‘Constrói-se clima de tensão no país, para amedrontar protestos por direitos’
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- Gabriel Brito e Paulo Silva Jr, da Redação
- 13/03/2015
O Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) parece o grande aglutinador da atualidade nos movimentos sociais e grupos políticos contrários aos ajustes econômicos que percorrem todo o Brasil em 2015. Para discutir tal conjuntura, sob fortes tensionamentos, o Correio da Cidadania conversou com Natalia Szermeta, da coordenação do MTST.
“O Congresso está nadando de braçada ante um governo fragilizado e amedrontado. Não achamos que o clima está tão confortável e favorável a um impeachment, como tem sido propagandeado, principalmente na internet. Pensamos que se trata da construção de um clima que faça a esquerda, ou o campo mais combativo, ficar com medo de defender suas propostas”, afirmou.
Desse modo, Natalia garante que o movimento se manterá ao lado de todos os setores atingidos pelos governos de diferentes esferas, tomando a greve dos servidores paranaenses como o exemplo a ser seguido. Além do mais, considera “inaceitável” o início do mandato de Dilma, com todas as medidas diametralmente opostas às suas promessas de campanha, o que, obviamente, afeta a principal pauta do MTST: a moradia.
“Do ponto de vista da moradia, nós também estamos sentindo fortemente a política de ajustes. O Minha Casa Minha Vida 3, promessa da presidente no ano passado, já era pra ter sido lançado. Estamos passando por um processo de muitas dificuldades. Recentemente, o governo cortou o Minha Casa Melhor, um cartão utilizado pelas pessoas pra comprar as mobílias dos apartamentos incluídos no programa de moradia”, explicou.
A entrevista completa, gravada nos estúdios da webrádio Central 3, pode ser lida a seguir.
Correio da Cidadania: Em primeiro lugar, como foi a marcha realizada pelo MTST na última quinta, 5 de março, em referência ao Dia Internacional de Luta da Mulher, celebrado no domingo?
Natalia Szermeta: A marcha foi até a Secretaria da Justiça (ligada ao governo federal), para onde levamos pautas do interesse das mulheres. Isso porque há um grupo dentro da Secretaria responsável pelas políticas direcionadas às mulheres, enquanto não existe uma secretaria estadual de políticas para as mulheres.
Levamos reivindicações bem características da base social do MTST, entre elas questões relativas à violência contra a mulher, desde o atendimento nas delegacias de mulheres até o acolhimento, muitas vezes falho.
Reivindicamos uma política específica para as mulheres que sofrem com despejos e situações de vulnerabilidade. Também queremos a reeducação da Polícia Militar, que precisa estar preparada para agir em momentos de violência contra a mulher, sendo que em muitas vezes os próprios policiais são os agressores.
Discutimos algumas pautas relacionadas às políticas para a mulher, mas que têm relação com várias secretarias do governo estadual. Por isso ficou encaminhado que em 10 dias teremos um retorno, com reuniões agendadas com diferentes secretarias. A ideia é montar um grupo de trabalho pra acompanhar.
Entre os casos mais críticos que colocamos, estão a revista vexatória, que tem se mantido nos presídios, e o abrigo para as mulheres que vão fazer visitas em presídio e precisam pernoitar em algum lugar. Temos a premissa de que elas possam ser acolhidas pelo Estado, na linha de que o problema da violência contra a mulher, quase generalizado, com muitas mulheres morrendo todo ano, não é apenas do indivíduo, mas também do Estado, que não tem uma política de preservação da vida das mulheres e de humanização da sociedade.
Correio da Cidadania: Como analisa o começo de ano e de novos mandatos dos governos, diante de uma conjuntura de forte crise econômica, além de uma grave crise institucional?
Natalia Szermeta: O MTST começou o ano atuando de forma bem incisiva. 2015 começou de forma bem diferente dos anos anteriores, antes do carnaval já estava sacudido. Temos percebido que a forma de condução da política do país – indicações de ministério, declarações pós-eleitorais, ainda antes do início do mandato, a questão da água em São Paulo – mostra que teremos um ano duro pela frente, em especial os trabalhadores.
Vamos passar por um período forte de crise e novamente os cortes e ajustes serão na carne e na pele dos trabalhadores. E vai ter também muita atuação daqueles que acreditam ser possível, mesmo em tempos de crise econômica, uma política na qual os prejuízos não fiquem apenas a cargo dos trabalhadores.
Correio da Cidadania: Como vocês têm visto as recentes movimentações de setores políticos mais conservadores? Teme que ganhem as ruas de forma massiva?
Natalia Szermeta: De forma massiva, há dúvidas se ocorrerá. Mas o fato é que temos um governo fragilizado e um Congresso que está forte, especialmente em termos de políticas conservadoras. Temos percebido várias declarações e movimentações que atingem não só os gays, lésbicas, militantes pelo direito ao aborto, enfim, do campo mais da moral, como também, por exemplo, as terceirizações, ou seja, um retrocesso nas conquistas históricas dos trabalhadores.
O Congresso está nadando de braçada ante um governo fragilizado e amedrontado. Não achamos que o clima está tão confortável e favorável a um impeachment, como tem sido propagandeado, principalmente na internet. Pensamos que se trata da construção de um clima que faça a esquerda, ou o campo mais combativo, ficar com medo de defender suas propostas.
O posicionamento do MTST, já nas próximas semanas, vai ser de luta contra a política conservadora do Congresso e contra a política de todos os governos, federal, estaduais e municipais, em relação aos ajustes que promovem.
É inaceitável um governo ganhar as eleições com um discurso em defesa dos trabalhadores, contra os ajustes e arrochos, e antes de assumir o mandato já tomar medidas ruins aos trabalhadores, na direção oposta do discurso que fez a Dilma obter o segundo mandato.
Nosso papel será de pressionar e inibir iniciativas conservadoras. Em alguns casos, mais que conservadoras, mas, sim, desrespeitosas às diferenças entre as pessoas, que devem ser toleradas socialmente. Mas não vamos permitir que o governo deixe de defender os trabalhadores.
Correio da Cidadania: As medidas econômicas tomadas pelo novo governo, já acuado, são garantia de um ano difícil para a classe trabalhadora, como você já disse. Acha que teremos respostas que possam se massificar pelo país, a partir de movimentos como, por exemplo, greve dos servidores públicos paranaenses?
Natalia Szermeta: Acredito que a greve dos servidores públicos do Paraná é exemplo para o país todo. Não acho que se trata de caso isolado. É uma resposta à política de ajustes, que inclusive está sendo aplicada com força em SP e outros estados.
Certamente, o MTST está se mobilizando e construindo a luta em conjunto com outros grupos, já que se trata do pacote geral contra os trabalhadores, em todos os estados. Sem dúvida, a resposta coletiva da sociedade, contra a política manipulada pela direita, que tem muito apelo no senso comum despolitizado, precisa ser dada.
Por isso, as esquerdas precisam estar bem posicionadas. Precisam ter clareza de que não é possível defender um governo que não faz política para os trabalhadores. Portanto, o MTST acredita que as mobilizações serão centrais neste ano. E esperamos conseguir, através das manifestações, avançar em nossas lutas e impedir a retirada dos direitos que já conquistamos no passado.
Correio da Cidadania: Quais perspectivas o movimento tem em relação às políticas habitacionais para 2015?
Natalia Szermeta: Do ponto de vista da moradia, nós também estamos sentindo fortemente a política de ajustes. O Minha Casa Minha Vida 3, promessa da presidente no ano passado, já era pra ter sido lançado. Até agora, não foi. Nenhuma das demandas conquistadas pelo movimento no ano passado está garantida, porque estão exatamente vinculadas ao Minha Casa Minha Vida 3.
Dessa forma, estamos passando por um processo de muitas dificuldades. Recentemente, o governo cortou o Minha Casa Melhor, um cartão utilizado pelas pessoas pra comprar as mobílias dos apartamentos incluídos no programa de moradia.
Nesta semana, o MTST fará lutas diretas em relação a isso e esperamos respostas no sentido de garantir os acordos que fizemos no ano passado com a presidente Dilma.
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Gabriel Brito e Paulo Silva Junior são jornalistas.
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