Diploma desnecessário: uma vitória da lógica e da democracia
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- Luiz Antonio Magalhães
- 19/06/2009
Não é mais preciso de canudo para ser jornalista no Brasil. Em uma decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal julgou na sessão de quarta-feira (17/06) a questão da obrigatoriedade de diploma específico para o exercício da profissão de jornalista. Foram oito votos contrários e apenas um favorável à exigência. Trata-se de uma vitória do jornalismo e da democracia brasileira, reafirmando as teses da liberdade de expressão e do livre pensamento, garantidas pela Constituição Federal.
Este observador já se manifestou sobre o assunto (aqui e aqui, entre outros tantos comentários no Observatório da Imprensa ou no blog Entrelinhas) e sempre apoiou o fim da obrigatoriedade do diploma. Antes que alguém pergunte, cabe logo o esclarecimento: jornalista desde 1995, quem assina este texto não tem o diploma específico, é formado em História pela Universidade de São Paulo e abandonou, no terceiro ano, o curso de Administração Pública na Fundação Getulio Vargas para abraçar a profissão (opção esta que acarretou algum prejuízo material, certamente). É preciso, portanto, desde logo esclarecer que não se trata aqui de advogar em causa própria, pois ao longo desses quase 15 anos a falta de diploma jamais foi óbice para o trabalho em veículos tão diferentes quanto a Folha de S. Paulo, Correio da Cidadania, PanoramaBrasil, DCI, Valor Econômico, além, é claro, deste Observatório, desde o ano 2000.
A questão da exigência do diploma para exercício do jornalismo é na verdade até simples: a profissão de jornalista dispensa a formação universitária específica porque não existe nenhuma técnica, norma ou regra que não se possa aprender nas redações, trabalhando, ou seja, fora das salas de aula. Há diversas profissões com as mesmas características, além da de cozinheiro, citada ironicamente pelo ministro Gilmar Mendes. Publicitários, músicos, artistas, escritores são alguns assemelhados: é perfeitamente possível realizar o trabalho sem ter aprendido a teoria na escola.
Tudo que um bom jornalista precisa é de talento, curiosidade e vontade de aprender a exercer a profissão, seja na universidade ou no dia-a-dia de seu trabalho. E de preferência manifestar esta vontade ao longo de toda a sua vida, continuamente.
Salvo exceções, os melhores profissionais acabarão sendo os mais bem formados e para isto só há uma coisa a fazer: estudar bastante. Este observador recomendaria a um jovem que deseja ingressar na profissão que curse qualquer faculdade – pode ser Direito, Economia, Engenharia, qualquer das Ciências Humanas ou até mesmo Medicina, Química ou Matemática. Uma pós-graduação em Comunicação complementaria maravilhosamente a formação, mas isto não é uma necessidade imperiosa.
O fim da exigência do diploma acaba com uma barreira corporativista tacanha, levantada por um sindicalismo medíocre, e não significa em absoluto o fim das escolas de jornalismo. De fato, o fim da exigência não impedirá que muitos jovens continuem cursando jornalismo para ingressar na profissão. Atualmente existem excelentes faculdades de Publicidade e Marketing, embora o diploma não seja obrigatório para o exercício da profissão. Muitos profissionais que se destacam neste meio são recrutados nas universidades. Por outro lado, gente com talento especial e até sem educação formal alguma poderá exercer o jornalismo sem os constrangimentos dos defensores de um canudo que no fundo só servia para a manutenção de seus próprios feudos no meio sindical. Ou alguém imagina, em sã consciência, um sindicato dos escritores lutando pela exigência de diploma específico para a profissão de escritor; um sindicato dos atores tentando impor a freqüência em escolas de arte dramática para que seus pares subam nos palcos?
É claro que a Fenaj e as faculdades privadas (ou seriam fábricas de diplomas?) não vão dar a batalha por perdida, certamente vem aí algum projeto de lei estapafúrdio como o do Conselho Federal de Jornalismo para reinventar a obrigatoriedade do diploma. Afinal, ninguém larga a rapadura assim de graça, portanto, esta briga ainda vai longe, muito longe.
Tudo somado, porém, a verdade é que o STF tomou a decisão mais acertada. Não que a questão do canudo seja central na discussão sobre mídia e imprensa no país hoje, mas o fim do diploma obrigatório foi bom para o Brasil, bom para o jornalismo, bom para os leitores. O futuro vai mostrar a correção da decisão tomada em uma fria quarta-feira de junho.
Luiz Antonio Magalhães é jornalista.
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Comentários
Parabéns pelo artigo. Estava mais do que na hora dessa 'ficha' cair. Claro que não para todos...
Saudações,
Luiz Antonio Cintra
De fato percebemos que não deve ser obrigatório tal diploma para a atuação escrita nos periódicos, até porque seria uma incoerência com o que já ocorre no Brasil e no mundo, em que a escrita desses meios de comunicação fica sob responsabilidade de economistas, sociólogos, médicos, historiadores, etc.
No entanto, creio que há um ponto de suma importância que infelizmente está sendo "deixado de canto", não sei se por descuido ou por outros motivos, que é a não autentificação da profissão no Ministério do Trabalho, ou seja, o descredenciamento do graduado em jornalismo.
Noto que a democratização do jornalismo é necessária, mas não é preciso descaracterizar a profissão, pois isso aparenta ser apenas uma medida para evitar que os jovens tenham esse caráter questionador dos fatos, que muitas vezes só o jornalista nos traz, e manter a mídia dominante como alicerce do jornalismo.
Desde a escolha das fontes, passando pela investigação dos fatos, até a edição do periódico, verifica-se a importância da visão global presente na figura do jornalista, e que por mais competência que tenha um profissional de outra área, estes tendem ver as coisas sob um aspecto técnico que nossas profissões impõem.Mas esse é um outro problema, que não cabe discutir aqui.
O que quero dizer é que não podemos com o propósito de "democratizar" uma profissão, descaracterizar o seu curso superior, pois isso não é progresso, além do mais, desde quando Gilmar Mendes, o coronel, tem visão progressista ?
Sendo assim, manifesto que sou favorável que especialistas em outras áreas escrevam sobre diversos assuntos nos jornais, mas não podemos desqualificar aqueles que aprendem a ter uma visão geral do periódico. Afinal de contas, queremos um sistema fordista para o jornalismo ? Desqualificamos o estudo, priorizando a alienação ? Não queremos visão do todo? Essa é a esquerda que queremos, que ao invés de apoiar o conjunto prioriza sectarizar?
abs. Luiz
"Estudantes de jornalismo fizeram hoje uma lamentável demonstração ao se manifestar contra Gilmar "Dantas" Mendes.
O protesto em si, contra uma das figuras mais nefastas do país é louvável, ou seria, se pelas razões corretas.
Gilmar Dantas tomou uma de suas poucas - raras - decisões acertadas, ainda que com uma argumentação lamentável, falha, grotesca, ao defender o fim do diploma para jornalistas. Outros 7 ministros o seguiram e teve fim um episódio negro na história do Brasil (muito bem contada neste post do Estado Anarquista), a censura imposta pela ditadura à mídia, ao proibir que não-jornalistas pudessem exercer a profissão, criando uma elite corporativista mais facilmente controlável pelo Estado, mais dócil, mais selecionada e, enquanto lutando pelos interesses exclusivos de sua classe, mais cooptáveis e manobráveis.
O protesto demonstra que, em parte, a ditadura conseguiu seus objetivos. Conseguiu uma juventude burra, corporativista, com medo de concorrer, com medo de ter que se especializar, se diferenciar e se destacar, indo além do feijão com arroz da faculdade de jornalismo e tendo uma formação humanística mais ampla e completa."
O resto do post em http://tsavkko.blogspot.com/2009/06/quando-o-fora-gilmar-vira-mote.html
Esqueceram também de lembrar que a formação acadêmica criou condições de aprender algo.
Ler é o melhor remédio
É por este comentário que a imprensa brasileira é uma porcaria, a categoria a todo instante é desrespeitada e alguns Zé Manes oriundos de outras áreas são tão acariciados e aplaudidos, quando deveriam ser execrados.
Vou eu querer exercer o direito de defesa do Direito universal de outrem sem possuir número na OAB, para ver se não me processam. É muito fácil falar.
Mas e as várias gerações que a partir de 69 se dedicaram a estudar, digo, estudar o que sempre foi o discurso da direita, para conseguir uma colocação profissional melhor e aí não consegue nada porque uns pistoleiros ocupam suas vagas pela amizade, pelo contato social ou simplesmente pelo desprezo dos patrões aos estudados e às leis.
E isso só ao abordarmos a Pequena Grande Imprensa. Pois, se fomos analisar o comportamento da Grande Pequena e Média Imprensa, percebermos uma qualidade baixa, vagas ocupadas por pessoas que nem sequer possuem o ensino fundamental completo com salários sendo pagos nos valores do mínimo, do menor salário do País, ou um pouquinho mais, com uma carga horária exercida como a de um balconista de varejo.
Eu não considero o Sr. “Diobobo My Nardes” meu colega de profissão. Ele é um pára-quedista, um bocoió que agrada a pobre elite brasileira com seus textos fantasiosos que miram na Europa e nos EUA o perfil a ser seguido. Nada mais que uma cópia da velha tradição odiosa colonial que persiste no Brasil do século 21.
Arnaldo “Jaburu” um jornalista como eu? Nunca cumpriu uma pauta policial ou sequer compreendeu que texto jornalístico é informativo e não poético, literário ou qualquer baboseira que agrada aos ouvidos e olhos ignorantes de uma classe social que por ter dinheiro acredita estar acima da lei.
Jornalista foi Barbosa Lima Sobrinho que entrevistado por mim dois meses antes de morrer afirmara que jornalista é aquele que defende a pátria de todos aqueles parias que entregam a Nação como um gigolô entrega sua mulher como uma prostituta para o mais abastado.
Barbosa Lima Sobrinho, criador da Associação Brasileira de imprensa, na defesa da categoria daqueles que produziam informações, não era simplesmente um brilhante advogado que se fez na redação e sim o contrário.
Jornalismo não é só escrever bem. Senão todos os romancistas, poetas, contistas etc seriam brilhantes jornalistas. Jornalista é aquele cidadão que não se conforma com a mediocridade de uma sociedade e quer a todo o momento fuçar, investigar, buscar, publicar e INFORMAR aquilo que a sociedade não quer ver ou perceber.
Jornalista não é ser papagaio da moral, da falta de ética ou simplesmente um mero noticiador do que aconteceu com aquela sociedade que a própria quer ouvir.
Jornalista, a exemplo do meu mestre Alexandre José Barbosa Lima Sobrinho, é um cidadão privilegiado que não o é por ter atingido os cargos mais cobiçados numa empresa midiática e sim porque não pára de querer transformar o seu meio em algo melhor, mesmo que para isso tenha que se passar por louco, chato ou inconveniente.
O diploma de jornalista não faz um jornalista integralmente, mas é o melhor caminho para se evitar que o famoso Quem Indica, tão praticado em nossa terra, coloque nas redações pessoas que não tem nada a ver com o processo de produção de notícias.
O diploma deve ser algo básico exigido para os que se propõem a exercer uma profissão tão importante e séria. Com a decisão estúpida da maioria dos babacas da apequenada suprema corte, a grande comemoração foram daqueles que burlaram o sistema, são amigos dos donos da imprensa e dos próprios donos dos botecos de cachaça que produzem informação manipulada com o único objetivo de defender seus interesses.
Eu como profissional diplomado lamento a decisão. A mim a estúpida decisão não me afetará em nada. Como empresário do meio, até que posso ter gostado, mesmo sendo um pequeno proprietário de empresa jornalística. O deixe levar do mercado, tão propalado e defendido, acarretará num achatamento maior dos salários da profissão. Tirando as “estrelas”, os operários das informações verão seus proventos diminuírem mais ainda, se isto é possível e será.
A briga indigesta que os sindicatos profissionais da categoria já entravam contra a toda poderosa mesa do patronato ficará ainda mais enfraquecida. Com a queda de vez da obrigatoriedade do diploma para o exercício profissional, o teto salarial instituído pelos sindicatos nas diversas unidades da Federação que já não eram cumpridos pela grande maioria da pequena e média imprensa será motivo de risada dos que contratam. Agora, o teto salarial virou piada definitiva.
O grande problema do País é querer que todas as funções sejam seguidas exemplarmente pelos que estão no topo, quando deveria ser o contrário. Os que estão no topo significam uma parcela ínfima e desprezível da realidade. O maior exemplo disso vem da grande paixão dos brasileiros: o futebol. O atual formato do Calendário promovido pela CONFEDERAÇÃO Brasileira privilegia apenas os grandes clubes e os atletas empregados nestes clubes. Os clubes pequenos, maiores empregadores, participam de apenas três meses dentro do calendário.
A questão é a mesma. Todos se preocupam com o modelo: Folha de S. Paulo; O Globo; O Estado de S. Paulo; Estado de Minas; Zero Hora etc e esquecem por completo que as maiorias dos profissionais irão estar presentes nas pequenas e médias empresas. A estes são relegadas as selvagerias do mercado.
Um exemplo claro é demonstrado em Brasília, capital federal da República, onde o teto salarial instituído pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal (SJPDF) é de R$ 1800,00. Porém, um jornal diário, Tribuna do Brasil, paga a seus repórteres, amplamente formados até então por estudantes de jornalismo, estagiários, e até mesmo, antes mesmo da decisão que desobriga o diploma como requisito básico para o exercício profissional, de pessoas sem o nível médio, os valores de R$ 450,00. O que acham que acontecerá de agora em diante? Talvez, os valores a serem pagos, reduzam para formalmente o valor do salário mínimo e com a carga horária igual à de um atendente de loja e não mais como se previa na extinta lei dos milicos às seis horas estabelecidas.
Parabéns aos que parabenizaram a estúpida decisão do STF. O mercado agora é livre. Bom para os que estão nas faculdades de jornalismo e que tem tempo de saltarem foram e migrarem para algum outro curso que lhe dê garantias de classe e reserva de mercado e ainda poderão exercer a profissão de jornalista.
Atenciosamente,
Humberto Azevedo
HB Comunicação Ltda
de ontem e manifestei minha opinião
divergindo um dos pontos. A sua reflexão completa como a de uma jornalista de barretos que definu esta este mesmo olhar.
braz
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