Correio da Cidadania

Antifa: contra o quê e ao lado de quem lutar

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O tema do Antifascismo vem tomando conta dos debates políticos, seja por meio da educação e da difusão de mensagens e ações, ou das ameaças de criminalização e repressão. No início do ano, antifascistas em Porto Alegre interromperam um protesto bolsonarista em 17 de maio; depois, torcedores de diferentes times de futebol se juntaram para ocupar as ruas em São Paulo e frustrar protestos de apoiadores do presidente. Ambos inspiraram ações em mais de 15 cidades, como em Belo Horizonte, onde atos estão sendo organizados semanalmente para bloquear, atrasar e impedir carreatas dos que gostam de “protestos a favor” de populistas de direita.

Ao fim de maio, a onda de protestos combativos em centenas de cidades nos Estados Unidos, após o assassinato de George Floyd, repercutiu no mundo as lutas antirracistas e antifascistas. Como efeito, Bolsonaro e políticos da sua laia, pretendem imitar Donald Trump e fazer o que podem para tornar ações e grupos antifa como uma “ameaça terrorista doméstica”. Deixando claro o que sempre dissemos: quem se incomoda e combate o antifascismo é, pela lógica, um fascista. Seu objetivo pode não ser cumprido na lei, mas podemos esperar o que sempre aconteceu na história: vai atiçar os ânimos de suas bases dispostas a praticar atos de violência nas ruas contra minorias e todos que denunciam o fascismo, com a conivência da polícia.

Por isso, o momento é de se organizar e nos educar sobre a questão. Assim, o coletivo Facção Fictícia convidou Mark Bray, autor do livro Manual Antifa (2019), para uma entrevista exclusiva sobre alguns temas relevantes e polêmicos como: relação entre movimentos antifa e black bloc, anarquismo, esquerda institucional e até os ditos policiais “antifascistas” – fenômeno até então exclusivo no Brasil e que surpreende até mesmo militantes e pesquisadores com vasta experiência nas lutas antifascistas contra todas as formas de regimes e autoritarismos.

Boa leitura! Nos vemos nas ruas.


Minneapolis: saques e depredações mostram que a revolta popular não teme as ruínas.

Como você define o que chama, em seu livro, de antifa moderna e como ela contribui para o cenário de protestos atuais contra o racismo e a polícia nos EUA?

Mark Bray: Em resumo, eu diria que a política ou um grupo da antifa moderna seria uma oposição militante, socialista revolucionária, orientada para a ação direta, à extrema direita que rejeita recorrer à polícia ou ao Estado para detê-los e que geralmente tem uma espécie de noção de esquerda antifascista amplamente radical (pan-radical), embora nem sempre. Como você sabe, Trump culpou antifas e anarquistas pela destruição nos recentes protestos. Embora antifas tenham, provavelmente, estado em algumas manifestações, não há evidências de sua participação nelas. Com certeza, simplesmente não há antifas suficiente nos EUA para causar tal destruição. Eu gostaria que houvesse tantos, mas não existem. Certamente, porém, antifas apoiam o Black Lives Matter e pode haver algumas pessoas que participam dos dois tipos de organização.

Quais a relações entre antifa, tática black bloc e as lutas anarquistas e anticapitalistas contemporâneas desde a emergência do movimento antiglobalização?

Mark Bray: Na maior parte, os black blocs foram usados nos Estados Unidos a partir de 1999 para protestar em cúpulas econômicas (OMC em Seattle, especialmente), protestando contra as guerras, contra as convenções políticas nacionais etc. A associação entre antifa e black blocs nos EUA realmente começou com o J20 (protestos radicais que atacaram a cerimônia de posse de Trump em 2016), quando muitos anarquistas, antifa e outros antiautoritários foram presos e acusados de crimes cujas sentenças poderiam chegar a décadas na prisão. Felizmente eles foram absolvidos. Também ocorreram eventos como os black blocs interrompendo e acabando com um discurso do provocador de extrema-direita Milo Yiannopoulos em Berkeley, em 2017, e outros confrontos em Portland e em outros lugares.