As lutas dos estudantes secundaristas reabrem a perspectiva das Jornadas de Junho
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- Rodrigo Jurucê Gonçalves
- 07/01/2016
O ano de 2015 começou mal, mas acabou relativamente bem (do ponto de vista das lutas populares). É certo que a autocracia burguesa dá mostras de ampliação de seu caráter repressivo e o governo do PT está cada vez mais neoliberal e mais parecido com o do PSDB. 2015 marcou também o completo distanciamento de Dilma Rousseff do programa estabelecido nas eleições de 2014, que lhe concedeu a vitória. A presidente em nada se parece com a "Dilma Coração Valente" construída pelo marketing eleitoral. No ano que passou, tivemos ainda as mobilizações da classe média, que de conservadora avançou rumo ao reacionarismo fascista – e nesse rumo permanecerá, se entrincheirando em posições cada vez mais reacionárias.
No entanto, do ponto de vista das lutas sociais, tivemos reavivada a alma das revoltas de junho de 2013, que colocaram a população pobre de trabalhadores precarizados nas ruas, contestando e negando o que está colocado pelo sistema de poder da classe dominante brasileira. Neste sentido, os estudantes secundaristas de São Paulo ocuparam escolas e não só impediram seu fechamento, como ainda impuseram ao arrogante governo de São Paulo uma fragorosa derrota. Colocaram Alckmin no bolso. A luta da molecada boa reabre o cenário de lutas que ficaram mais ou menos dormentes desde as jornadas de junho/2013.
Essa reabertura de lutas, que não sabemos até quando irão durar (mas que também não há data para terminar, já que as contradições se ampliam e aprofundam), mostra seu vigor em Goiás, onde os secundaristas lutam, se organizam e ocupam escolas contra a privatização do governo de Marconi Perillo, que tenta mascarar a espoliação do patrimônio público sob o rótulo cool & chic das "Organizações Sociais" (OSs).
Interessante notar o que disse o juiz da Justiça de Goiás, Eduardo Tavares dos Reis, que negou ao governo o pedido de reintegração de posse das escolas ocupadas: “As manifestações de 2013 que se prolongaram até os dias atuais obrigam o poder público (inclusive o Judiciário) ao reconhecimento da legitimidade dos movimentos sociais e de protesto, com sua pauta e voz” (1), o que evidencia que o Estado burguês pode ser forçado a reconhecer a legitimidade das lutas e da classe trabalhadora como um interlocutor político legítimo.
Bem, além da molecada boa de luta, que nos enche de admiração e esperança, em 2015 houve ainda outras lutas, que não obtiveram a mesma vitória, mas nem por isso deixam de ser importantes, como a dos professores do Paraná, que foram terrivelmente reprimidos, mas selaram de forma definitiva o governador Beto Richa com sua incompetência e mau caratismo.
Houve ainda outras tantas lutas significativas que por ora não citaremos. Mas uma coisa é certa: as jornadas do junho de 2013 trouxeram uma nova consciência para a classe trabalhadora, que não aceita mais muito do que lhe é imposto e empurrado garganta abaixo.
De um lado, a autocracia burguesa vem buscando se fortalecer, como dissemos, ampliando sua capacidade repressiva através de mecanismos institucionais e legislativos, como o Ato Institucional n. 1 de Dilma (PL 2016/2015, assinado por Joaquim Levy, então ministro da Fazenda, e inspirado na 'Ley de Seguridad Ciudadana' da Espanha), que sob a camuflagem de tipificar e combater as “organizações terroristas”, na verdade busca criminalizar todas as lutas populares.
Mas de outro lado, a capacidade autocrática de impor consenso está bastante combalida. Seus velhos instrumentos que criam ilusão e alienação, como a rede Globo, estão bastante abalados na sua eficiência - antes incontestável. E agora, uma vez mais, as jornadas de junho mostram que não terminaram.
Diante disso, os capitalistas (uns mais, outros menos conscientes) temem a ascensão popular e alguns já afirmam que esta será uma “década perdida” (2), como foi a dos anos 80. “Perdida” do ponto de vista do capital, porque para a classe trabalhadora abre-se a perspectiva da ousadia das lutas e (por que não?) da ousadia da vitória.
Outra evidência dessa tendência é que as manifestações da classe média reacionária minguaram no último 13 de dezembro (aliás, aniversário do AI-5), quando saiu às ruas para defender o impeachment, que não trará nenhum benefício nem progresso social para a classe trabalhadora.
A perspectiva de luta surgida com o junho de 2013 só se concretizará com novas lutas da classe trabalhadora organizada e das organizações da esquerda que mantêm seu compromisso com a transformação do mundo e com a revolução socialista.
À esquerda revolucionária cabe a tarefa de estar junto dos trabalhadores e de buscar elevar o nível político, de consciência e de organização das lutas populares que estão colocadas no horizonte. E a autocracia burguesa (quem sabe?) poderá se ver em um beco sem saída, da mesma forma que ficou o governo de São Paulo.
Notas:
(2) O economista Paulo Piacchetti afirma: “É a década perdida de novo”. http://oglobo.globo.com/economia/economia-volta-ao-patamar-do-inicio-de-2011-ruma-para-depressao-18196215
Rodrigo Jurucê Gonçalves é professor do Curso de História da Universidade Estadual de Goiás (UEG), doutorando em História pela Universidade Federal de Goiás (UFG), autor do livro “História Fetichista: o aparelho de hegemonia filosófico Instituto Brasileiro de Filosofia/Convivum (1964-1985)” (Editora da UEG, no prelo).