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Violência e Petróleo no Equador

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Equador. Consulta popular diz sim à proteção do Yasuní, ou seja, não à  exploração de petróleo na Amazônia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU
Não é segredo para ninguém que a espiral de violência está dominou todas as atenções. Os assassinatos de vários políticos, incluindo um candidato à presidência, chocaram o país. Também não surpreende que essa dramática situação esteja sendo usada para argumentar que a consulta sobre a exploração de petróleo na Amazônia de Yasuní seria uma questão secundária diante da grave insegurança que se vive (1). As prioridades do país estariam em outro lugar, e não é o momento de debater, ou até mesmo considerar, se vale a pena preservar uma área de floresta amazônica - é o que alguns insistem.

Isso é compreensível em grande medida. Uma recente pesquisa nacional revelou que 27% das respostas indicavam que o principal problema do país era a insegurança e a violência, seguido da corrupção (21%) e outros problemas, enquanto apenas 2% apontaram para o declínio ambiental.

Diante dessa postura, é fundamental reiterar, repetidamente, que é de extrema importância votar pela preservação do petróleo sob o solo para garantir a sobrevivência de seres humanos, plantas e animais que habitam essa região. Além disso, aqueles que colocam o fim da violência nas ruas como sua principal preocupação deveriam reconhecer que essa questão está diretamente ligada ao destino das atividades de extração de petróleo.

Pode não ser fácil para muitos entenderem isso, pois os recentes assassinatos políticos impactaram profundamente, e os slogans insistem que a extração de petróleo amazônico resolveria os problemas do Equador, incluindo a redução da pobreza, o que, por sua vez, acabaria com a violência atual. Os defensores da exploração de petróleo usam essa ideia de que mais petróleo levaria a menos violência.

No entanto, essa cadeia de ideias está profundamente equivocada. Na verdade, insistir na exploração de petróleo em um país acaba se tornando um dos fatores que perpetuam a pobreza e, ao mesmo tempo, a violência.

Viciados

Ao contrário dos slogans e propagandas convencionais, a exploração de petróleo, assim como a mineração, aumenta a primarização das economias nacionais e a dependência das exportações de matérias-primas. Empresários, políticos e acadêmicos costumam justificar essas atividades prometendo que gerarão recursos financeiros para impulsionar o desenvolvimento nacional. Independentemente das diferenças na forma como cada setor é organizado, a dependência das exportações de matérias-primas persiste, e os supostos impulsos ao desenvolvimento nunca se concretizam. As áreas de exploração continuam imersas na pobreza e nos impactos ambientais.

Isso é bem conhecido, pois ao longo dos anos promessas de paraísos têm sido feitas a cada novo ciclo de exploração da natureza, seja com cacau ou banana no passado, ou petróleo e ouro atualmente, mas essas promessas nunca se realizaram.

Os setores de extração de recursos operam de maneira oposta, tornando as economias nacionais mais simples, eliminando a possibilidade de diversificação industrial e tornando-as mais dependentes da importação de bens e até mesmo alimentos. Isso faz com que esses setores precisem de mais e mais extração para permanecerem financeiramente viáveis. Os setores de extração são viciantes.

A evidência está diante dos olhos de todos os equatorianos, pois agora se soma o flagelo da mineração de ouro aluvial. As atividades antigas de extração atraíram essa nova atividade ainda mais intensa, paradoxalmente enraizada na pobreza e altamente violenta. Essa mineração se aproveita daqueles que não encontram oportunidades de emprego ou educação e se expande com o apoio de redes de contrabando, tráfico de insumos, envolvimento em outras práticas ilegais e proteção por meio da corrupção e da violência.

Uma olhada nos vizinhos sul-americanos mostra que os países produtores de petróleo não conseguiram resolver os problemas de violência. O Índice Global da Paz, em sua avaliação de 2022, revela que entre as nações sul-americanas, os piores indicadores estão em Venezuela, Colômbia e Brasil, todos países com forte presença de setores de extração em geral, incluindo petróleo. Em seguida, aparecem outros países produtores de petróleo, como Bolívia, e ao lado deles, o Equador (2).

Portanto, votar pela continuação da exploração de petróleo significaria alimentar processos que, de diferentes maneiras, replicam as condições de pobreza e desigualdade e, com isso, fortalecem a violência.

O Conhecimento da População

Os efeitos negativos da exploração de petróleo no Equador foram documentados muitas vezes, e uma parcela significativa da população está ciente deles. Em uma pesquisa recente de opinião, um pouco mais de um terço dos entrevistados indicou que a atividade petrolífera no Equador trouxe poucos ou nenhum benefício (chegando a 43% na Amazônia) (3). É ainda mais significativo que 80% acreditem que essa atividade afeta a natureza (63% consideram que o impacto é "muito grande"), enquanto apenas 10% acreditam que suas consequências são mínimas ou inexistentes. Esses indicadores são reveladores, pois mostram que a população entende que discursos, como os do governo anterior, que afirmavam ser possível a exploração de petróleo sem impactos ou com impactos mínimos, não têm fundamento. Também fica claro que as empresas têm uma parcela de responsabilidade (quase 40% dos entrevistados indicaram isso).

De Volta à Violência

Pode-se argumentar que a violência é resultado de vários fatores de natureza diversa e não necessariamente relacionados à exploração de petróleo. Isso é verdade. No entanto, não se pode ignorar que o tipo de economia que sustenta a extração de recursos gera múltiplos fatores que contribuem, cada um à sua maneira, para a violência.

Isso faz com que a preocupação com a insegurança e a criminalidade no Equador signifique aumentar a atenção e o comprometimento com a preservação do petróleo sob o solo. Isso implica, naturalmente, proteger a riqueza humana e ecológica do Parque Yasuní, mas também serve para conter a violência. O "Sim" para Yasuní também foi o "Sim" pela pacificação do país.

Eduardo Gudynas é pesquisador no Centro Latino-Americano de Ecologia Social (CLAES).

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