Lula visita a Argentina para superar as polêmicas da OMC
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- Eduardo Gudynas
- 06/08/2008
O presidente Luis Inácio Lula da Silva visitou a Argentina com o objetivo de reparar os questionamentos gerados pela postura do Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC). Enquanto a imprensa convencional e os analistas econômicos ortodoxos brasileiros pleiteavam uma maior abertura comercial, e consideravam insuficientes as concessões de Celso Amorim, em outros países se denunciava que já havia se cedido muito.
O Brasil chegou ao encontro ministerial da OMC invocando a liderança do Mercosul, do G-20 (conjunto de vários países que apontam contra os subsídios agrícolas), e como promotor do IBAS (associação Brasil, Índia e África do Sul). Porém, ao término do encontro, o país ficou envolto em debates e polêmicas com quase todas essas nações.
As disputas se concentraram especialmente na disposição do Itamaraty em aceitar as propostas dos Estados Unidos e da União Européia de rebaixar seus subsídios agrícolas em troca de uma redução das tarifas para as importações de produtos e bens nos países do sul. A Argentina (junto a países tão distintos como China, África do Sul ou Venezuela, entre outros) considerava que essa redução das tarifas destruiria sua indústria. Paraguai e Uruguai sustentavam que a diminuição dos subsídios agropecuários proposta era totalmente insuficiente. A Índia decidiu manter mecanismos de proteção aos seus próprios agricultores, protegendo-os das importações de alimentos do campo, enquanto o Brasil estava disposto a ceder neste ponto.
Desta forma, as posturas do Itamaraty começaram a ser criticadas primeiramente por Paraguai e Uruguai, dias depois pela Argentina ("traição", chegaram a dizer alguns) e finalmente pela Índia (que integra tanto o G-20 como o IBAS). Outros países, como China e África do Sul, não apoiaram as idéias de Amorim. Naqueles dias, o chanceler declarou à imprensa internacional que sabia das diferenças com a Argentina, mas que pensava que "o que fosse bom para o Brasil o seria para a Argentina", e que, portanto, não era necessária uma explicação a respeito das tentativas de se aproximar de Washington e Bruxelas. Esse flerte não prosperou e, ao colapsarem as negociações da OMC, o Brasil ficou distanciado de muitos sócios chaves no sul.
Isso explica a importância da visita de Lula à presidente da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner. Nas declarações à imprensa, Lula repetiu que essa relação é "estratégica" e é como um "casamento". "Precisamos conversar mais, diminuir a burocracia na Argentina e no Brasil, para que tudo flua com mais facilidade, e não permitir que os interesses individuais de um setor freiem acordos estratégicos", complementou. Porém, as matérias da imprensa concordam no entendimento de que, no encontro privado com Cristina, a presidente argentina reiterou os questionamentos, afirmando que os desacordos com a OMC "podiam deteriorar a sociedade" entre os países. Fernández agregou que a "credibilidade no processo de integração se vê deteriorada se na primeira discussão os países acabam com posturas distintas".
Como forma de remediar os problemas, Lula chegou a Buenos Aires com algumas promessas: melhorar o acesso das mercadorias argentinas ao Brasil, promover novos investimentos brasileiros na Argentina, concretizar a construção da represa binacional de Garabi, financiar a compra de aviões brasileiros para a recentemente nacionalizada Aerolíneas Argentinas e até construir um carro de combate argentino-brasileiro.
Muitos desses oferecimentos estariam em mãos de empresas brasileiras que operam na Argentina e que recebem créditos generosos do BNDES. Os negócios potenciais são tão grandes que Lula chegou acompanhado por mais de 200 empresários, incluindo figuras como o presidente da FIESP, os diretores da construtora Camargo Correia, Usiminas, Companhia Siderúrgica Nacional, Odebrecht e até da Embraer.
Ao encontro presidencial em Buenos Aires, se juntou, de maneira surpreendente, Hugo Chávez, da Venezuela. Tanto Brasil como Venezuela são fundamentais para manter a recuperação econômica argentina. Apesar de a assistência brasileira por meio do BNDES acentuar a estrangeirizacão da indústria argentina, e a venda de títulos à Venezuela exigir que se pague a Caracas uma taxa de juros mais alta, essas seguem sendo as principais fontes externas de apoio devido ao fato de a Argentina continuar excluída de boa parte dos mercados internacionais.
Tal estratégia possui várias limitações. Por um lado, as concessões à Argentina acentuam um rumo bilateral argentino-brasileiro dentro do Mercosul, excluindo Paraguai e Uruguai. Por outro lado, o Brasil vem deixando claro que está disposto a aceitar reduções mais modestas no protecionismo agrícola dos países industrializados, enquanto os outros membros do Mercosul – Argentina, Paraguai e Uruguai – exigem um rebaixamento mais substancial.
O Brasil entende que pode superar o protecionismo dos países ricos por meio de um aumento em seu volume de produção. EUA, União Européia e a própria Argentina não podem aumentar facilmente sua área agrícola, enquanto que no Brasil é possível continuar estendendo os cultivos e a pecuária sobre novos territórios no Cerrado, no Nordeste e em especial dentro da Amazônia. O governo Lula apostou num aumento de sua produção agropecuária (e suas exportações) utilizando mais e mais terras, apesar dos impactos ambientais, especialmente o desmatamento. Também renunciou a aplicar mecanismos de salvaguarda comercial para sua agricultura familiar e segue uma prática de assistência financeira (essencialmente nas mãos do Ministério do Desenvolvimento Agrário).
Porém, apesar de todas essas medidas, as tensões internas dessa estratégia se mantêm, o que conseqüentemente multiplica as tensões com os países vizinhos. A tática de apelar ao ‘jeitinho brasileiro’ junto a algumas vantagens comerciais pode funcionar às vezes, mas não soluciona os problemas de fundo.
Eduardo Gudynas é analista de informação no D3E (Desenvolvimento, Economia, Ecologia e Eqüidade), centro de investigações dos assuntos latino-americanos sediado em Montevidéu.
Traduzido por Gabriel Brito.
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Comentários
Chávez, de forma magistral, estragou a festa e deixou o Lula fulo da vida, como descreveram todos os jornais, colhendo nformações do próprio Itamarati.
Ao contrário de apoios empresariais, tomou conta da agenda e propôs três grandes eixos de ação integrativa da AL, com estrada de ferro, aviação e energia. Construída e gerida pelos 3 países, para combater os oligopólios empresariais do setor.
No mesmo dia 5-08, os jornais annciavam a denúncia do Ministperio Público sobre cartel e oligopólio na aviação brasileira.
A foto na primeira página d'O Globo (5-08) é magistral. Mostra o Lula e o Chávez de perfil e, de frente a Cristina kirshner, mas olhando para Chávez. Já o conteúdo da matéria, embora descreva com a exatidão a tomada de posição de Chávez, participando da conversa de Lula com cristina K., não faz a leitura política das propostas, evidentemente. Coloca a questão, como uma crise de ciúmes de Lula.
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