Correio da Cidadania

Marco Temporal e os conflitos que seguem

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Foto: Apib

O STF rejeitou por nove votos a dois a tese do Marco Temporal, proposta dos fazendeiros que buscavam inviabilizar a retomada de terras pelos indígenas. Na tese, a ideia era só demarcar áreas que estivessem ocupadas até 1988, ano da promulgação da Constituição. Um verdadeiro acinte visto que durante décadas os indígenas estiveram submetidos a ondas de violência, muitas vezes sendo obrigados a sair de suas terras, e foi justamente a batalha na Constituição que começou a fortalecer as entidades indígenas, garantindo novas lutas e retomadas dos territórios originais.

Fazendeiros e mineradores são os principais protagonistas destas vagas de terror e de usurpação do território, principalmente nos últimos tempos em que estiveram de rédea solta, inclusive com apoio governamental. A decisão do Supremo Tribunal Federal coloca um calço nessa vertiginosa onda de roubo e violência. Um frágil calço, é bom que se diga, porque a lei nunca foi empecilho para a grilagem, ainda mais no Brasil onde o judiciário fica de olho no calcanhar dos pobres, nunca dos ricos. Qualquer um sabe que não é dessas instituições – marcadamente ligadas à classe dominante - que vêm os avanços.

Os povos originários, que foram os primeiros a se levantar em luta nos primeiros dias do governo de Jair Bolsonaro, nunca deixaram de reivindicar seu direito às terras tradicionais e sabem que, agora, com a decisão do Supremo, terão um instrumento a mais para defender seus espaços de vida. Igualmente sabem que a batalha contra fazendeiros e mineradores não se esgota aí. Na atual fase do capitalismo dependente brasileiro, com o avanço da monocultura e da mineração, a cobiça pelas terras férteis e protegidas dos povos originários tende a aumentar. Além disso, o Congresso Nacional, com maioria conservadora, ainda pode incomodar bastante legislando favoravelmente ao latifúndio, como se viu na aprovação do Marco Temporal, aprovada em votação a toque de caixa neste dia 27.

De qualquer maneira, depois de muito esperar, a comunidade La Klãnõ Xokleng, de Santa Catarina, pode celebrar essa vitória, bem como todas as demais etnias, já que a decisão se estende. No caso Xokleng é bastante conhecido o drama vivido por essa etnia, acossada pelos “bugreiros”, de triste fama. Uma gente que caçou, matou e desalojou centenas de milhares de indígenas. Hoje, na TI Ibirama vivem quase três mil Xokleng e eles querem de volta seu lugar original.

A derrubada do Marco Temporal foi bastante celebrada pelas comunidades indígenas de todo o Brasil. Mas não há descanso na luta. Os ataques de jagunços, grileiros e fazendeiros seguem, há todos os dias uma história de violência. Então, após rápidos festejos, segue a luta. Há muita terra para demarcar e muitas outras coisas a conquistar. O Brasil, segundo o último censo, tem um milhão e seiscentos mil indígenas, sendo que 63,27% deles vivem fora das terras oficialmente delimitadas.

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Elaine Tavares

Elaine Tavares é jornalista e colaboradora do Instituto de Estudos Latino-Americanos da UFSC

Elaine Tavares
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