2014: nossa terra cada vez menos verde e amarela
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- Rogério Grassetto Teixeira da Cunha
- 06/01/2014
A coisa na área ambiental anda ruim, muito ruim. E poderá piorar neste ano. As razões para este pessimismo são muitas. Como o fato de que o mostrengo da usina de Belo Monte, no rio Xingu, deve entrar em funcionamento em sua primeira etapa talvez já no final de 2014. É neste ano que provavelmente acontecerá o remanejamento das famílias e a supressão da vegetação das ilhas e de boa parte das margens do Xingu ao longo do futuro lago.
O governo, fazem já dois anos, ou muito mais que isso, se contarmos toda a história das tentativas ao longo das últimas décadas, lançou-se de cabeça na insanidade de construir esta famigerada usina. Não repetirei aqui toda a história de erros, ilegalidades e mentiras acumulados ao longo deste percurso, analisada extensamente nesta coluna por Rodolfo Salm. Porém, agora, com a obra já bem encaminhada, percebi alguns setores da grande mídia mostrando algumas de suas nefastas consequências ou “preocupando-se” com problemas ambientais na região. Pode ser uma mera coincidência, claro, ou um viés pessoal meu, pois esporadicamente pipocaram aqui e ali algumas matérias mostrando os problemas da obra. Mas achei o “timing” no mínimo curioso (seria por causa da eleição, pergunto retoricamente?).
Em uma série de reportagens da rádio CBN (aqui e aqui), por exemplo, foi analisada a mineração na região amazônica, e mencionada a instalação da mineradora de ouro canadense Belo Sun na região de Altamira, próximo à nova usina, com um tênue espaço para os impactos da mineração na região. Faz tempo que os ambientalistas chamam a atenção para o fato de que um dos principais motivos para a construção de hidrelétricas na Amazônia é fornecer energia barata para projetos de mineração, que vão ganhar cada vez mais espaço na Amazônia. É o amarelo do ouro de nossa bandeira, indo para fora do país, como desde sempre.
Já no site da Folha, um material muito bem produzido abre caminho para que a população desinformada do nosso “sul maravilha” conheça um pouco dos impactos da obra. Só as fotos do canteiro de obras deixam, sob o ponto de vista da natureza, qualquer filme da série “Sexta-Feira 13” no chinelo. Apesar disto tudo, a usina será ligada, a exploração mineral vai ocorrer na região e o desmatamento e degradação vão aumentar o volume de suas trombetas do apocalipse. Aqui é o verde da nossa bandeira sendo dilapidado também.
Não é com nenhuma felicidade (muito pelo contrário) que diremos: nós avisamos. Nós, ambientalistas, sempre ressaltamos alguns dos reais motivos das obras: favorecer setores industriais eletro-intensivos e um modelo de ocupação na Amazônia que não irá beneficiar a população local (exceto com as costumeiras migalhas), mas sim grandes capitais externos e internos. Ao fazermos isto, as reações de sempre: fomos taxados de contrários ao desenvolvimento, de jogarmos um bagre no colo de Lula, de estarmos na contramão do progresso etc. O velho e cansativo ramerrão. Mas este será um caso em que demonstrar estar-se certo trará muita tristeza e melancolia, não alegria.
O pessimismo do artigo advém também do fato de que a sanha dos barrageiros na Amazônia é imensa, e que seu desrespeito por tudo (regras, bom senso, ambiente, população local) é absoluto. Sua gana agora volta-se contra o rio Tapajós, em uma região totalmente desabitada no coração da floresta. Em ano eleitoral, quando a necessidade de mostrar serviço é maior, podemos esperar novos avanços sobre a Amazônia. E também, escrevam aí, nos próximos anos veremos políticos e economistas defendendo aquilo que, quando do debate sobre a construção ou não de Belo Monte, foi “prometido” que não seria feito: a instalação de novas barragens rio Xingu acima.
Isto serviria para regularizar o fluxo do rio ao longo do ano e resolver a principal crítica técnica à obra, a de que a vazão baixa na época da seca diminui drasticamente seu potencial gerador de energia em boa parte do ano. Cada vez mais aparecerão artigos nos jornalões e comentaristas dos grandes veículos defendendo esta ideia. Isto porque a região amazônica é vista pelos barrageiros, pelos governos e pelas empreiteiras, que coincidentemente financiam campanhas e constroem barragens (ou seria o oposto? Nunca sei ao certo.), como a grande fronteira hidrelétrica do país. Neste assunto, precisaríamos de um Bom Senso Ambiente Clube inspirado no Bom Senso Futebol Clube. Mas a importância dada ao meio ambiente no Brasil é, infelizmente, infinitamente menor que ao futebol, embora os desmandos e tapetões guardem sórdida semelhança.
Um outro motivo para pessimismo é justamente o fato de tratar-se de ano eleitoral. E anos eleitorais não são mesmo época para se apertar a fiscalização. Embora reconhecendo os avanços sociais nestes quase 12 anos de governo petista, também entendo que seu pior desempenho foi na área ambiental. E os governantes do partido serão cobrados duramente por isto pela história, que, com o passar dos anos, dará muito mais destaque a esta chaga do que ao belo show do assim chamado “mensalão”.
Parte deste desempenho ambiental pífio (ou melhor, nefasto) deve-se ao noivado e casamento de Lula com o setor do agronegócio, sendo que Dilma parece muito contente com a duradoura união. Alianças com líderes locais são melindrosas, e eles não devem ser provocados. De mais a mais, a atenção de boa parte da opinião pública estará voltada para mais um round do UFC PT x PSDB (embora a dupla Marina/Campos esteja doida para entrar no octógono e melar a disputa), o que provavelmente deixará brechas para os desmatadores.
E, para fechar a conta, ainda teremos o oba-oba da Copa dos estádios bilionários. Provavelmente, ocorrerá mais outro oba-oba de manifestações acéfalas e genéricas (muitas delas ocas, como a maioria das de junho, ou manipuladas por este ou aquele esperto tentando tirar uma casquinha eleitoral). Nelas, falar-se-á de quase tudo (principalmente de lemas pequeno-burgueses “contra a corrupção”), menos de meio ambiente, deixando os destruidores sempre muito à vontade. Afinal, episódio recente da invasão do Instituto Royal em São Paulo demonstrou que a opinião pública se sensibiliza muito mais com algumas dezenas de cachorros beagle (sem entrar aqui no mérito da questão, apenas reconhecendo objetivamente o fato) do que pelos milhões (ou bilhões, se incluirmos na conta insetos e outras formas de vida menos “in”) de animais e plantas sacrificados todos os dias devido à destruição da maior floresta tropical do planeta que, não custa lembrar, tem girado em torno de 1200 a 2000 campos de futebol por dia nos últimos anos.
E isto aí, Amazônia, feliz 2013! Pois, na região, cada ano parece melhor que o que virá.
Rogério Grassetto Teixeira da Cunha, biólogo, é docente da Universidade Federal de Alfenas-MG e, apesar do pessimismo, lá no fundo tem sempre uma esperança.
Comentários
pelo bom texto conjuntural que nos brinda de realidade indesejável, mas que indica desejos de mudanças e, sobremaneira, de esperanças.
concordo com o teor do texto e mantenho-me na luta!!!
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