Correio da Cidadania

Saúde: uma perversa herança da ditadura militar

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Nos tristes anos da ditadura militar, muitos direitos foram arrancados aos trabalhadores, seja pela força da repressão patronal, seja pela força das armas e com a colaboração de trabalhadores traidores de sua classe, colocados pelos militares como interventores em vários sindicatos.

 

Entre esses muitos direitos surrupiados destacamos a estabilidade no emprego, que garantia ao trabalhador com 10 anos de trabalho a estabilidade no trabalho, até alcançar sua justa aposentadoria. Essa estabilidade representava o reconhecimento da empresa ao trabalho dos seus empregados, à colaboração prestada durante anos a fio e, portanto, à constituição do seu rico patrimônio.

 

Outro que mereceu destaque foi a desestruturação do sistema previdenciário, pois, às multinacionais que aqui se instalavam, não interessava a manutenção de um sistema em que elas assumiam a responsabilidade da previdência social. Hoje estamos pagando um preço muito caro por isso.

 

Quanto ao sistema de saúde pública, interessava à nova forma de capitalismo que ele passasse às mãos das empresas de saúde particulares. Ou seja, a saúde deveria deixar de ser um direito do cidadão e uma responsabilidade do Estado burguês, para que fosse considerada como mercadoria, como fonte de lucro para os empresários. Por isso, houve a implantação de uma política de poucos recursos para a saúde pública e muito incentivo para as empresas de saúde. Era necessário que a mídia divulgasse as vantagens de participar de algum plano de saúde particular, de mostrar o quanto esse novo modelo era vantajoso em relação ao “decadente” sistema público – que vinha sendo sucateado sistematicamente.

 

Passados muitos anos, o brasileiro sem muitos recursos passou a perceber que a isca lançada o havia fisgado. Os chamados “convênios” (convém a quem?) se desenvolveram extraordinariamente, alguns se constituíram em verdadeiros impérios, se sobrepuseram ao sistema público e hoje o cidadão comum não conta nem com um nem com outro sistema, pois ambos são precários no atendimento.

 

Um bom sinal dessa mazela está na pesquisa feita pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar – que de suplementar não tem nada). A pesquisa revela que 47% das “operadoras” de saúde não têm “saúde” financeira para continuar operando. Em outras palavras, pelo menos metade dessas “operadoras” fajutas não tem condições de atendimento adequado aos seus conveniados, mas passaram a mão no dinheirinho do povão ludibriado - que foi na onda da propaganda enganosa -, que ficou na mão, sem dinheiro e sem atendimento médico. É uma forma deslavada de estelionato que, infelizmente, não vem sendo combatido com seriedade.

 

Enquanto isso, o governo, que antes das eleições afirmou que resolveria todos os problemas do povo numa canetada, nada faz para mudar esse sistema perverso; diz que não tem dinheiro para atender às demandas da saúde pública, enquanto retira esse mesmo dinheiro do orçamento nacional, grana destinada ao atendimento das necessidades básicas da população. Enquanto engana os que estão mergulhados na miséria com algumas migalhas insuficientes para eliminar a fome endêmica, envia “caminhões” do dinheiro público para satisfazer a sanha devoradora dos banqueiros credores (ou devedores?).

 

Dentre tantas misérias herdadas dos desgovernos militares, a da saúde é, sem dúvida, uma das mais graves e perversos porque diretamente ligada à vida do povo brasileiro.

 

 

Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo.

 

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