Minga e paralisação em Bogotá
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- Elaine Tavares
- 21/10/2020
A Colômbia vive hoje, dia 21 de outubro, um dia de paralisação nacional, com os trabalhadores e movimentos sociais nas ruas apresentando suas demandas. O movimento, organizado pelas centrais sindicais e o sindicato dos professores, acontece logo após a realização da Minga, em Bogotá, que chegou a reunir mais de 12 mil pessoas vindas de todo o país para conversar com o presidente Ivan Duque. As marchas indígenas e camponesas se deslocaram por vários dias desde o interior numa movimentação impressionante.
A intenção dessas comunidades, ao organizarem uma minga - forma tradicional das comunidades realizarem trabalhos coletivos ou discutirem em profundidade temas coletivos - era de que o presidente participasse do encontro e ouvisse suas palavras. Os colombianos já não suportam mais ver sua gente sendo assassinada ou desaparecida, mesmo depois da assinatura dos acordos de paz. Mas, como já era esperado, Ivan Duque não tomou conhecimento da gigantesca manifestação e não compareceu.
Ainda assim a minga se fez, com as lideranças políticas e espirituais das comunidades. Os mingueiros discutiram a situação do país e apresentaram sua decisão: que o governo garanta a vida, o território, a democracia e a paz. E que o presidente cumpra com a Constituição, garantindo os direitos dos colombianos.
As colunas indígenas e camponesas devem começar sua saída em direção ao interior, de volta para as comunidades, nesta quarta-feira, justamente para apoiar a mobilização proposta pelos trabalhadores urbanos. A intenção é participar da manifestação na Praça Bolívar, assim como os trabalhadores urbanos participaram da minga. Um momento único na história da Colômbia, de unidade entre os povos originários, camponeses e trabalhadores da cidade.
Para um país que vive em luta armada desde os anos 60, a necessidade do cumprimento dos acordos de paz se impõe e o governo precisa garantir que isso aconteça. Não dá mais para fazer vista grossa aos assassinatos sistemáticos e recorrentes.
Enquanto a Minga se fez para demandar vida e paz, a paralisação nacional trará demandas como a luta contra a fome, contra o desemprego, a violência contra as mulheres, por uma saúde pública de qualidade, por educação segura nos tempos de pandemia. A isso também se soma o protesto contra os assassinatos de lideranças populares, indígenas e sindicais, que chegam a quase 300 desde a assinatura do acordo de paz.
A Colômbia já disse que quer viver em paz. Para isso, há que destruir o paramilitarismo e o poder dos narcotraficantes. As comunidades, bem como os trabalhadores organizados em sindicatos e movimentos, sabem que esse é o nó mais importante para ser desatado.
O país vive há anos sob ocupação militar dos Estados Unidos, aceita pelos governos, tendo como propósito o combate ao narcotráfico. Mas, a pergunta que fica é: como que o exército mais poderoso da terra, que tem cerca de nove bases militares na Colômbia, não conseguiu até hoje debelar o narcotráfico? Ou são de uma incompetência atroz ou fazem parte do esquema.
Elaine Tavares
Elaine Tavares é jornalista e colaboradora do Instituto de Estudos Latino-Americanos da UFSC