominado pleito do meio do mandato a cravar o voto nos republicanos, cada vez mais à direita, sob a influência anacrônica de Donald Trump.
No Brasil, a situação é também intranquila porque as incertezas globais somam-se à insensibilidade social de uma administração federal sobremaneira atrasada, por causa, entre outros motivos, do entorpecimento com reminiscências da Guerra Fria, inexistentes na atualidade, como, por exemplo, a disseminação do comunismo na sociedade.
Paralelo a isso, a Rússia movimenta-se com dificuldade em solo externo, com o fito de garantir para si a gestão de duas províncias, Donetsk e Lugansk, sob invocação de defendê-las da agressão contínua da Ucrânia.
Enquanto a Rússia oriunda da dissolução da União Soviética (URSS) esteve dócil ao Ocidente durante a desastrada presidência de Boris Yeltsin, a percepção do alargamento da Organização do Tratado Atlântico Norte (OTAN) não era demandada, posto o encantamento da elite moscovita com Washington e Bruxelas.
Evaporadas as ilusões de um melhoramento social no curto prazo com o neoliberalismo sugerido por representantes públicos e privados euro americanos, haja vista o decréscimo da economia na maioria da década de noventa, houve a ascensão de Vladimir Putin, de grupo pouco afeito à sedução de instituições do oeste do continente, cujo traço marcante tem sido o autoritarismo, abalado pela contração do crescimento nacional nos últimos anos.
Diante desse abalo, incrementado pelas consequências da pandemia do vírus corona, a política exterior tornou-se subterfúgio para deslocar a atenção de sérios problemas internos e abafar, desta forma, a acautelada oposição e, por conseguinte, a latente insatisfação popular.
Por outro lado, uma Ucrânia afinada com a Rússia, como ocorreu entre 2010 e 2014, dispensou o Kremlin de acentuar sua repulsa a um hipotético avanço otaniano a suas fronteiras, embora avisos de quando em quando ocorressem como em 2008, ao classificar a possível adesão de Kiev - e Tbilisi – a Bruxelas de inimizade.
Aos olhos de Moscou, a invasão seria preventiva, a fim de desestimular o ingresso eventual do vizinho nas fileiras da OTAN; portanto, a justificativa oficial de desnazificar o país teria sido o invólucro, cujo conteúdo teria o objetivo real de desmilitarizar ou antes desarmar, de modo que garantisse o enfraquecimento duradouro de Kiev, algo ainda longínquo. Tarde ou nunca, a diplomacia irá predominar nas próximas semanas.
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Virgílio Arraes
Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.