Correio da Cidadania

Cuba, soberania alimentar e educação nutricional

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Apresentação do Plano; Frei Betto é o primeiro sentado à esquerda da mesa.

Na tarde de terça, 10 de março, participei em Havana, no Palácio da Revolução, da reunião do Conselho de Ministros, presidida por Miguel Díaz-Canel, presidente da República, e Manuel Marrero, primeiro-ministro. Ao lado deles se sentaram Marcelo Resende, oficial diplomático representante da FAO naquele país, e eu, assessor do organismo da ONU.

Apresentamos aos ministros o Plano de Soberania Alimentar e Educação Nutricional, conhecido como Plano SAN, a ser implementado na ilha do Caribe. Elaborado durante um ano por representantes de 22 ministérios, coordenados pelos da Agricultura e do Comércio Exterior, é a primeira vez na história do país que uma proposta de política pública resulta de tão amplo esforço interministerial com assessoria da FAO.

A doutora Elizabeth Peña, diretora do Ministério da Agricultura, discorreu sobre o Plano SAN, tarefa complementada por Marcelo Resende e por mim. No dia seguinte à apresentação, o Fundo Verde para o Clima (ONU) aprovou um recurso inicial do valor de US$ 38 milhões. 

São prioridades do plano: diminuir a dependência das importações e substituir pela produção nacional; fortalecer a alimentação na rede pública de consumo social, priorizando a merenda escolar e o atendimento aos setores vulneráveis, como crianças e idosos; assegurar a qualidade dos alimentos e evitar os desperdícios na cadeia alimentar, da produção ao consumo; aprimorar os projetos de investimentos para os setores produtivos.

Cuba enfrenta múltiplas dificuldades para alcançar a sua soberania alimentar. Embora não haja fome no país, já que a Revolução garante cesta básica a cada família, são importados 60% dos alimentos que consome, a um custo anual de US$ 2 bilhões. O bloqueio imposto à ilha pelo governo dos EUA dificulta a importação de tecnologia aplicada à zona rural, já que nenhuma empresa do mundo, sob risco de sanção, vende a Cuba equipamentos que contenham mais de 10% de componentes made in USA.

Outro fator que afeta a produção agropecuária é o que chamo de “paradoxo cubano”: o fato de os filhos de camponeses terem acesso à universidade reduz a mão-de-obra rural. Isso não seria problema se o país tivesse acesso às tecnologias de cultivos. 

O Plano SAN busca potencializar o cultivo de alimentos, como mandioca e milho, para promover a substituição de produtos, como o trigo, importado a um custo anual de US$ 400 milhões. Visa ainda a mudar hábitos nutricionais que, hoje, aumentam no país os índices de diabetes (Cuba é o paraíso do açúcar!) e doenças cardiovasculares. 

A maioria das famílias cubanas ferve água para beber, um considerável consumo de gás importado, o que pode ser significativamente reduzido com a introdução do filtro de barro.

Toda a rede escolar e os meios de comunicação serão mobilizados para promover a educação nutricional e, sobretudo, evitar que os cubanos acolham o Plano SAN como meros beneficiários. O êxito do plano dependerá do protagonismo da população, por meio da atuação de organizações de massa, como os Conselhos Populares, já presentes em cada município.

Frei Betto

Assessor de movimentos sociais. Autor de 53 livros, editados no Brasil e no exterior, ganhou por duas vezes o prêmio Jabuti (1982, com "Batismo de Sangue", e 2005, com "Típicos Tipos")

Frei Betto
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