A boa semente só pode dar bom fruto
- Detalhes
- Waldemar Rossi
- 03/01/2008
Pelo que pudemos presenciar, e até participar, no ano de 2007, no concernente ao movimento social, podemos ousar dizer que sementes de boa qualidade foram lançadas ao solo (pelos que se opuseram à política neoliberal) e que boa colheita poderemos ter em 2008. Tomara! É claro que, a exemplo do Evangelho, os inimigos jogaram o joio, a semente ruim, no mesmo terreno (CUT, Força Sindical, CSC, UNE... que apostaram na desmobilização do movimento social para fazer a blindagem do Lula), terreno que pode ser fértil, árido, pedregulhoso, cheio de espinheiros, ou um terreno intermediário. Tudo vai depender, como no caso dos agricultores, de saber se esperamos corretamente a época das chuvas e se preparamos bem o terreno. E pelo visto, o acerto foi de bom tamanho, pois parcelas significativas do movimento social arregaçaram as mangas e foram à luta em defesa da justiça, como pudemos abordar no artigo anterior.
Os indicativos principais, entre muitos outros, podem ser sentidos através das mobilizações que tivemos e das deliberações coletivas de sua continuidade. De início, lembramos que a luta contra a proposta de nova Reforma da Previdência – que, se vingar, virá onerar mais os trabalhadores - sofreu um forte impacto e paralisou-se temporariamente. Curiosamente, até o peleguismo oficial ou disfarçado se viu forçado a não acatar os termos propostos pelo patronato, graças à reação de suas bases sindicais. Mas o governo Lula não irá se deixar vencido, até porque se trata de um homem de muita garra, especialmente quando defende os interesses da burguesia (perdoem-me a redundância). Irá apresentar seu próprio projeto – e, para isso, contará com o apoio de ex-dirigentes da CUT -, e defendê-lo com “unhas e dentes”, usando de todos os meios de persuasão de que dispõe: compra de votos dos deputados e senadores com dinheiro do orçamento da União, com a chantagem de cargos políticos para os apadrinhados dos congressistas, usando o espaço dado “generosamente” pela mídia etc. e tal. O outro lado da moeda é que a sociedade vem deixando claro que também não se dará por vencida. Até mesmo uma greve bem abrangente, de dimensão nacional, poderá ser desencadeada. Aí, o jogo de braço tende a ser bem equilibrado.
Simultaneamente, isto é, ainda no início do ano, manifestações contra a transposição do rio São Francisco tendem a aumentar, graças à ação corajosa de D. Luiz Flávio Cappio que, com sua segunda greve de fome, conseguiu tirar o caso do anonimato imposto pela mídia. Está claro que, aos olhos da opinião pública, Lula se mostrou prepotente e autoritário, virando, mais uma vez, as costas para os movimentos sociais que colaboraram para sua eleição. Neste episódio, Lula conseguiu ter contra si setores importantes da sociedade, que antes se mostravam simpáticos ao seu governo. Muita água vai passar por baixo da ponte, podem crer.
Também não morreu a luta pela anulação do Leilão da Cia. Vale do Rio Doce, uma das maiores maracutaias já impostas ao povo brasileiro, desta vez pelo governo tucano de FHC. Será, esta batalha, mais um ponto de desgaste de Lula e de seu partido, se mantida for sua posição de desconhecimento das reivindicações populares.
Por outro lado, 2008 será um ano eleitoral, e as disputas partidárias para conquistar a administração de mais de 6.000 prefeituras serão muito acirradas. Muita denúncia de irregularidades, tanto em nível local, quanto estadual e, principalmente, federal, vai ser ressuscitada; de todos os lados, acusações de corrupção vão rolar, cada partido querendo dar uma mãozinha nesse processo de enganação do povo. Creio que essa previsão tem 99% de chances de se mostrar correta, o que, ainda que indiretamente, colaborará para aumentar o senso crítico do povo. Há uma forte tendência de termos o crescimento das abstenções, mas certamente um crescimento, ainda que pequeno, de votos nulos, pelo fato de a decepção popular também ser crescente.
Não esqueçamos que as lutas por reforma agrária, por um programa de construção de moradias populares, pela revolução do sistema de saúde pública e de um sistema de educação também pública libertadora vão continuar. Crescerão, ao que tudo indica, as manifestações em favor do meio ambiente e, no bojo dessa luta, deverá estar a oposição ao projeto de transformação do Brasil num imenso canavial, a serviço dos países ricos que precisam de combustível para seus veículos.
Como cristão e socialista, gostaria de “ver acontecer um sonho bom, um sonho de muitos”: as principais orientações do V CELAM serem aplicadas em todas as dioceses desse imenso Brasil, especialmente a verdadeira “Opção Preferencial pelos Pobres” (melhor seria, pelos empobrecidos pela opressão e exploração do capital).
Será muito fértil para o povo brasileiro se essas previsões se confirmarem. Se a boa semente foi lançada, trata-se agora de cultivá-la para que dê frutos cem por um.
Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo.
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Comentários
Lula não se mostrou autoritário, não. Na audiência que teria com Ciro Gomes o bispo nem apareceu. Você fala em desgaste do Presidente e eu lhe pergunto: aonde o desgaste? Só se for no diretório do PSDB, do PFL e do próprio PSOL, que votou junto com a direira, provando mais uma vez que os extremos se unem. Outra coisa que você disse: "decepção popular crescente". Será?
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