Correio da Cidadania

Atentado à democracia e improbidade administrativa

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É do conhecimento geral que a república federativa brasileira constituiu-se como Estado democrático de direito, sob o governo de três Poderes, independentes e harmônicos, todos eles sujeitos aos princípios impostos constitucionalmente à administração pública, a saber: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

 

É necessário compreender que a adoção aqui da tripartição dos Poderes não se deu por simples e caprichoso desejo de copiar a doutrina política inspiradora da revolução francesa, mas para garantir uma gestão mais democrática, descentralizando funções autônomas, até para fugir do nocivo absolutismo das antigas monarquias e das mais recentes ditaduras e dos graves danos sociais que provocaram.

 

É justamente por isso que a Constituição Federal exigiu expressamente a independência dos Poderes, vedando, em outros termos, a fusão de um com outro ou a incorporação de um por outro, ainda que disfarçadamente.

 

De outra parte, ninguém ignora o fato de que os Poderes Executivo e Legislativo devem observar, tanto em sua composição como no cumprimento de suas atribuições, o regime da representação popular, já que é do povo que há de emanar todo o poder do Estado.

 

Se é verdade que entre o povo e seus mandatários há os partidos políticos, não se pode esquecer, de qualquer modo, que os partidos têm a tão básica quanto importante incumbência de colher a opinião pública segmentada do país, transformando-a em projetos de ação política, a identificar seus candidatos, como se formulasse, a partir daí, as cláusulas do mandato a ser conferido pela comunidade.

 

Em outras palavras, o eleitor vota em determinado candidato por duas razões principais: a confiança pessoal e a expectativa de que será ele o mais qualificado para concretizar as propostas partidárias, traduzidas por meio de promessas de campanha.

 

Não há dúvida de que se deve assegurar aos senadores e deputados a liberdade de convicção, limitada, entretanto, ao incontestável dever de fidelidade para com o partido e o eleitor. E não se pode dizer que tal imposição ao mandatário afrontaria sua livre convicção, já exercida, na verdade, quando da escolha do partido, da filiação e das promessas que publicou.

 

Considerando tais circunstâncias, se senadores e deputados renunciarem ao exercício dessa atribuição, como que delegando função própria do legislador ao Executivo para, em troca de cargos públicos ou verbas orçamentárias, votarem com o governo nas alterações legislativas por ele projetadas, estarão atentando contra o regime republicano e a democracia e, em co-autoria com agentes do Executivo, estarão praticando ato de improbidade, visto que restará caracterizada a infração, no mínimo, aos princípios da legalidade, impessoalidade e moralidade.

 

Aliás, tendo em vista que a promiscuidade entre o Poder Executivo e os representantes do Poder Legislativo tem se tornado cada vez mais descarada em relação a esses fatos, é de se esperar que sejam os agentes infratores responsabilizados severamente, como determina a lei, com a perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, proibição de contratar com a administração pública e imposição de multa civil.

 

Airton Florentino de Barros é procurador de justiça em São Paulo, integrante fundador do Movimento Ministério Público Democrático e professor de direito comercial.

 

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