Economia versus preservação
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- Danilo Pretti di Giorgi
- 30/05/2009
Os recentes ataques desferidos contra as leis ambientais no Brasil mostram que está, enfim, chegando a hora de enfrentarmos com seriedade e sem esquivas o dilema ‘crescimento econômico versus preservação do meio ambiente’.
Exemplos não faltam, mas o mais chocante vem de Santa Catarina, onde, ironicamente, o desrespeito às leis ambientais foi um dos maiores responsáveis pela tragédia das enchentes no ano passado. A Assembléia Legislativa catarinense aprovou em março um código estadual do meio ambiente que, entre outras coisas, reduz de 30 para cinco metros a área de proteção obrigatória das matas ciliares (vegetação que protege as margens dos rios, com função similar à de sobrancelhas e cílios para os nossos olhos). O tal código estabelece também que toda terra já cultivada no estado seja considerada "área consolidada", o que garante a continuidade de produção mesmo onde ela ocorre ilegalmente em regiões de preservação.
Curto e grosso assim, um exemplo seco de total desprezo pelas mínimas necessidades da vida selvagem em nome de uma aparentemente incontrolável necessidade de expansão da área cultivada. Um detalhe: o código é francamente inconstitucional, pois a legislação estadual não pode ser mais permissiva que a federal equivalente.
Em Brasília, estão tentando reduzir as reservas legais, as áreas que devem ser preservadas nas propriedades rurais (sendo que as porcentagens variam de uma região para outra do país) e há iniciativas para revogar decretos de proteção de dez milhões de hectares em unidades de conservação federais (uma área que corresponde a mais de duas vezes o estado do Rio de Janeiro).
A ofensiva, liderada por políticos da bancada ruralista, tenta também anular os efeitos de recentes iniciativas governamentais para frear o desmatamento, como o Plano de Combate ao Desmatamento da Amazônia, que corta o crédito rural de fazendeiros que desmataram ilegalmente, e o decreto 6.514, que prevê sanções administrativas pelo descumprimento do Código Florestal.
Enquanto isso, nove reservas em diferentes pontos do país estão emperradas na Casa Civil esperando autorização, pois o Ministério das Minas e Energia tem interesse nas áreas. Já o Ministério do Meio Ambiente recebeu apenas mil dos três mil novos fiscais que pediu para lutar contra o desmatamento na Amazônia. E a intenção de criar a Guarda Florestal Nacional ficou só na intenção. A lista de ataques não pára por aí, e seria cansativo para o leitor se eu tentasse esgotá-la neste espaço.
Enquanto tudo isso acontece, assistimos, perplexos, ao ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, elogiar o exemplo catarinense e brincar de vidente ao "prever leis ambientais mais flexíveis no país". Stephanes também tem defendido crimes como a liberação da agricultura em topo de morros e encostas e quer que a compensação de áreas desmatadas ilegalmente possa ser realizada com reflorestamento em locais distantes, até mesmo em outros estados (algo tão absurdo quanto propor que você resolva o problema causado pelo buraco no telhado da sua casa consertando o telhado da casa do seu vizinho). O ministro podia perguntar aos catarinenses que tiveram parentes mortos e casas destruídas pelas enchentes o que acham das suas idéias.
Stephanes está na linha de frente da ofensiva, fazendo ameaças, como a previsão de que, caso não sofra modificações profundas, o Código Florestal inviabilizará "quatro milhões de hectares produtivos, quinze milhões de toneladas de produtos, além de provocar o desaparecimento de milhares de agricultores, propriedades e até de pequenos municípios".
Essa fala do nobre ministro esclarece, portanto, o que a maior parte dos ambientalistas prefere fingir que não vê: ao contrário do que ouvimos muito por aí, meio ambiente e crescimento econômico se chocam, sim, e não são naturalmente compatíveis. É preciso tirar de um para dar ao outro. E é preciso coragem para encarar um debate sobre esse fato, para que se possa questionar o paradigma da premência do crescimento econômico sem fim.
Quando a discussão acerca da questão ambiental se acentua, os defensores da teoria furada do crescimento eterno usam em sua defesa os argumentos da ameaça ao crescimento econômico, aos empregos, à saúde da economia. É neste ponto que os ambientalistas costumam recuar, afirmando ser possível aliar crescimento econômico e preservação, discurso sempre presente na mídia de massa e nos bolsos dos coletes do ministro Minc.
É claro que poderíamos adiar este embate se a elite brasileira não fosse tão pré-histórica em suas práticas nem tão cega para qualquer coisa que não signifique o lucro imediato, com o menor esforço possível e a qualquer preço. Se empresários e ruralistas aceitassem a possibilidade de uma margem de lucro um pouco menor, o choque entre preservação e crescimento da economia poderia ser empurrado para frente, para daqui a dez ou quinze anos, caso houvesse, por exemplo, real interesse na recuperação dos tais 60 milhões de hectares em áreas degradadas, ao invés de desmatar novas áreas. Ou se aplicássemos técnicas para melhor aproveitamento das áreas produtivas. Ou ainda se buscássemos seriamente alternativas para aproveitamento econômico da floresta com atividades verdadeiramente sustentáveis. Ou se pensássemos na agricultura em termos mais amplos, com olhos voltados para todos os tamanhos de propriedades e para a diversificação e não só nas grandes propriedades monocultoras. Ou talvez se enxergássemos a função social da propriedade, tal qual manda a Constituição.
Mas nada disso é mais rentável que simplesmente derrubar mata virgem e tocar fogo, e esse fato singelo faz a conversa terminar por aí quando falamos de capitalismo brasileiro. Mesmo na hipótese da aplicação de opções como as descritas acima, depois de certo tempo o embate entre crescimento econômico e preservação voltará à tona. Não há como fugir disso. Enquanto não tivermos coragem de enfrentar seriamente essa verdade continuaremos a ser presas fáceis daqueles que se aproveitam das brechas nas nossas argumentações para enriquecerem às custas da natureza.
Não é possível que toda vez que alguém fale em "ameaça ao crescimento econômico" os ambientalistas corram para apagar o fogo e tentar apaziguar, apegando-se ao discurso oficial, amparado em grande parte pela sede das grandes ONGs ambientalistas por patrocínios polpudos. É preciso, ao invés disso, que cada um mostre realmente de que lado está, comprando a briga e aprofundando este debate, sem medo de suas conseqüências.
Danilo Pretti Di Giorgi é jornalista.
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Comentários
Mesmo com todas as tragédias que estão ocorrendo no Estado nas últimas décadas, desde as violentas enchentes que ocorrem entre o Vale do Itajaí e do Araranguá, que matam centenas de pessoas e causam enormes prejuízos até a ocorrência de tornados, ciclones extra-tropicais e o furacão Catarina, ou seja, é o Estado que mais precisa investir em preservação para evitar e/ou reduzir os impactos destas adversidades climáticas. A ganância infecciosa do lucro não permite adoção de medidas preventivas e de adaptação às comunidades que vivem em área de risco. Não investem em pesquisas e estudos para o esclarecimento dos fenômenos, afinal não podemos se basear apenas em apontamentos da meteorologia.
OBS. Tem ainda a exploração e queima de combustível fóssil carvão que causa uma brutal agressão ao meio ambiente, com permissão e incentivo do Estado...
Não bastasse esta ousada, desnecessária e ameaçadora manobra do Governador LHS, agora o Deputado Federal Valdir Colatto está com um projeto para alterar o Código Florestal Brasileiro, com apoio da bancada ruralista do agronegócio para exportação liderada pela Senadora Kátia Abreu.
Quem irá defender a integridade dos biomas brasileiros, como da Amazônia, Pantanal, Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica e Pampa serão, de um jeito ou de outro, os de esquerda, ou seja, a comunidade ambientalista brasileira, formada por todas as pessoas que possuem um grau de consciência ecológica, enquanto que os de direita proporão a exploração dos recursos naturais, usando o discurso da geração de divisas e empregos ‘’agora’’, não importando se comprometerão os direitos e necessidades das gerações futuras.
Tadeu Santos
Sócios da Natureza – ONG Conselheira do CONAMA Biênio 2009/2011.
Chega de EXPLORAR A FONTE MÃE. VAMOS ESGOTAR TUDO MESMO? Será que esses humanos que dirigem que se dizem responsáveis pelas terras de nosso planeta, estão tão adormecidos que não conseguem ampliar um "tantico" a visão ppara perceber o equilibrio natural do Meio Ambiente e que o homem tem sido a Criatura Destoante, e que o PLANETA COM A HUMANIDADE OU SEM A HUMANIDADE CONTINUA SEMPRE A EVOLUIR. E NÓS VAMOS NOS ALINHAR? OU SEREMOS EXPULSOS COMO INSETOS EM QUALQUER AFINAÇÃO DA GRANDE MÃE? a indignação é tamanha, mas o meu amor e confiança nessa conexão bendita é maior, unamo-nos e cuidemos.gratíssima
Você tocou em um ponto fundamental. Não podemos deixar que os grandes latifundiários e capitalistas continuem a colocar os seus interesses à frente dos interesses de toda a sociedade. Todos nós, sociedade civil, colocar sim o dedo na ferida e passar a dizer e defender, com unhas e dentes, que tipo, como e quanto queremos crescer. Ter um projeto claro para acabar com a fome, direto de todos os homens, e com a degradação do planeta.
Acho que o governo Lula, está nos devendo está.
Um abraço,
Vera Marchioni
O mais impressionante de tudo é que essa busca de terras agriculturáveis não é para fornecer produtos para os brasileiros, nem para atender as demandas das culturas locais brasileiras, mas sim atender a demanda de países ricos e muito populosos, como a China e os Estados Unidos, que já se esgotaram ecologicamente e já teriam entrado em colapso ambiental se não fosse a existência ainda dessa nossa fronteira agrícola em expansão. Tem produtos da cultura brasileira, como o arroz, que importamos. Já o feijão vem da agricultura familiar, que não sei se recebem a atenção devida das nossas instituições.
O mais impressionante é usar nossa fronteira agrícola para atender uma demanda que não é nossa, a custo ambiental nulo (dado nosso sistema de valores e de preços), colocando em risco a nossa sobrevivência, pois sem a Amazônia poucos brasileiros irão sobreviver.
E fazem isso pois existem pessoas ainda que são incapazes de reconhecer que a água que trânsita nossos corpos só existe por causa dos ecossistemas e dos bichos que a criam. Se todos os bichos e plantas sumissem da Terra, a água sumiria junto. Se as abelhas sumirem, iremos sumir, nossos corações só batem porque há um ser vivo que armazena a luz do sol para nós. E por aí vai. Essa arrogância e cegueira sobre a nossa dependência em relação à natureza será o nosso fim.
Abraço
Hugo
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