Claro Enigma
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- Coluna Imbaú
- 23/02/2021
Créditos da imagem: CIMI/Rafael Nakamura-CTI.
Purãga pe Sika. (Sejam bem vindos)
Que tenhamos um bom Nhenhenhêm - em Nhengatu - nhem é a palavra. Portanto, nhenhenhêm significa ‘muitas falas’, vozes que se congraçam.
Somos resistência de luta contra todo resquício de colonialismo. A empatia é revolucionária.
“Nosso esforço tem sido juntar os cacos nesse processo de destruição que enfrentamos”, afirmou Givanildo Manoel da Silva, o Giva.
Torés torrenciais pulsam, e convém alertar que este texto é composto por partes distintas, puras misturas de análises de posturas e conjunturas, de protocolos e efeitos colaterais.
O indígena não se rende à ambição e isso quebra um dos pilares do capitalismo, que é criar necessidades de consumo.
Somos filhos desta pátria mãe hostil; filhos e netos de estupros e de políticas de eugenia.
Vou tentar traçar alguns pontos significativos desta luta desigual contra o apagamento que nos é submetido. Para tanto, faz-se necessário buscar alguns fundamentos básicos para esta roda de saberes. Nhenhenhêm.
Awá taá o yuká awá? (Quem matou quem?)
Resistimos sempre.
Antes de entrarmos nestes fundamentos, temos que deixar consistentes alguns conceitos. ‘Etnocídio não é vitimicídio, é homicídio cotidiano, instantâneo, introjetado por ações diárias disfarçadas em falácias tais como “minha avó foi pega no laço”.
Ora, a animalização é aceita para referendar origem, veja bem a conotação deste discurso. No século passado, Goebbels comparava judeus a animais e há até hoje uma comoção geral de indignação contra esses preceitos nazistas, completamente desumanos. Contudo, atualmente vemos setores judeus, os que mandam no Estado de Israel, tratarem de forma desumana os palestinos. Nós, indígenas, enfrentamos um genocídio permanente desde a invasão e, durante a colonização foram surgindo essas falácias já fascistas, ainda que o termo não existisse, de que alguém foi pego no laço, geralmente a avó, a figura feminina caçada para compor a construção de um novo fenótipo social.
“- Ará i purãga yãdé ki ya mumuxi” (O mundo é belo, a gente que o estraga) Yaguarê Yamã Aripunãguá.
“-Seu território é seu próprio corpo” (Márcia Mura)
“-O vírus veio com a invasão, em 1492” (Júlio Guató)
Mas vamos lá, faz-se necessário uma abordagem sobre os termos que serão aqui tratados. E essas definições estão em “Equidade e Saúde pelo prisma da etnicidade” da Organização Pan Americana da Saúde – vinculada à OMS;
1. Discriminação: a ordem social representa uma correlação determinada de forças entre as partes que participam na sociedade com interesses divergentes ou em conflito, relacionados com a propriedade da terra, os direitos de sucessão, a circulação do capital, meios e métodos de produção e produtividade do trabalho. Esses conflitos traduzem-se frequentemente em intolerância social e dão margem à discriminação, que por sua vez atua através do estigma, assimilando determinados aspectos do caráter e/ou comportamento (agressividade, passividade, indolência), além de características fenotípicas como a cor da pele, a estatura e o tipo de cabelo. O estigma consiste na atribuição desigual de características de comportamento a certos grupos humanos.
2. Etnicidade: entende-se um processo de construção de uma consciência coletiva. Esse conceito encerra, sem dúvida, uma dimensão histórica e está intimamente vinculado ao problema dos indivíduos e das relações grupais. A etnicidade se constrói a partir do compartilhamento de um ou mais dos seguintes elementos: mitos, antepassados ou origens comuns, religião, território, memória de um passado coletivo, traje, língua ou mesmo caracteres somáticos como a cor da pele, tipo de cabelo, forma dos olhos, isso são marcas étnicas. A etnicidade permite construir grupos com identidades próprias e diferenciadas, em torno dos elementos selecionados e até mesmo um território de origem. Com a construção de sua etnicidade, os grupos geram solidariedade entre seus membros.
Daí a importância do pertencimento, que são os fundamentos de toda manifestação de retomada e autoidentificação.
3. Racismo: é uma forma de discriminação de grupos e ou indivíduos baseada numa ideologia de inferioridade, que tende a diferenciar negativamente os grupos minoritários ou ferir seus interesses. Pode ser institucional ou individual. Guarda relações com ideias pré-concebidas, estereótipos e preconceitos sociais sem fundamento racional ou científico. Embora invisível, faz parte às vezes das crenças e da escala de valores das sociedades ou comunidades.
4. Raça: é um conjunto basicamente sociológico que não tem fundamento em aspectos biológicos específicos.
A diferenciação entre raça e etnia só se justifica como meio de facilitar a abordagem metodológica. Por este prisma, utiliza-se raça para identificar as características biológicas que diferenciam os grupos humanos (cor da pele, estatura, tipo de cabelo e outras), ao passo que etnia se refere aos fatores de ordem cultural que permitem visualizar a existência de um povo, e por vezes, de uma nação. Nesse sentido, raça é uma caracterização de indivíduos segundo um traço físico (branco, negro, amarelo, pardo etc.) enquanto etnia é uma identificação de grupos humanos (Guatós, Xavantes, Guaranis) e não uma caracterização do indivíduo.
Esses conceitos são sociológicos, há outros olhares, porém, para a prosa de hoje creio ser mais significativo abordar dessa forma.
A empatia é revolucionária
O etnocídio é um apagamento visceral de toda e quaisquer possibilidades de se resgatar a origem; é um processo de dizimação social vigente, e sendo praticado, às vezes inconscientemente por pessoas ou grupos que propagam falas e/ou emitem juízos corrompidos de valores por que, “é assim que tem que ser”, herdam discursos familiares ou assimilam palavras em cultos e posturas em palanques políticos ou ainda induzidos por mídias com interesses capitais.
Vou citar aqui o parente Casé em um texto: “Não temos rancor, temos memória e derrubar monumentos não é negacionismo e sim descolonização”. O etnocídio é uma construção social e precisamos derrubar este muro. Ailton Krenak no texto ‘antes que o mundo não existia’ diz: “entre a história e a memória, fico com a memória”.
O indígena sempre foi “apagado” de toda historicidade e aparece ao longo da narrativa histórica e ficcional como exemplos de selvagens, e apenas aqueles que aceitaram a fé cristianizada e contribuíram para o desenvolvimento do poder como Tibiriçá e Bartira - aponta Casé.
Na literatura, Mário de Andrade em Macunaíma, rapsódia fantástica que traz como subtítulo “Herói sem nenhum caráter”. José de Alencar com a romantização idealista e invencionista cria Iracema, que nada mais é do que um anagrama da palavra América. “Juca Pirama”, de Gonçalves Dias, incute um olhar que questiona a bravura sob uma ótica colonizadora. Diogo Álvares Correia, o Caramuru, náufrago que convive com os Tupinambás em livro de Frei José de Santa Rita Durão, propõe a interferência do colonizador ante a cultura originária e o sistema indígena. Esses são alguns dos olhares que se propagaram e ajudaram a construir estereótipos que contribuem até hoje para o apagamento.
A educação, assim como a religiosidade, é instrumento poderoso para o etnocídio.
Toda nossa história é de lutas e resistências, de memórias e futuros, de raízes e frutos. A insistência em sermos seres lutando contra as artimanhas cotidianas do preconceito e dizimação. Há toda uma trajetória de poder por parte das elites que promovem, a todo custo, operações para estabelecer a dominação através da educação.
É necessária e urgente uma discussão séria sobre o indígena na sociedade.
A invisibilidade é social é um projeto político
O Brasil possui uma diversidade cultural e linguística, mais de 300 povos e falantes de aproximadamente 274 línguas, e apenas 3% da nossa população se autodeclara indígena. Sabemos que após a constatação da pesquisa mitocondrial, podemos afirmar o que sempre soubemos: este país é essencialmente indígena.
Muitos reconhecem ter ascendência indígena em suas últimas gerações familiares sem, no entanto, identificar a etnia a que pertencem ou pertenciam. Afirmar ter descendência e não se autoafirmar indígena é um forte indicativo deste apagamento introjetado, este ocultamento de vínculos é resquício de preconceitos sociais. O projeto político que foi dominante na primeira metade do século passado (20), de miscigenação e branqueamento da população, resultou em violência para muitas comunidades indígenas obrigadas a esquecer sua história, sua língua, negando seus vínculos de pertencimento ao seu povo ou transformando-se em descendentes longínquos. Daí também surgir uma série de nominações, rótulos sociais, raciais, que exemplificaremos mais adiante em outro ponto de abordagem.
Hoje temos de forma mais acirrada este perfil fascista escancarado por uma massa eleitoral patética, formada por fundamentalistas religiosos que apregoam valores de uma falsa moral, as representações de bancadas nos parlamentos incidem em apenas representar ações S/A e lucros advindos de agronegócios, trocam sangue por soja, pastos por tekoas, agrotóxicos por lucros e bem-estar capitalista, tratores tratam humanos como adubos.
No Brasil, esse discurso nacionalista atual vinculado ao crescimento econômico, traz novamente à tona a necessidade de se institucionalizar, fortalecendo grupos hegemônicos do capital, para que o país cresça economicamente. Nesse sentido, populações minoritárias vêm mais uma vez sofrendo constantes violações de direito e muita pressão em seus territórios, demarcados ou não.
Mas precisamos nos lembrar que todas as cidades neste país foram construídas sobre terras originárias, portanto, indígenas estão onde quiserem. Mesmo assim torna-se bastante hostil a convivência, pois a população urbana arraigada de valores distorcidos sobre povos originários não acolhe sem levar em conta esses resquícios de apagamento embutidos em conceitos adquiridos inclusive em escolas, instituições religiosas que pregam, em nome de uma próspera misericórdia regada a dízimos e indulgência, que “amar ao próximo só se houver conversão aos mesmos preceitos”.
A convivência capitalista é um entrave para nós indígenas, como foi dito anteriormente, nós quebramos um dos pilares do capitalismo, pois não somos tocados pelo vírus do consumismo. O sistema social vigente e eleito propõe a ideia hegemônica de empreendedorismo e meritocracia, submetendo muitos à subserviência para sobrevivência. A desconsideração da sociedade com a presença indígena em contexto urbano é tutelada pelo órgão oficial, a Funai, assim a população em contexto urbano torna-se invisível para os olhos da sociedade e do Estado. Para a Funai, aqueles que deixaram a aldeia, abriram mão de ser indígenas. Muitos fazem a opção de tornarem-se pardos, no entanto, o ocultamento dos vínculos de pertencimento ao povo de origem está associado ao próprio contexto urbano que sempre nos foi hostil, a cidade é o ambiente que revela, de forma mais explícita, o racismo contra o indígena: figura atrasada, inconfiável, de hábitos estranhos, feios (esta citação é de Lúcia Helena Rangel).
Que tal um “programa de índio?”
Trago algumas experiências pessoais na infância: “bugre”, “japonês do Paraguai”, “cor de papelão”, “vai pro mato”, “índio quer apito”, “quase gente” e um apelido que quase virou nome: Resdefe (Resto de Feira), quando ajudava a limpar barracas na feira da Peixaria, bairro de Corumbá (MS,), entre outros.
Clóvis Caldeira em o Mutirão diz: “O epistemicídio e o etnocídio presentes no apagamento das sabedorias ancestrais dos povos originários é uma mentalidade racista que constrói e modela todo discurso social vigente”.
Em todos os sentidos a propagação da invisibilidade é praticada sempre, o apagamento social dá-se em todas as instâncias, na religiosidade, não só por fundamentalismos neopentecostais neoliberais, mas também em uma africanização do discurso ao abordarem certas ações. Por exemplo, a Jurema, que é indígena, mas sempre aparece vinculada a religiões de matriz africana. Defumação, banho com folhas, cachimbo são de petinguás, rezarias e marcações rítmicas são de pajelanças, não que algumas destas práticas não existissem em outros continentes, mas já existiam aqui antes da invasão.
Na alimentação, todas a seguir são indígenas, mas são ditas como de origem africana ou de culinária afro-brasileira: canjica, mungunzá, curau, aluá, pamonha, pirão, farofa. Há ainda uma forte deslegitimação da identidade afirmando serem comidas nordestinas. Esses apontamentos foram feitos nos estudos da parente Laís Zinha.
Ainda na Religiosidade, os deuses e a cosmovisão indígena são há muito demonizados, folclorizados, apagados. Yeba Bëlo é a deusa do Alto Amazonas que cria o universo, todas as outras denominações de criação são seres divinos masculinizados.
O outro e eu. O mundo sempre me é traduzido pelo outro. (Sabedoria Kraô)
“O medo da origem é o mal, o homem coletivo sente a necessidade de lutar, o orgulho, a arrogância, a glória, enchem a imaginação de quem domina, são demônios os que destroem o poder bravio da humanidade.
Viva Zapata, Viva Sandino, Viva Zumbi, Viva Tereza de Benguela, Antônio Conselheiro, Todos os Panteras Negras, Lampião sua imagem e semelhança, eu tenho certeza que eles também cantaram um dia” (Chico Science)
Viva Índio Galdino, Viva a luta Mapuche, Viva Aritana, Juruna, Marcos Veron. E Marçal de Souza Tupã Y que deixou uma sabedoria: “nós já convivemos anos e anos com a civilização do branco e já chegamos à conclusão de quem tem interesse na vida do índio é o próprio índio. Chegamos ao fim da picada, ao fim da estrada: ou nós avançamos ou nos entregamos...”
Isac Tembé Presente!
Prenúncio do etno-ecocídio que nos devasta
É preciso uma revoada na retomada de consciência de autodeclaração no Censo. O bom senso afirma, somos muito mais. Estamos em cárcere privado de nossa existência, de nossa essência.
“É preciso estar atento e forte, não temos tempo de temer a morte”, (Gil).
Esses versos me vêm em referência a tantos parentes mortos invisíveis. Estamos em Pandemia dentro de um etnocídio vigente. Milícias militarizam territórios invadidos por seitas neopentecostais que nos querem dízimos, descaracteriza-se um território e ele está livre para grilagem, pastagem e outras pedras preciosas que não as do caminho apenas.
Torés torrenciais pulsam.
Levando em consideração todos os procedimentos e medidas profiláticas para a sobrevivência que requer a continuidade da luta, a guerra está estabelecida desde que o vírus invasor chegou a estas terras e a partir de então temos configurado e lutado uma guerra invisível. Fazemos sim parte dos invisibilizados, e esta analogia é em virtude de que hoje o mundo faz um enfrentamento contra um inimigo invisível, nós.
Enquanto cidadãos indígenas, convivemos com a especificidade de um combate ao qual ninguém nos olha, não nos percebem porque somos tratados como seres invisíveis ou indesejáveis ou mesmo fora de contexto para esta sociedade colono-capitalista-patriarcalista-assistencialista e outras ‘istas’ até policialescas e, por trás disso, ainda encontram-se políticas voltadas ao isolamento e ao não reconhecimento de cidadãos indígenas fora das aldeias. Ou seja, dentro de um contexto urbano, somos seres à margem, o racismo escancarado, declarado, institucionalizado não nos vê, não vê nossa cor, pulsa apenas negras essências, essa é uma das máscaras sociais que enfrentamos, a bala perdida não encontra apenas o jovem negro na periferia, o vício e o alcoolismo também são armas de apagamentos.
Em que pesem alguns contextos de convergências em movimentos sociais, muitos costumam apenas agregar-nos em pautas para revigorar o olhar assistencialista sistêmico e ainda partidos que cooptam parentes mas que são de postura fascista e integracionista normalmente compostos por bancadas evangélicas. Há uma bipolaridade contextual e estrutural, e em dado momento é preciso construir diálogos e pontes nestes diferentes universos, afinal combate-se o que se conhece, é preciso desconstruir um imaginário que se consolidou através de narrativas de extermínio. A questão identitária deve ser arma de luta contra preconceitos e discriminações. A história não é passado, estamos em processo de etnogênese, estamos em piracema.
“Na nossa perspectiva de compreensão da representação identitária numa situação que confronta o ‘si próprio’ à sua irrepresentabilidade, isto está arraigado a uma fórmula de apagamento: “eu não [...] mas [...]”, que cristaliza uma função determinante de instituição de uma identidade positiva a partir do negativo, sem descartar que tal instituição é a (des)continuação de um desejo...”, nos diz a obra ‘Representações do outro - discurso, (des)igualdade e exclusão’, organizada por Gláucia Muniz e Rita de Cássia Limberti.
Estupros consignados como armas cruéis de poder animalizado em nome de uma purificação representam faces deste etnocídio. Achille Mbembe define a necropolítica como gerenciamento da morte (sutil ou súbita) dos corpos indesejáveis por que são descartáveis à política vigente e consequentemente não podem ser disciplinados para a produção. Daí a tentativa de eugenia para aprimoramento da mão de obra produtiva. Foucault aborda a biopolítica, e assim somos expostos a todo tipo de descaracterização de origem.
Hoje uma avalanche de pardos adota opção pela porção negra, e vemos aí a representatividade originária sendo tolhida pela chancela de ‘comunidades tradicionais’, não especificamente originária, como abordou Sassá Tupinambá e Giva Fulni-ô - de que foram os indígenas que ensinaram os caminhos para os esconderijos, conhecidos por “Quilombos”, e ensinaram os alimentos nas florestas.
Aqui, como foi dito em outro parágrafo o exemplo mártir de Tereza de Benguela, liderança máxima do Quilombo Quariterê, símbolo de resistência no rio Piolho, que abrange o Pantanal e a Serra dos Parecis, na fronteira com a Bolívia. Lá, desenvolveram subsistências, resistências longas, após anos de sobrevivência, e conforme relatado foram capturados pela Bandeira da Capitania de Mato Grosso. Em uma das capturas, em 19/06/1795, levaram ao todo 54 pessoas, sendo “seis negros, oito índios, 19 índias, 10 caborés e 11 caborés fêmeas”, nas palavras do documento oficial. ‘Caborés’ é a designação da mistura de índios com negros, conforme pesquisa de Maria Fátima Roberto Machado, do Departamento de Antropologia da UFMT.
Qual era a etnia? Vidas indígenas importam?
“A enxurrada entupindo o esgoto, o asfalto liso, eis o caminho - mas no fim há um paraíso” (Verlaine - A voz dos botequins e outros poemas)
O ser humano caminha para o confronto final consigo próprio. Deuses em manifestos egoístas.
A revolução invisível em batalha numa guerra contra um inimigo sagaz, frio, e também que se camufla em ondas de racismos ‘despercebidos’ por palavras, ações provenientes de educação formal, seres invisibilizados, e desmascaram a feição do confronto, o encontro cruel com a face fascista do eco-genocídio instituído e alimentado por ‘seres’ em comunhão pentecostal, miliciana, neoliberal, que profanam princípios e virtudes herdadas por nós em sangue ancestral.
O vírus nos veio com a invasão e desde então vivemos “todas as horas do fim”*
Serviram-nos vícios e outros procedimentos nefastos de apagamento. O dízimo é a dizimação.
O estupro coletivo foi a constatação bíblica do “crescei e multiplicai-vos”. Quer terra, enterre-se, agrade-se, pois grades nos agradam.
São retóricas simbólicas do poder, e será assim enquanto não contarmos a história verdadeira.
Plantaram fome em nosso solo, colhemos misérias e assim essa sina assassina vai se tornando permanente, recebe títulos de agronegócio e distribui ócios capitais regados a sangue. Apenas seus atores imediatistas usufruem pela eternidade instantânea o poder de serem superiores aos ‘invisíveis’, os indesejáveis originários da terra que impedem o lucro.
Juízos concebidos. Conceitos facínoras moldam a feição do poder. O mundo fragmenta-se em resistências, essências do que nos é servido, induções ideológicas servem de amparo, porém, não são abrigos seguros, pois há uma coação e é como a mesma receita do vírus em 1492. E aí seres interpretam partes de um todo e se intitulam partidos.
Estamos em risco iminente há 521 anos, deflagramos agora a necessidade de sermos vetores originários de como se vive aqui. Não adianta expor fraturas, a sangria desatada nos acompanha há tempos. Somos alvos de intenções capitais e agora vamos disseminar verdades que foram manipuladas e escondidas, citei Verlaine e vou agora citar Sepultura, apenas pelo simbolismo do nome:
“Recuse/ Resista (Refuse/Resist)
Caos depois de Cristo (Chaos A.D)
Multidão furiosa (Raging crowd)
Derramamento de sangue (Bloodshed starts who'll be alive?)
Dentro do estado (inside the stade)
A guerra é criada (war is created)
Terra de ninguém (No man’s land)
Que merda é essa? ( What is this shit?)
Recuse, Resista, Recuse (Refuse, resist, refuse)
Silêncio significa morte ( Silence means death)
Permaneça de pé ( stand on your feet)
Medo interno ( Inner fear)
Seu pior inimigo (Your worst enemy)
Estamos assim, vivendo todas as horas do fim, como disse Torquato Neto, e ante inusitada surpresa, caso leitor quisesse talvez que referenciasse Mário em Macunaíma? Talvez Ramones e ou Raimundos, prefiro o enfático: “quem não pode com a formiga não assanha o formigueiro”.
“É preciso que compreenda-se que não existe liberdade sem igualdade e que a realização da maior liberdade na mais perfeita igualdade de direito e de fato, política, econômica e social ao mesmo tempo, é a Justiça”.
Mikhail Bakunin
Esse artigo foi escrito por Julio Guató.
A Coluna Imbaú é um novo espaço aberto no Correio da Cidadania junto de organizações e indivíduos indígenas de 13 etnias diferentes, com a finalidade de divulgar as produções e o pensamento dos povos originários brasileiros e suas pautas.