29M: Basta de Bolsonaro e sua turma!
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- Raphael Sanz, Elaine Campos, Marcus Iglesias, Ângelo Tupinambá, Alex Mirkhan, Filipe Prado e Ramiro Furquim, da Redação
- 02/06/2021
No último sábado (29) a população brasileira tomou as ruas das principais cidades do país para soltar um grito que estava entalado: “Fora Bolsonaro”.
Foi tão grande que até cidades médias consideradas redutos bolsonaristas como Blumenau e Balneário Camboriú, ambas em Santa Catarina, registraram sua insatisfação contra um governo amplamente intitulado de genocida e cuja percepção de que é mais letal do que o próprio vírus se alastrou pelo país.
Na tarde em que publicamos esta matéria ultrapassamos os 465 mil mortos pela Covid-19, fora os cerca de 30% de subnotificação que geralmente aparecem no noticiário científico. Ainda convivemos com a disseminação de variantes nacionais e estrangeiras num momento em que estamos longe de vacinar amplos setores da população, enquanto acompanhamos ao vivo pessoas ligadas à gestão federal da pandemia abusarem das nossas inteligências com mentiras e total ausência de vergonha na cara nos depoimentos da “CPI do Genocídio”.
Faltou oxigênio em Manaus, sobrou orçamento para leite condensado e bonecos do Rambo para as Forças Armadas. Faltou política externa para negociar a chegada de vacinas ainda em setembro, sobraram médicos colaboracionistas fazendo campanha por remédios, como a Cloroquina, sem qualquer evidência científica no tratamento da Covid-19, mas com um estoque de não sabemos quantos anos, ou décadas, nos armazéns das Forças Armadas, pago com o dinheiro das nossas vacinas. Aliás, dinheiro não há para um auxilio emergencial um pouco menos miserável, “peguem empréstimos no banco” rebateu o presidente, mas há muita grana, é claro, para financiar uma mansão de luxo do filho do presidente e uma Copa América da qual, se tudo der certo, não ocorrerá.
Falando, em Copa América, é simplesmente odioso ver membros do govern inventarem na CPI que não conseguiram ver os e-mails dos executivos da Pfizer sobre vacinas, mas atenderem ao apelo do circo mercenário do futebol desesperado por uma sede de seu esvaziado espetáculo em poucas horas.
Pra não falar em outras tragédias nacionais que vão escalando cada dia mais, como por exemplo a da letalidade policial contra as populações negra, indígena e periférica, como pudemos ver no Massacre do Jacarezinho e nos ataques aos Yanomami (em Roraima) e aos Munduruku (no Pará), recentemente. Além, é claro, dos assassinatos cotidianos que diariamente lemos nos jornais de um país que aceita de bom grado a perda dessas vidas.
Mas voltando ao 29M, o que vimos foi uma resposta popular e diversa ao domínio das ruas pelos bolsonaristas que, negacionistas que são, estiveram durante toda a pandemia nelas, oferecendo um amplo show de horrores a todos nós.
Cartaz exibido no 29M em São Paulo. Créditos: Elaine Campos.
No sábado, pessoas tomaram não apenas as ruas, como também todos cuidados possíveis e, correndo alguns riscos necessários, manifestaram a consciência de que o governo mata mais que o vírus e precisa cair já, urgentemente, para que paremos o quanto antes o morticínio completamente desnecessário que hoje vivemos. É importante pontuar que há hoje mais informações do que um ano atrás sobre a doença e como se prevenir dela, o que facilita às pessoas avaliarem a participação a partir das necessidades e condições de cada um. O sentimento é o de que se pegar ônibus, trabalhar, ir para as escolas (que agora devem ser abertas na marra), ao supermercado etc. não é aglomerar, manifestar-se contra a realização de um genocídio deliberado também não deve ser. Em outras palavras, em nada se iguala quem saiu nas ruas no sábado a uma narrativa negacionista da pandemia como a dos defensores do governo.
Pandemia que, aliás, já pode ser aqui tratada como sindemia, uma vez que, em metamorfose com a atual cúpula executiva e as velhas tragédias e escolhas políticas do país, transformou-se nessa arma de destruição em massa que estamos acompanhando – e tentando driblar – diariamente.
Como já era de se esperar, diversos meios de comunicação corporativos simplesmente ignoraram os protestos e estamparam matérias pagas em suas capas, com as receitas de bolo dos tempos de ditadura, porém, com uma pitada do “empreendedorismo” dos dias atuais. Mas foi uma atitude até positiva em relação aos protestos se compararmos aos veículos que os noticiaram como sempre: “protesto só vale se tiver camisa da seleção, selfie com o Choque e massagem no ego frágil do palhaço presidencial”, nos dizem, não exatamente nessas palavras, enquanto apontam aglomerações e procuram qualquer coisa que cheire a ‘vandalismo’.
Já o presidente e seus filhotes, desde o Planalto, no início do dia disseram que não havia ninguém nas ruas. E realmente, às dez da manhã, o movimento era fraco na maioria das cidades. No entanto, quando começou a engrossar o caldo, o presidente da “gripezinha” magicamente ensaiou um flerte com a ciência e a saúde pública para reclamar que havia aglomeração. Mas tal sinalização machucou os desejos do seu ego e logo voltou a si, chamando a todos que se manifestavam de “maconheiros”.
Um gaguejar danado que estampa a derrota da gangue presidencial nesse sábado. Gangue essa que, é sempre importante lembrar, chegou ao poder dentro dos marcos democráticos, o que precisará ser resolvido no dia seguinte a essa rodada interminável de patacoadas letais e não letais.
A continuação dos protestos, assim como tudo em um país à deriva, é rodeada de incertezas. Sabemos que as polícias militares constituem um bloco de amplo apoio ao Governo Federal e tendem a endurecer a violência contra a maioria descontente, mesmo que ninguém dê motivos. O exemplo foi dado no Recife, onde nesta terça-feira (1) o comandante da tropa foi demitido pelo governador, uma vez que este último não havia dado ordem oficial para a repressão. Ninguém em pleno 2021 ainda é ingênuo o suficiente para confiar nessa turma e sua suposta lealdade à democracia. E os desdobramentos disso são completamente imprevisíveis, como já vimos acontecer.
Além disso, por dentro, as manifestações podem ser capturadas por uma lógica de disputa eleitoral precoce como já ensaiam alguns opinadores da esquerda e da direita, cada uma à sua maneira. Se sucumbir tão cedo à pequena política é natural que perca a força, como também pudemos ver em outros momentos.
Apesar disso, os protestos podem – e devem – ganhar cada vez mais corpo por conta das condições que se apresentam no país. Caso isso ocorra, as ruas podem ser o mais importante elemento de pressão pelo fim do governo genocida e a responsabilização dos mesmos pela tragédia atual.
De toda forma, e independentemente do que aconteça, só pelo fato de estarmos hoje publicando sobre o 29M e não sobre um novo passeio de moto dos Jumentos do Asfalto, ou qualquer outra sandice bolsonarista, já é, senão uma vitória, um alívio para o espírito.
Reunimos a seguir relatos de diversas cidades enviados exclusivamente para o Correio da Cidadania por jornalistas e comunicadores independentes residentes nessas cidades. Alguns são mais envolvidos com movimentos e lutas sociais, outros se colocam como observadores.
Florianópolis, por Filipe Prado
Manifestação no centro de Florianópolis. Créditos: Filipe Prado
A capital catarinense teve a peculiaridade de inaugurar o 29M ao reunir a multidão no Largo da Alfândega, no centro, às 10h da manhã. Famílias, crianças, militâncias diversas e principalmente muitos jovens e estudantes compartilharam naquela manhã ensolarada de céu azul a preocupação e a coragem de se reunir em uma pandemia.
O falso questionamento dos atos, que imputa hipocrisia diante da exigência por isolamento social, é respondido prontamente em um cartaz: Bolsonaro é muito mais letal que o vírus.
Outra característica marcante foi a organização do ato, que tomou as ruas em 3 longas filas, como uma imensa e fina procissão - draconiana em relação às medidas de proteção sanitária. Pessoas distribuíam álcool em gel; quem estava sem máscara claramente não participava do rio de asfalto e gente; e os manifestantes em sua maioria usavam os modelos adequados de máscara, a PFF2. Havia também a preocupação em evitar aglomeração, o que nem sempre é fácil, pois estimou-se um público entre 13 e 15 mil pessoas.
Embora o motivo que os reunisse em Florianópolis seja dos mais extremos, o clima de euforia e festa era inevitável. Pessoas que não se viam há pelo menos um ano e meio se encontravam e revigoravam-se diante do genocídio. Houve música, percussão, dança, mas também muito grito de ódio e luto entalado há bastante tempo. Mesmo com um ano de atraso, quando antifascistas e torcidas organizadas de futebol tomaram as ruas em junho de 2020, o espaço público deixa de presenciar um monopólio fascista.
O protesto foi extremamente pacífico e contou com poucos episódios de tensão, causados principalmente por motoristas e motociclistas que acham que seu direito de ir e vir inclui atropelar manifestantes em seu caminho. Ninguém foi atropelado e discussões permaneceram sem agressões, mas o sentimento de hostilidade com pessoas fora do ato era constante.
O ódio bolsonarista à esquerda é muito presente em todo o estado de Santa Catarina, mas ainda assim houve atos também em Joinville, Jaraguá do Sul, Blumenau, Chapecó e Itajaí. Embora pequenos, são significativos e simbólicos.
Recife, por Marcus Iglesias
Neste sábado o Recife viveu uma das maiores repressões policiais dos últimos anos. Tudo isso num ato pacífico em que se pedia a saída de um genocida, o presidente Bolsonaro, que tem destruído a vida e os direitos do povo brasileiro.
O ato 29M na capital pernambucana começou pontualmente às 9h, na Praça do Derby, já com uma multidão na concentração. Eram pessoas de várias classes sociais, bandeiras partidárias (como o PT, PSOL, PCB, PCdoB e PCO, entre outras) e instituições políticas (como a UBES, UNE e Marcha das Mulheres etc.), mas também muita gente que decidiu sair de casa só pra dar seu grito entalado contra o genocídio do atual presidente.
A primeira sensação que tive quando cheguei ao protesto foi sentir uma emoção muito forte, daquelas que fazem a pessoa chorar de alegria. Havia algo de simbólico no ar com a juventude na rua, ou melhor, as pessoas de espírito jovem e revolucionário, porque tinha gente de todas as idades por lá, inclusive muitas crianças e idosos. Naquele instante ninguém tinha a mínima ideia do que nos aguardaria no final.
Quando a caminhada começou a energia era de coletivismo e de esperança pra quem luta por dias melhores. Neste sentido vale destacar a organização do evento, que orientou distanciamento social e fez campanhas prévias de arrecadação para compra e distribuição de máscaras e álcool em gel. Algo que, pela imagem por si só, já destoava completamente dos atos promovidos por apoiadores do presidente – como os na praia de Boa Viagem, com pessoas se aglomerando sem máscara e sem o distanciamento indicado. E sem repressão policial.
Segundo ouvi de alguns organizadores do ato, a ideia era que a manifestação fizesse o seguinte percurso: Praça do Derby, Av. Conde da Boa Vista, Av. Guararapes, Av. Dantas Barreto e Praça do Carmo, trajeto conhecido pra quem já esteve num protesto no Recife. Durante boa parte, o que vi foi uma multidão atravessando os quase dois quilômetros da Av. Conde da Boa Vista sem nenhum problema ou enfrentamento com a Polícia Militar. Apenas gritos de ordem e uma indignação de quem não aguenta mais perder pessoas, empregos e saúde. Um clima de paz e de respeito à vida.
Chegando à Ponte Duarte Coelho, que liga a Conde da Boa Vista à Guararapes, me dei conta do perigo que tinha pela frente. Havia uma pedra no meio do caminho da Av. Guararapes, onde uma tropa do Batalhão de Choque aguardava a chegada dos manifestantes que iam se juntando na ponte à medida que o protesto avançava. Logo percebi que os policiais não iriam nos deixar passar e muita gente começou a se questionar sobre de quem era essa ordem. Do governador? De Bolsonaro? A quem interessaria o confronto? Isso realmente vai acontecer?
PM pernambucana reprime protestos. Créditos de Flávio Japa.
Em pouco tempo a Ponte Duarte Coelho estava cheia de gente. Foi tudo muito rápido. Enquanto eu escutava pessoas da organização do protesto decidindo que trajeto fazer dali em diante, o impensável aconteceu: o Batalhão do Choque começou a disparar balas e bombas de gás lacrimogêneo para dispersar a multidão. Alguns podem dizer que foi por causa da provocação de um grupo de pessoas que correu em direção à polícia (tendo um deles derrubado uma lixeira). Mas a reação foi muito desproporcional à atitude em si, algo completamente injustificável diante da quantidade de pessoas ali presente, principalmente crianças e idosos.
Depois de iniciada a truculência policial, não houve recuo por parte deles. Não houve cessar fogo. O objetivo era claro: não só dispersar a multidão, como também humilhá-la e fazê-la ir embora a partir daquele ponto. Foi quando começou a se desenrolar um cenário de terror, com bombas voando sobre nossas cabeças, balas pra tudo que é lado, detenção sem justificativa e um monte de outras atitudes arbitrárias e violentas por parte da PM.
Assim que o Batalhão de Choque fechou a Ponte Duarte Coelho, vieram as cenas de horror. Um dos momentos mais tristes de presenciar foi quando o senhor Daniel Campelo, de 51 anos, que nem estava participando do ato, tentou atravessar a ponte e foi recebido pelos PMs com uma chuva de balas e bombas. Algumas pessoas tentaram socorrê-lo depois que ficou caído no chão, e por essa atitude também levaram bala e bomba da polícia, como se qualquer ajuda naquele instante não fosse permitida. Por conta das balas de borracha, Daniel perdeu a visão do olho esquerdo e precisou fazer uma cirurgia no domingo (30).
Outro instante de covardia aconteceu quando a vereadora Dani Portela (PSOL) tentou negociar com os policiais, que em resposta miraram nela suas armas. A situação ficou mais desesperadora quando a vereadora Liana Cirne (PT) também tentou negociar com a Polícia Militar, mas recebeu no rosto um spray de gás de pimenta - cena que circulou ao longo do dia nas redes sociais.
Não havia diálogo, nem com as autoridades, muito menos com a população, que agora já se dispersava pelas ruas. Ainda houve uma tentativa por parte da organização de guiar os manifestantes até o Monumento Tortura Nunca Mais, na Rua da Aurora, mas não havia mais clima e segurança para isso. As bombas de gás não paravam de cair, gerando correria a cada minuto com gente caindo e se machucando ou se engasgando com a fumaça lacrimogênea.
Pelas ruas que fazem parte do Centro do Recife, os relatos eram de perseguição por parte da PM aos manifestantes que portassem camisas partidárias ou da cor vermelha. O clima era de total perseguição política.
A reação desproporcional num dos estados que menos votou em Bolsonaro, em 2018, pareceu um recado premeditado, mas o senso coletivo prevaleceu. Mesmo assustadas, as pessoas estavam firmes nos seus ideais e valores, naquilo que acreditam e no que querem pro Brasil.
Apesar da repressão, foi um dia histórico, de enfrentamento ao bolsonarismo e do campo popular conseguir demarcar espaço nas ruas. É necessário averiguar as responsabilidades e cobrar punições, pois estamos diante de uma ruptura democrática vista apenas em tempos de ditadura militar. É importante entender até onde vai a força política de Bolsonaro dentro dos quadros das polícias estaduais pra que isso não se repita, ou não se transforme num motim parecido com o que vimos no Ceará, no ano passado.
Indispensável também compreender qual o real papel do governo estadual nesse cenário.
Para quem assina este relato, ficou a lição de que, mesmo com a Polícia Militar vestindo a carapuça e mostrando mais uma vez a que lado serve, o povo está disposto a seguir em frente com seus gritos não mais entalados, ainda que se tenha do outro lado do campo da disputa uma fileira de fascistas covardes e fardados, ainda que se tenha como adversário uma pessoa como o presidente Bolsonaro. Como diria o poeta, “Eles passarão, nós passarinho”, mas com muita luta num caminho cheio de pedras.
São Paulo, por Elaine Campos
O 29M 'Fora Bolsonaro' levou centenas de milhares de pessoas às ruas em mais de 210 cidades e 14 países. Mesmo com todos os esforços da mídia corporativa tradicional na tentativa de "esconder" a magnitude das manifestações, era impossível derrotar as ruas.
Com grande adesão de diversos setores do campo político da esquerda, movimentos populares e população em geral, os protestos causaram as mais diversas reações dos bolsonaristas e geraram uma imagem decisiva de fortalecimento das lutas para derrotar essa política genocida. Embora os movimentos sociais e populares nunca tenham deixado de se mobilizar nas ruas em meio a pandemia, esta foi a mobilização que mais levou manifestantes a sair de casa depois de mais de 1 ano de isolamento e distanciamento social. Um eco que foi ouvido mundo afora.
O ato em São Paulo teve a concentração marcada para as 16 horas no MASP, localizado na famosa Avenida Paulista, e já contava com dezenas de pessoas 1 hora antes do combinado. O balanço divulgado pelas organizações no final do dia 29 estimou cerca de 80 mil pessoas ocupando as ruas contra as políticas deste governo que já matou mais de 465 mil pessoas. O protesto também repercutiu a falta de vacinas para combater a Covid-19, a fome, o desemprego, os ataques aos indígenas, aos negros, ao meio ambiente.
Da metade para o final da manifestação, um bloco autônomo indígena que estava posicionado na frente do caminhão de som chamava atenção para a invisibilidade da participação de indígenas em todo trajeto, com uma enorme faixa escrito "Demarcação Já" em oposição ao projeto que autoriza garimpo em terra indígena e dificulta as demarcações de novas áreas, já paralisadas desde o início do Governo Bolsonaro. Bloqueou o carro de som até que sua voz fosse olvida. Ignorados, abaixaram as faixas, deitaram na rua, cantaram e demonstraram a rebeldia e força indígena tão negligenciada e invisibilizada também no contexto urbano.
O carro estava posicionado em frente à Escola Estadual Professora Marina Cintra na Rua da Consolação, escola esta que tem uma pintura de um Padre Jesuíta catequizando crianças indígenas na fachada principal da via, o protesto dentro do protesto. Embora simbólico, foi um ato de rebeldia, o carro só seguiu em frente depois que a Chirley Pankará (1ª indígena codeputada estadual em SP) pôde falar. Foi um dos momentos mais marcantes do dia.
Vale lembrar que sob o governo Bolsonaro conflitos no campo aumentaram e assassinatos de indígenas batem recordes.
Belém do Pará, por Angelo Tupinambá
Belém do Pará, antigo Território de Maery Tupibambá (1616), participou dos Atos Nacionais “Fora Bolsonaro e Mourão, Comida no Prato e Vacina no Braço!”, levando às ruas da capital paraense cerca de 5mil pessoas, segundo a própria organização do ato político.
Movimentos Sociais, Centrais Sindicais e Partidos Políticos convocaram concentração para às 8h na Praça da República, ao lado do Teatro da Paz, histórico local de manifestações da Cidade das Mangueiras. A principal reivindicação em cartazes e palavras de ordem era mesmo o impeachment da chapa Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão e a efetivação do Plano Nacional de Vacinação, pela compra de vacinas contra Covid-19. Por volta das 10h, o Ato iniciou com Manifesto Interreligioso pelas vítimas da pandemia e em chamado à luta de resistência.
Manifestação em Belém do Pará. Créditos: Angelo Tupinambá.
A marcha popular tomou a Avenida Presidente Vargas, seguindo pela Avenida Nazaré, depois Magalhães Barata até o Mercado de São Brás, percorrendo assim, a primeira parte da Rota Terrestre Tupinambá de Maery para o Caeté (atual Bragança). Durante todo o trajeto se buscou manter o distanciamento e todos os protocolos de prevenção ao vírus. Máscaras e álcool 70% foram distribuídos aos participantes presentes.
A participação dos povos originários teve presença de integrantes da Federação Estadual dos Povos Indígenas do Pará, Associação dos Povos Indígenas Estudantes na UFPA e independentes. A Bike Som Maria Lira (Unidade Móvel FM) da Rádio Idade Mídia Comunicação para Cidadania, vinha junto ao destacamento da União da Juventude Comunista e Unidade Classista, com o ativista Angelo Tupinambá.
O Departamento de Trânsito e Polícia Militar do Estado do Pará acompanharam o trajeto, no entanto, não houve qualquer incidente, valendo o trabalho da comissão de segurança do ato, que zelou pela integridade das pessoas.
O povo foi às ruas para gritar Fora Bolsonaro no primeiro grande ato da cidade após o início da pandemia.
Brasília (DF), por Alex Mirkhan
Brasília é, provavelmente, a cidade que mais precisava de um protesto massivo contra o governo Bolsonaro. Há bastante tempo sua dignidade vinha sendo dominicalmente pisoteada por repugnantes carreatas, passeios de moto, a cavalo e até sobrevoos presidenciais com helicópteros militares. Botar os blocos na rua para disputar o controle da narrativa em uma cidade que respira política durante uma pandemia certamente é tarefa mais complicada para quem tem o mínimo de empatia e noção da realidade.
Manifestante pede “Fora Bolsonaro” em Brasília. Créditos: Alex Mirkhan.
Por isso, o primeiro mérito do protesto deste sábado na capital do país foi superar os receios de sair de casa e de munir os adversários com imagens de aglomeração e desrespeito aos protocolos sanitários, tão criticados nas caravanas bolsonaristas. O esforço exemplar dos organizadores e do próprio público garantiu que a marcha a pé pelo Eixo Monumental ocorresse em filas paralelas e que a distância de 2 metros se mantivesse no gramado em frente ao Congresso, onde faixas no chão orientavam o posicionamento dos manifestantes.
O outro grande mérito da mobilização é de natureza mais psicológica e anímica. Os opositores à extrema direita delirante precisavam - e conseguiram - dar uma demonstração de força para retomar um território manchado de ódio verde-amarelista (com financiamento de clubes de tiro do Distrito Federal e de outros mecenas ocultos, embora óbvios). E não estavam ali apenas os antigos e novos eleitores de Lula e do PT, mas também outras frentes de esquerda que costumam criticá-lo, profissionais da saúde, professores, movimentos sociais, artistas, anarquistas e também cidadãos notoriamente mais tranquilos politicamente, que provavelmente não se dariam ao trabalho se o descontrole geral não fosse tamanho.
O resultado foi um clima muito mais leve em comparação aos protestos governistas que também pude presenciar fazendo a cobertura como vídeo-repórter. Na pista larga da avenida que divide a capital e conduz aos palácios do poder, vi alguém fantasiado de Dilma Rousseff, cartazes debochando da família Bolsonaro e seus seguidores, intercalados por mensagens sérias e de pura indignação. As pessoas conseguiram transformar o cenário brasiliense, outrora território de manifestações de apoiadores do governo.
Mesmo que as imagens aéreas não tenham sido tão impressionantes quanto as de outras capitais, como São Paulo, a sensação é de que finalmente é possivelmente disputar esse território e de que a luta irá até o fim.
Porto Alegre, por Ramiro Furquim
Foi surpreendente a adesão que se viu no Centro Histórico de Porto Alegre. Quase 20 mil pessoas caminharam inconformadas pedindo vacina e comida. Muitos jovens. Muitos estudantes. Muitos senhores e senhoras. Foi um grande encontro de luta pela sobrevivência e contra as omissões do governo Jair Bolsonaro.
29M em Porto Alegre. Créditos: Ramiro Furquim/@outroangulofoto
O ponto de concentração foi em frente à prefeitura da Capital, no Paço Municipal. Logo às 15h o local estava tomado. Muitos cartazes de Fora Bolsonaro, Fora Genocida e saudações ao SUS. Teve gente pedindo mais educação e menos reformas neoliberais. Teve filhas e filhos, netos e netas, amigos e amigas enlutadas por entes queridos que se foram durante a pandemia. Muitos se foram quando já havia vacina, mas o governo se recusou a comprar.
A marcha saiu devagarinho e seguiu para a Usina do Gasômetro pela rua Riachuelo, uma rua residencial no trecho. Muitos moradores saíram às janelas. Bateram palmas, panelas. Gritaram e tremularam bandeiras. Bandeiras de partidos de Esquerda. Bandeiras do Brasil. Outros apenas observaram. Nada de xingamentos. Nenhum bolsonarista provocador. A rua ficou tomada. Não se via o fim, nem o início daquele mundaréu de gente que há tempos não se via.
Junto do Gasômetro houve nova concentração. Quase todas as pessoas mascaradas. Havia algum distanciamento. Não era o distanciamento recomendado, mas havia alguma preocupação. Alguns políticos e líderes de movimentos sociais discursaram. Muitos cânticos entoados com força e indignação. Houve alguma dispersão pelo trajeto pouco usual, pelas ruas internas do bairro. A volta foi pela extensão da rua Demétrio Ribeiro, sentido Largo Zumbi dos Palmares.
Oito quadras de bastante barulho lembrando as relações do presidente com a milícia carioca, com as rachadinhas das quais a família Bolsonaro é acusada. Lembrando do descaso para com a busca de vacinas. Lembrando também das ações dos governantes locais como o governador Eduardo Leite, que relaxou os decretos em pleno pico dos casos, e o prefeito Sebastião Melo, que se revelou um grande negacionista da pandemia.
No Largo Zumbi, uma rápida rodada de discursos de outras lideranças e o pessoal foi se dispersando aos poucos. Um boneco do presidente foi queimado na avenida. Conforme a multidão se ia, a polícia se aproximava. Houve quem tentou, um malabarista sozinho, resistir: "Por que aqui não é o Chile?". A pergunta ecoou nos ouvidos dos que não deixaram o artista ser detido. Foram-se embora. A demonstração contra o governo foi forte.
Raphael Sanz é jornalista e editor do Correio da Cidadania.
Elaine Campos é socióloga de formação, fotógrafa e pesquisadora da presença das mulheres e lésbicas na fotografia e narrativas latino americanas. Faz parte da Marcha Mundial das Mulheres, do Coletivo Contra a Tortura de SP e da Coletive de Resistência Anarkopunk Flechas Kruzadas. Instagram: /elainecamposfotografia/
Angelo Madson Tupinambá é coordenador do Instituto Idade Mídia – Comunicação para Cidadania (Rádio Libertadora IM e IMTV, Bike Som Maria Lira FM) em Belém do Pará.
Marcus Iglesias é jornalista e morador do centro do Recife.
Filipe Prado é jornalista e poeta.
Alex Mirkhan é jornalista e videomaker paulista radicado em Brasília.
Ramiro Furquim é fotojornalista, circula pelas ruas da região Sul e pode ser encontrado em @outroangulofoto e jornalja.com.br.