Neste país alguns são mais iguais que os outros
- Detalhes
- Waldemar Rossi
- 23/07/2009
Esta coluna sempre teve como objetivo analisar os problemas que afetam a vida do povo sob a ótica do conflito entre Capital e Trabalho. Assim, quando o assunto abordado trata de políticas públicas nada mais faz do que expor em que os acontecimentos se relacionam com os interesses dos trabalhadores.
Entre tantos problemas da nossa conjuntura relato alguns apenas. O primeiro trata da Nota de Protesto, emitida pelos alunos da turma de Direito para Assentados da Reforma Agrária e Agricultores Familiares Tradicionais da Universidade Federal de Goiás.
A nota denuncia a Decisão da Justiça Federal de Goiás que determinou a extinção do curso de Direito destinado a trabalhadores rurais, criado entre o INCRA e a Universidade Federal de Goiás, e que vem funcionando há quatro semestres.
"Sob a alegação de desvio de finalidade no emprego de recursos do PRONERA, afirmando que tal fato lesa o patrimônio social, e ainda que não exista previsão de tratamento diferenciado aos beneficiários da Reforma Agrária, a aludida decisão pondera de forma extremamente agressiva que a existência de nossa turma desrespeita os princípios constitucionais da igualdade, isonomia e razoabilidade".
As perguntas a serem feitas aos senhores juízes é: a quem, de fato, interessa a extinção de cursos superiores de direito para trabalhadores rurais? Quem não quer ser contestado com base até em lei sobre seus privilégios? A quem interessa manter trabalhadores sempre em condições de dependência e de exploração? Quem não quer ter contestadas tantas medidas "legais" tomadas pelos nossos governantes e que beneficiam os grandes fazendeiros, latifundiários e grileiros das terras devolutas? E, finalmente, a pergunta mais importante: a quem tem beneficiado sistematicamente as decisões da justiça brasileira, seja em nível local seja em nível estadual e federal, salvo raríssimas exceções? Quantos latifundiários foram julgados por seus crimes, condenados e presos? Portanto, devemos notar que, apesar da lei, neste país alguns são mais iguais que os outros.
Outro fato que chama a atenção: a persistência com que Lula publicamente vem defendendo um dos maiores picaretas e corruptos da nossa recente história política: o senador e "coronel" nordestino José Sarney, que insiste em transformar também o Senado (não apenas o Maranhão) em propriedade familiar, pois garante emprego (sem concurso e sem precisar trabalhar) até para namorado da sua neta, além de beneficiar pela mesma prática familiares e amigos de tantos outros homens do Senado.
Como aceitar que um presidente da República possa advertir que "é preciso ter cuidados com biografia de investigados", referindo-se ao caso Sarney? Convém lembrar que Lula já tinha extrapolado de suas funções ao defender o fim das denúncias sobre os crimes políticos de Sarney, afirmando que o senador "não é uma pessoa comum". Ora, mas não é isso que garante a Constituição brasileira, que "somos todos iguais perante a Lei? "Ora, a lei!", repetirá alguém, em defesa de Lula e de suas "derrapadas políticas".
Assim, para o presidente da República, todos são iguais perante a lei. Mas, alguns são mais iguais que os outros (*). Inclusive ele. O comportamento e as falas do presidente deixam claro: o povo que trabalha pode ficar desempregado, receber baixos salários, ter trabalho precário, ser tratado como escravo, viver de esmolas, ter sua vida devassada e denunciada publicamente, ficar preso sob as piores condições destinadas a um ser humano. Mas os políticos não podem porque são seres acima dos humanos comuns. Assim como ele e seus auxiliares mais diretos.
(*) "Todos os animais são iguais, mas alguns animais são mais iguais do que os outros." Conforme "A Revolução dos Bichos" de George Orwell, Editora Globo.
Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo.
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Comentários
A nossa postura aparentaria sermos simplesmente covers das figuras simbolizadas em “Judas ou Pilatos”?
Então, me pergunto: estariam eles, lobos políticos adestrados pelo afagar do peso da grana, o qual lhes garante o acesso ao mundo do acumulo, através da capitalização das mazelas sociais?
Seria esse acesso ao mundo do acumulo uma estratégia amoral, acalentadora e economicista, que os possibilita obter o devido afastamento, e assim um estado de alienação e de estranhamento ao mesmo mundo.
Mundo esse, de onde emergem e por onde nascem dados referenciais de analise socioeconômicas, por hora oca, pois são despidas de sentido político e do mundo de responsabilização pelo próximo.
E, o que nos faz dar aval a esses saberes absolutistas,
e acreditarmos em certezas colocadas em papeis publicizados e nos mecanismos de divulgação?
Estaríamos servindo a quais propósitos, quando atuamos em um mundo de valores capitalizados e modalizadores de desejos?
Ora, vivenciamos em nosso cotidiano e na angústia noturna, a certeza
que, não existem verdades redondas e absolutas, pois, as mesmas
coexistem, entre as conclusões efêmeras e as concretudes do caminho e do caminhar.
A função do humano neste cenário seria ser sal da Terra.
Penso que estamos ideologicamente órfãos.
Imbuídos de um pensar niilista, pois nos remetemos às práticas fundamentadas na orfandade política. Despidas de sentidos, pois sofrem da solidão política, se o desengajamento em lutas sociais de nosso próprio tempo.
Por favor onde encontro seu ultimo livro, fora divulgado endereço eletronico da editora impossível de acesso.
Obrigado
É o que precisamos no Brasil de hoje.
P.S.; A propósito, é assustador que um Presidente da República diga barbaridades como a comentada no artigo!
Biografia? Ficha corrida, isso sim!
"Antes de mais nada, seria interessante alguém avisar ao Lula que "Biografia" não é sinônimo de "Ficha Corrida". Imagino que ele tenha se confundido ou, para usar a linguagem corrente, tenha tucanado a boa a velha ficha corrida.
Biografia, caro presidente, só vale se for honesta, se for justa, se merecer respeito. Gente como Sarney, ACM Neto e toda a corja parlamentar não tem biografia, tem ficha corrida e das mais podres.
Aliás, o Ministério Público e a Procuradoria Geral não tem que investigar pensando em "Biografia". Deve sempre presumir inocência, como mandam os preceitos mais básicos do direito, mas não investigar tendo em mente cargos, posição, hierarquia, poder e, enfim, biografia."
Mais em http://tsavkko.blogspot.com/2009/07/lula-e-suas-biografias.html
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