No Peru, o império contra-ataca
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- Elaine Tavares
- 29/06/2023
O governo peruano, atualmente comandando por Dina Boluarte, abriu as portas do país para as tropas do Comando Sul dos Estados Unidos. Através de um decreto presidencial publicado no dia 31 de maio, fica autorizada a entrada de integrantes da Força Aérea dos Estados Unidos bem como da Força Militar Especial. Essa decisão que vale até dezembro desse ano tem por objetivo, segundo o governo peruano, de treinar as Forças Armadas e a Polícia Nacional do Peru no combate ao terrorismo e para garantir a democracia.
Mas, quem conhece a doutrina dos EUA para a América Latina sabe muito bem o que isso significa: violência, intervenção e expropriação de riquezas. Assim como já acontece na Colômbia os militares estadunidenses que participarem dos “treinamentos” poderão entrar em território peruano com suas armas e gozarão de imunidade diplomática, o que significa que nada do que fizerem no país será questionado.
A lógica de treinamento levada a cabo pelo Comando Sul é bem conhecida na América Latina. O primeiro objetivo é impedir que grupos ligados à esquerda possam se organizar e o segundo, no caso do Peru, é identificar e proteger – para uso futuro por parte dos EUA – as reservas de lítio do país. A presidente Dina Boluarte, ao permitir essa intervenção estadunidense no Peru abre mais um doloroso processo para o povo peruano que agora, além de lutar contra as forças internas que promovem golpes, saques de riqueza e corrupção, precisarão estar atentas aos soldados estadunidenses que terão plenos poderes para agir.
É preciso lembrar que Dina Boluarte assumiu o governo depois de uma bem urdida tramoia que tirou Pedro Castillo do governo. O presidente, que vinha sendo sistematicamente impedido de tocar o governo por conta de sucessivas tentativas de impedimento por parte do legislativo nacional, ao declarar a dissolução do Congresso, teve seu mandato cassado pelo mesmo Congresso com o apoio das forças armadas.
Dina, que era sua vice, assumiu, e tem sido uma governante títere, responsável por mais de 60 mortes de peruanos dentre os milhares que se levantaram em luta contra o golpe. Os protestos que foram gigantes logo após a prisão de Castillo arrefeceram por conta da feroz repressão e agora Dina amplia o drama, aceitando a sempre “prestimosa ajuda” dos Estados Unidos.
A decisão de Dina não surpreende visto que o próprio Pedro Castillo já havia sucumbido aos EUA, ainda em setembro 2022, quando também enviou pedido ao Congresso para autorizar a entrada dos soldados estadunidenses no país visando o chamado “treinamento” das forças locais. Isso mostra também o quão frágil têm sido os governos ditos de corte progressista, incapazes de cortar pela raiz a subserviência ao império.
A história tem registrado de maneira inequívoca: no discurso os EUA prometem ajudar e proteger, mas o objetivo de sempre é garantir o controle do país para fazer valer seus interesses econômicos. E a máxima de que “os Estados Unidos não têm amigos, mas apenas interesses” fica bem clara nesse caso. Para eles, tanto fazia ser Castillo quanto agora Dina.
Nos jornais peruanos a direita do país se expressa jubilosa: “aqui vai mandar a OTAN”. Vejam que o perfil de “guerra fria” parece ter voltado, porque a expressão claramente tem a ver com a guerra imposta pelos Estados Unidos, através da OTAN, contra a Rússia.
Este é um filme que já assistimos, com resultados funestos. Nunca é fria a guerra contra os povos que estão sob as botas dos marines. Há que ver o que acontece no Peru com bastante interesse porque é um ensaio para o que pode estar por vir em todo o continente.
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Elaine Tavares
Elaine Tavares é jornalista e colaboradora do Instituto de Estudos Latino-Americanos da UFSC