Correio da Cidadania

O rescaldo das eleições na Venezuela

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A Venezuela passou nesse domingo (6) por mais um processo eleitoral, desta vez para eleger a nova Assembleia Nacional. Eleições livres, seguras e revestidas de toda a transparência. Mas, ainda assim, os países latino-americanos alinhados com os Estados Unidos insistem em não reconhecer o resultado, alegando que o governo de Nicolás Maduro é ilegal e que, portanto, isso torna também ilegais as eleições. Poderia ser uma piada se não fosse sério e não contasse com a imediata manifestação de presidentes de nações em um documento conjunto assinado pelos presidentes de Brasil, Estados Unidos, Uruguai, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, El Salvador, Guatemala, Guiana, Haiti, Honduras, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Santa Lucia. A União Europeia também se manifestou dizendo que a eleição não representa a vontade dos venezuelanos.

Para esses presidentes o governo de Maduro é ilegítimo, mas ninguém explica qual a causa dessa ilegalidade. No geral, esses governos se limitam a reproduzir as supostas denúncias de um político que não tem representatividade alguma junto ao povo venezuelano, que é Juan Guaidó, o parlamentar que se autoproclamou presidente do país depois de ter assumido a presidência da Assembleia no parlamento eleito em 2015.

Sempre vale a pena lembrar que as eleições de 2015 foram marcadas por várias fraudes – cometidas pelos partidos oposicionistas – que chegaram a colocar mortos para votar. Pelo menos dois deputados eleitos foram impugnados pelo poder eleitoral, mas o legislativo não fez caso disso e seguiu atuando em desacato perante a nação. O fato é que a Assembleia Nacional, presidida por Guaidó, ela sim, era ilegal.

Agora, expirado o mandato dos parlamentares, as novas eleições foram realizadas, dentro de todas as normas de segurança, transparência e democracia. A população foi chamada a votar, mas a abstenção foi bastante alta, levando-se em conta que o país, a exemplo dos demais países do mundo, sofre com a pandemia no novo coronavírus. Misteriosamente, a abstenção venezuelana acaba sendo “elemento de fraude” para os mandatários capachos dos EUA. Salienta-se que o voto na Venezuela não é obrigatório, portanto, as pessoas estão cientes de que se ficarem em casa, estão entregando o poder de mando a quem for votar. Logo, não há nenhum indício de ilegalidade nisso.

Também é importante dizer que o governo venezuelano realizou várias mesas de conversa e negociação com parte da oposição que se mostrou disposta a participar do pleito. E foi justamente esses encontros que definiram o voto proporcional que agora permite que todos os que participam das eleições tenham a possibilidade de eleger representantes. Ou seja, ninguém perde.

A gritaria, é claro, vem da parte do pequeno grupo – mas barulhento porque financiado pelos EUA – de Juan Guaidó que agora, sem mandato, não pode mais dizer que é presidente do país. Também ficaram de fora o grupo de Leopoldo Lopez e de Henrique Capriles, ou seja, a oposição golpista. São esses grupos que seguem colocando o povo venezuelano na difícil situação em que se encontra, com suas riquezas bloqueadas, sofrendo bloqueios até de remédio e com uma guerra econômica em andamento, que impede a consolidação de uma vida boa para o povo e tem obrigado muitas famílias até a abandonar o país. O drama da Venezuela não é provocado por Nicolás Maduro ou os chavistas, mas sim por esse pequeno grupo que não se conforma de ter perdido a possibilidade de seguir sugando as riquezas do país e que, sistematicamente, ataca o próprio povo.

Nos meios de comunicação de quase toda a América Latina as análises são de que o regime de Maduro sofreu uma grande humilhação, por conta da alta abstenção. Não há nenhum destaque para o fato de que as eleições aconteceram tranquilamente e quem foi votar votou em massa nos candidatos do governo e seus aliados, que garantiram 67% das vagas.

Ora, o mesmo tom derrotista jamais seria usado para falar das eleições dos Estados Unidos, por exemplo, essas sim frequentemente fraudadas, e que sequer garantem a participação universal. O fato é que esses veículos de comunicação comem pela mão das agências de notícias do imperialismo e não ficam nem ruborizados por disseminar tantos absurdos. Afinal, em nenhum país do mundo onde o voto não é obrigatório alguém pensaria em dizer que a abstenção define o resultado.

Vale repetir: quem não vai votar está permitindo que os que votam decidam os rumos.

O fato concreto é que o governo de Nicolás Maduro não terá trégua e mesmo que 100% dos venezuelanos votassem ainda assim arranjariam algum motivo para dizer que elas não valeram. Não estamos aqui falando da realidade nem da verdade, mas sim do desejo dos Estados Unidos em derrocar o governo ainda bolivariano.

A síndrome do Aécio segue fazendo história. Quando quem ganha não é a velha elite, aí a eleição não vale.

Para o governo venezuelano a população que saiu de casa para votar, apesar da intensa campanha feita pela direita golpista (que domina os meios de comunicação de massa), mostrou coragem, dignidade e força elegendo uma Assembleia Nacional plena, forte e marcadamente bolivariana, garantindo ainda espaço para a oposição. Sobre a abstenção, entende que foi alta, mas também aponta que na Venezuela, historicamente, a população dá menos importância para as eleições legislativas.

A vida por lá vai seguir. Os golpistas seguirão agindo, os Estados Unidos continuarão sua guerra de alta intensidade e os capachos do imperialismo seguirão atacando. A organização dos chavistas e bolivarianos, internamente, é que vai definir como o governo vai se comportar. Há oposição de esquerda na Venezuela, há muita discordância do governo, mas há também a certeza de que entregar o país para a velha elite dominante não é uma opção.

P’alante venezuelanos, a escrever a própria história.

Elaine Tavares

Elaine Tavares é jornalista e colaboradora do Instituto de Estudos Latino-Americanos da UFSC

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