Correio da Cidadania

Movimento de moradia ligado ao PSDB é acusado de arruinar 4º ato contra a tarifa em SP

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O gás de pimenta deixado no metrô Belém após o terceiro ato contra o aumento das tarifas de ônibus, trens e metrô anunciava o que estaria por vir, ainda que aquela tenha sido a única manifestação convocada pelo Movimento Passe Livre (MPL) com começo, meio e fim. Na sexta, 23, o quarto ato contra o aumento terminou com um esquema de guerra armado pela Polícia Militar no centro de São Paulo, para agredir e caçar gratuitamente milhares de manifestantes. Dezenas terminaram feridos e houve 7 prisões, todas classificáveis como arbitrárias. Por fim, a suspeita de uma sabotagem planejada é enorme.

 

A manifestação se concentrou e fez a já tradicional assembleia no Theatro Municipal. De lá, atravessou o Viaduto do Chá, passou em frente à prefeitura e à Secretaria Municipal de Transportes e seguiu para a avenida Brigadeiro Luis Antonio, entoando cantos contra o aumento das tarifas, uma das partes mais visíveis do ‘pacote de maldades’ que o ano reserva à população.

 

Ainda na assembléia, os manifestantes acataram o pedido da Polícia Militar de não irem para a Avenida Paulista. A maioria absoluta dos presentes preferiu evitar hostilidades na votação do trajeto. Os próprios adeptos da tática black bloc não marcaram presença expressiva. E baterias de quatro grupos diferentes – Fanfarra do MAL, Território Livre, Juntos e Levante Popular da Juventude – embalavam a multidão.

 

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Concentração do ato seguida de assembleia que definiu o trajeto. Foto: Raphael Sanz

 

Chegando ao Pátio do Colégio, a chuva apertou e alguns deixaram o ato. Neste momento, havia cerca de 7 mil pessoas. Debaixo de chuva forte, o ato ainda passou em frente à Câmara dos Vereadores e da Secretaria de Segurança Pública, no Largo São Francisco, pacificamente.

 

A manifestação ainda passaria novamente pelo Theatro Municipal e seguiria para a Praça da República, onde se encerraria com um jogral. Mas havia uma PM no meio do caminho. Com ela, toda a falta de bom senso herdada dos tempos de ditadura.

 

Quando a frente do ato estava na altura do Cine Marrocos e o fundo passava por trás do Theatro, por volta das 21h, a tropa de choque lançou bombas no meio da multidão sem nenhuma razão aparente, causando uma imensa correria dos manifestantes e dispersando o ato.

 

Nas duas horas seguintes, houve uma caçada a manifestantes no centro da cidade. Revoltados com a repressão, alguns quebraram os vidros de uma agência bancária na avenida São Luis momentos antes de serem varridos pela ROCAM – policiais em motocicletas.

 

Um grupo de jornalistas se concentrou na esquina da São Luis com a Ipiranga, de frente para a Praça da República, e de lá foram presenciadas agressões e prisões arbitrárias. A praça foi transformada em uma espécie de câmara de gás a céu aberto. Às onze horas da noite, ainda era possível esbarrar na rua com verdadeiras caravanas policiais rondando ostensivamente o centro à procura de manifestantes.

 

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Policiais perseguiram manifestantes a esmo. Foto: Raphael Sanz

 

Durante o ataque policial, o repórter Edgar Maciel – do Estadão – foi ferido na perna por uma bala de borracha. Esta cena finalmente comoveu os grandes jornais da cidade que, como em junho de 2013, deram uma breve guinada na direção da realidade. Na matéria divulgada pelo veículo, foi dada a contagem de presentes do MPL para contrapor a versão oficial. Além disso, colocou em saia justa o major Luís Augusto Âmbar e sua justificativa para a agressão policial.

 

Para toda a imprensa, o major declarou que o princípio do conflito foi desencadeado por uma bomba que explodiu ocasionalmente no meio da multidão. Segundo ele, os manifestantes “acharam” que a bomba teria partido da polícia e revidaram com pedras e rojões. “Então tivemos que agir”, concluiu.

 

Infiltração ‘alternativa’?

 

Como escrito acima, a origem do rojão que “obrigou” os policiais a reprimirem a manifestação segue em discussão. Alguns participantes da marcha alegam terem visto partir de uma janela da ocupação do Cine Marrocos, sob liderança do Movimento Sem Teto de São Paulo (MSTS, não confundir com MTST), menos conhecido do grande público.

 

Mais que isso: o MSTS é ligado ao PSDB, a exemplo de uma de suas lideranças, Robinson Nascimento dos Santos, filiado ao partido. De acordo com algumas informações, trata-se da única das dezenas de ocupações do centro de São Paulo ligada aos tucanos, sendo uma dissidência da Frente de Luta por Moradia (FLM), ligada ao PT.

 

A declaração de princípios do grupo, acessível em sua precaríssima página eletrônica, é genérica o suficiente para suspeitas de uma posição conivente às forças mais poderosas: “Diante da necessidade por melhores políticas públicas, o Movimento Sem Teto de São Paulo (MSTS) foi constituído, em 2012, por integrantes da sociedade civil e definiu como missão prioritária defender a luta por moradia digna, propondo-se a promover a cidadania, a melhoria da qualidade de vida e o desenvolvimento integral da comunidade. Em sua trajetória o MSTS tem uma intensa busca na conquista de projetos habitacionais, para a população de baixa renda”.

 

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Bombas e gases para todo lado marcaram o fim do protesto. Foto: Raphael Sanz

 

Convenha-se: muito estranho um movimento por moradia, do momento em que tal pauta talvez se encontre em seu auge de notoriedade, não fazer críticas explícitas à tão denunciada “especulação imobiliária”, que praticamente mandou na cidade nos últimos tempos e financia quase todos os partidos responsáveis por nosso atual déficit de moradia, que atinge 7 milhões de casas em todo o país.

 

Como se sabe muito claramente, o partido que governa o estado há mais 20 anos jamais teve afeição a movimentações de ruas, menos ainda de caráter antissistêmico, e, novamente, faz seu braço armado atuar no sentido de esvaziar pela violência as manifestações, atribuindo suas batalhas campais, cada vez mais equipadas, ao comportamento dos manifestantes.

 

Mais uma vez, o tiro pode sair pela culatra. Atitudes como voltar a ferir repórteres da grande mídia a obriga a publicar uma versão menos chapa branca, ou meramente mentirosa, dos fatos. E basta o mínimo de diversidade nos meios que cobrem os atos para outras versões virem à luz, a exemplo da matéria do El país brasileiro, que em seu título atribui a repressão à PM.

 

Além disso, diversas fotos de supostos “p2”, ou policiais infiltrados, foram divulgadas nas redes sociais, com graves denúncias de desvios de conduta. Portanto, não é difícil raciocinar que houve uma ação orquestrada para acabar com a manifestação.

 

Quanto aos atos contra o reajuste da tarifa, prossegue a maratona: nesta terça, a quinta marcha será no Largo da Batata, um dos palcos da eclosão nacional de 2013. E o sexto ato já está marcado para quinta-feira, em local ainda a ser definido.

 

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Raphael Sanz e Gabriel Brito são jornalistas.

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