Correio da Cidadania

Em busca da soberania

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Passado o período da ditadura militar, as forças democráticas (de esquerda) retomaram os debates sobre os caminhos para se alcançar a soberania nacional, jogada no lixo da história pelos militares golpistas. Tal debate esteve presente em todos os momentos em que sindicatos, partidos e movimentos populares se reuniam para refletir e deliberar sobre os inúmeros problemas que ainda dificultam a vida do povo brasileiro.

 

Quando se procurava definir os destinos do movimento sindical pós-78, por exemplo, os temas centrais recaíam sobre os rumos do país, para onde caminhava a política econômica oficial, quais seriam seus reflexos para os trabalhadores, se tal política oficial indicava a busca de nossa soberania ou nos colocava, ainda mais, dependentes do capital internacional e das políticas dos Estados Unidos.

 

Os movimentos populares debatiam sobre as políticas públicas que deveriam estar voltadas para a reforma agrária, programas de construção de moradias populares visando superar a triste fase do surgimento e a proliferação das favelas e dos cortiços, a recuperação da política educacional voltada para os interesses do Brasil em primeiro lugar, a retomada da política de saúde pública golpeada pelo incentivo aos planos de saúde privados imposto pelos militares, projeto de transporte nacional ferroviário, investimento maciço no saneamento básico buscando servir a todos os municípios do país, entre tantas outras questões importantes. Os estudos desenvolvidos por técnicos e políticos sérios e competentes são suficientes para a produção de dezenas de volumosos dossiês.

 

Tínhamos a convicção de que este país alcançaria sua soberania se nossos governantes – que seriam finalmente eleitos – estivessem, de fato, comprometidos com a vontade e com as necessidades do povo brasileiro. Não por menos, os novos partidos políticos se debruçavam sobre os gargalos do nosso desenvolvimento, ousando a elaboração de projetos nacionais, segundo os verdadeiros interesses populares. E tais projetos eram apresentados, ainda que acanhadamente, para debate público, especialmente durante as primeiras campanhas eleitorais.

 

E foi aí que os interesses do empresariado afloraram. Através da mídia conservadora e retrógrada, se iniciou verdadeira caça às bruxas, onde todos os projetos contrários aos interesses dos exploradores voltavam a ser denominados de comunistas e outros "istas" mais.

 

Entretanto, as forças populares ganhavam energia, os sindicatos ocupavam seus lugares nos conflitos trabalhistas, os "sem terra" cresciam em todo o país, os "sem teto" ocupavam as ruas de grandes cidades. Tudo isso fazia crescer a popularidade dos partidos de esquerda, mormente a popularidade do Partido dos Trabalhadores.

 

Porém, depois de muita repressão às crescentes forças populares e de sua inoperância, a burguesia muda sua tática de guerra e inicia um camuflado projeto de conquista de lideranças políticas populares: mais espaços na mídia "massageando" o ego de muitos líderes, recepções em espaços burgueses com repercussão midiática, abertura discreta e secreta dos cofres de grandes empresas e de contas de empresários para colaboração nos processos eleitorais, amplos acenos de possibilidade da chegada ao poder. Como no poema de Vinicius de Morais "Operário em Construção", o poder econômico não vacilou em fazer suas três célebres tentações (como nas três tentações de Cristo). Com uma significativa diferença: no poema, o operário consciente disse "NÃO!".

 

Nosso povo, sempre muito otimista, acreditou que alguns salvadores da pátria, como FHC, resolveriam nossos problemas. Elegeu-o e depois, mesmo ante as catástrofes de sua política, deu-lhe mais um cheque em branco. E FHC continuou seu projeto de traição nacional. Caiu o otimismo popular nos representantes da burguesia e se voltou então para representantes das forças populares: Lula era o homem. Mas o operário disse "SIM" às tentações do grande capital e o Brasil capitulou mais uma vez, abrindo mão da construção de sua soberania. Ao invés de aplicar a base da política tão sonhada pelo povo brasileiro, investindo nosso dinheiro em projetos nacionais, preferiu dar crédito aos interesses e humores do capital neoliberal.

 

Os reflexos dessa "opção" estão aí. "Brasil tem déficit externo recorde", revelam-nos os dados da economia nacional: "Com forte aumento nas remessas de lucros e dividendos pelas empresas estrangeiras, as contas externas do Brasil tiveram em dezembro de 2009 um déficit de US$ 5,94 bilhões, o pior resultado mensal da série histórica do Banco Central, desde 1947. O aumento do ganho fez a remessa das empresas somarem US$ 5,32 bilhões, também recordes" (Estadão, 21/01/10).

 

"A crise financeira global, que afetou a economia nacional... prejudicou as contas do... INSS. É que, com o corte de vagas nos primeiros meses do ano e a lenta recuperação do emprego..., o ritmo de crescimento da receita desacelerou". E o tal déficit da Previdência atingiu R$ 42,9 bilhões (Estadão, 20/01/10).

 

Ou seja, a escolha pelo crescimento econômico nacional sob a dependência dos interesses do capital estrangeiro jogou a soberania nacional na lata do lixo da história, o país sofre, ano após ano, verdadeira sangria das riquezas que seu povo produz; ao povo vai restando o desamparo crescente em termos de seguridade; nossos gargalos econômicos e sociais não são eliminados.

 

E ainda tem gente que diz que o Brasil está no caminho certo! Durma-se com um futuro desses!

 

Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo.

 

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Comentários   

0 #2 Esquerda e DireitaJoão Coimbra 01-02-2010 16:54
"Não existe mais Esquerda e Direita" afirmou Paul Singer no Último FSM. Para que serve essa oposição entre esquerda e direita? Afora a corrupção, roubo mesmo, que encontramos em todo lugar, os de esquerda são aqueles honestos, que abrem o jogo, aceitam o debate e acatam, apoiam e contribuem para o sucesso das decisões escolhidas pela maioria. Os de direita escondem o jogo, mentem, detestam discutir alguma coisa porque não querem nem pensar na possibilidade de perder e fazem de tudo, tudo mesmo, violência e até assassinatos, para que seus pontos de vista prevaleçam.
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0 #1 Sandro 25-01-2010 04:57
O papel da esquerda de enfermeira do capitalismo ou melhor a direita transvestida de esquerda costuma ter vida curta .E so ate desorganizar e acabar com os movimentos sociais , depois ate o grande capital volta a apoiar a direita tradicional .
Me refiro tanto ao Chile como a opcao politica do atual presidente de pais e seu partido .
Atenciosamente Sandro .
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